S�o Paulo, domingo, 26 de mar�o de 1995
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Travesti vira l�der pol�tico no sert�o

XICO S�
ENVIADO ESPECIAL A COL�NIA DO PIAU�

Jos� Nogueira Tapeti Sobrinho, 42, trocou o apelido de Z� de Bastim pelo codinome K�tia, vestiu-se definitivamente de mulher e hoje � lideran�a pol�tica numa regi�o dominada pelo machismo.
Vereadora do PFL de Col�nia do Piau�, a 360 km de Teresina, K�tia �, na defini��o dos seus eleitores, "pai e m�e" dos 7 mil moradores do munic�pio, que vivem em ambiente miser�vel no interior do Estado mais pobre do pa�s.
Polivalente, ela �como prefere ser tratada� � o que as feministas considerariam uma mulher exemplar: assiste aos carentes, arranca dentes, aplica inje��es, ajuda nos partos, cuida de crian�as, distribui comida, esclarece sobre a Aids, milita na C�mara e ainda encontra tempo para criar galinhas, porcos e dedicar-se a seu "marido".
� dessa forma que K�tia trata Benervaldo Francisco de Assis, 28, com quem vive h� nove anos. Ela leva uma alian�a na m�o direita, s�mbolo que substitui o casamento oficial, legalmente imposs�vel.
"Sempre fui homossexual, baitola, como dizem aqui", diz. "Mas queria mostrar que era poss�vel vencer assim, at� na pol�tica, em terra de cabro macho."
A vereadora conquistou o respeito dos moradores e o seu prest�gio j� se espalha por toda a regi�o. Especialmente em Oeiras, ex-capital do Piau�, munic�pio que originou Col�nia, emancipada politicamente h� tr�s anos.
Se em qualquer metr�pole do Brasil o triunfo pol�tico de um homossexual assumido j� � uma proeza, no Nordeste a fa�anha � mais surpreendente. E arriscada.
No ano passado, em Coqueiro Seco (AL), o vereador Renildo Jos� dos Santos, que se dizia homossexual, foi esquartejado por inimigos que n�o o aceitavam. Ele teve a cabe�a jogada num rio e partes do corpo espalhadas pela cidade.
Durante a campanha para vereador, em outubro de 1992, K�tia enfrentou a indigna��o de muitos contra a sua pretens�o.
Pol�ticos rivais, do PDT e PL, diziam que sua candidatura desmoralizava o munic�pio, rec�m emancipado e �s v�speras da primeira elei��o da sua hist�ria.
K�tia deu de ombros. Percorreu todo o munic�pio a p�, montada em lombo de jegue ou bicicleta. Visitou casa por casa e saiu das urnas como o segundo vereador mais votado, com 175 votos. O campe�o obteve 240, 10% dos votos v�lidos para a C�mara.
Ela registrou a candidatura com dois nomes: Z� de Bastim �como era conhecida desde crian�a, por ser filha de Sebasti�o Nogueira Tapeti� e K�tia.
Na hora do voto, Z� foi lembrado por 55 eleitores, e K�tia ganhou a prefer�ncia da maioria: 120 dos 175 votos. "Isso provou que me olham mais como mulher do que homem", diz a vereadora.
Na divis�o do eleitorado, os mais velhos optaram pelo nome masculino, e os jovens sufragaram K�tia, apelido dado por um amigo de Fortaleza que visitava Col�nia, h� dez anos.
"Votei em Z�, pois desde menino conhe�o ele por Z�", diz o agricultor Raimundo Marcelino, 68, um empolgado cabo eleitoral.
Nas sess�es da C�mara, onde assina documentos como Jos� Nogueira e exerce o posto de primeiro secret�rio, K�tia � tratada por "ela". Somente por deslizes dos colegas � chamada de "ele".
Para o presidente da C�mara, Elias da Costa Souza (PPR), 63, essa � uma quest�o superada na Casa. "Ela conseguiu, com a sua compet�ncia, eliminar essa coisa de ser homem ou ser mulher", diz, com a autoridade de quem "estranhava" a candidatura K�tia.
Entre os vereadores, Jos� de Ad�o (PDT) era o mais estridente. Centrou sua campanha no combate ao homossexualismo. Continua com a mesma opini�o e se recusa a comentar o trabalho da colega.
No in�cio da legislatura, em 93, a C�mara comprou palet�s e gravatas para K�tia e mais seis vereadores. Trabalho perdido. A roupa masculina mofou no cabide.
K�tia frequenta as sess�es vestida como as suas duas �nicas colegas de Casa, Carmelita Carm�m (PPR) e Maria Osana (PL).

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