Duas iniciativas recentes da Folha foram objeto de estudo do jornalista Wellington Geraldo Silva, 53, em sua pesquisa de mestrado: a criação da editoria de Diversidade e a presença de Flávia Lima no cargo de ombudsman —é a primeira mulher negra nessa função.
A dissertação de Silva, intitulada “Folha de S.Paulo e a possibilidade de um jornalismo plural”, foi apresentada e aprovada por unanimidade na última sexta (18) para obtenção do título de mestre em comunicação e cultura pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Tomadas pelo jornal em 2019, ambas as ações têm como missão ampliar a perspectiva crítica sobre diversidade na Redação e sugerir mudanças que sejam refletidas na produção diária.
O estudo do jornalista analisou os espaços de opinião e entrevistas, como a seção Entrevista da 2ª.
“São espaços nobres e quase sempre demarcadamente de pessoas brancas, em que o emissor tem a liberdade de expor seu pensamento e onde sua visibilidade está mais presente, com fotos e nomes expostos no jornal”, afirmou Silva durante a defesa.
Para a pesquisa, ele entrevistou o diretor de Redação da Folha, Sérgio Dávila, a ombudsman do jornal, Flávia Lima, a primeira editora de Diversidade, Paula Cesarino Costa, e a atual, Alexandra Moraes.
Silva também ouviu colunistas negros do jornal, como Thiago Amparo, e blogueiros negros, como Denise Mota, do blog Preta, preto, pretinhos.
Silva graduou-se em 1990 pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), tem pós-graduação em marketing e gestão pela UFRJ e hoje é consultor de comunicação empresarial em São Paulo. Entre 2012 e 2014, ele foi secretário de comunicação do ministro Joaquim Barbosa no Supremo Tribunal Federal.
A orientação do trabalho foi do escritor e professor emérito da Escola de Comunicação da UFRJ, Muniz Sodré. A banca recomendou que o texto fosse publicado.
"Em geral, a mídia brasileira fala pouco de si e de seus problemas, principalmente de um tema incômodo como o racismo. Mas tive uma abertura grande na Folha”, diz Silva.
Foi a partir da conexão entre a análise crítica do presente e a presença e silenciamento do negro na imprensa desde o movimento abolicionista que Silva avaliou possíveis impactos dessas iniciativas.
“Jornalistas negros sempre foram colocados em lugares de pouca visibilidade e muito perigo na imprensa brasileira, como a reportagem de polícia”, afirmou, citando o caso de Tim Lopes, jornalista da TV Globo morto enquanto fazia reportagem sobre traficantes no Rio de Janeiro, em 2002.
Para Silva, ainda é cedo para avaliar impactos estruturais das ações, embora ele já enxergue mudanças no jornalismo praticado pela Redação, ainda que ela seja majoritariamente branca.
Exemplo disso, segundo o pesquisador, foi o destaque dado às cotas raciais e de gênero em candidaturas nas eleições deste ano e a cobertura do Dia da Consciência Negra.
Entre os próximos passos sugeridos pelo pesquisador para o aprofundamento das mudanças, estão a abertura de maior espaço para diversidade no processo de contratação e a rediscussão de questões como as cotas raciais --nos editoriais, o jornal defende as cotas sociais.
“Um jornal precisa ter vários olhares, não pode dar as costas a mais de 50% da população. Não vejo outra maneira de os jornais sobreviverem”, afirma.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.