O presidente Jair Bolsonaro voltou a debochar da imprensa na entrada do Palácio da Alvorada nesta quarta-feira (4). Quando questionado sobre o crescimento fraco do PIB, ele pediu que o humorista Márvio Lúcio dos Santos Lourenço, da TV Record, famoso por interpretar o personagem Carioca, respondesse às perguntas dos jornalistas.
O humorista fantasiado de presidente deu, literalmente, banana para a imprensa — no dia 8 de fevereiro Bolsonaro também havia feito o gesto de banana para a imprensa.
Bolsonaro, no entanto, não foi o primeiro presidente a usar de tal expediente.
Em setembro de 1981, o presidente general João Figueiredo (1979-1985) teve um problema cardíaco e foi internado num hospital do Rio de Janeiro. O boato de que ele havia morrido rapidamente se espalhou em Brasília. O fotógrafo Roberto Stuckert foi ao hospital para convencer o presidente a se deixar fotografar, o que acalmaria o país, segundo argumentou. Na hora de um dos cliques, porém, Figueiredo fez uma “banana” com os braços.
Em julho de 1991, a Folha publicou a crônica "Yes, nós temos", do escritor e jornalista Otto Lara Resende (1922-1992). O colunista do jornal comentava o gesto da banana feito pelo então presidente Fernando Collor de Mello.
Yes, nós temos
Otto Lara Resende
Palavra como eu não queria tocar nesse assunto. Parece até que tinha uma premonição. Já na sexta-feira, evitei ver o espetáculo na TVE [emissora de televisão]. Logo na Educativa. Aliás, não vi foi jornal nenhum. Só no sábado de manhã é que tomei conhecimento da banana. Depois daquilo roxo, a banana até que é passável. O popular manguito, cujo sentido todo mundo sabe. A fruta é típica do trópico, mas o gesto existe há séculos em Portugal.
Em Portugal só, não; na Europa —e em cada país, pelo menos na Europa meridional, tem um nome específico. Por toda parte, o gesto é obsceno. A simples palavra é palavrão e consta dos dicionários de calão. Mas aqui entre nós, quem é que nunca deu uma banana? As mais sérias são as que tivemos vontade de dar e todavia guardamos, quase sempre por conveniência. Só mesmo um banana, que neste sentido significa sujeito mole, sem vontade. Um bocó de argola.
Nos Estados Unidos, a banana é fruto raro, salvo quando está associado a república: "banana republic". Designa os pobres países do hemisfério que têm muita banana e nenhuma república, isto é, democracia. Amanhã, Collor estará indo para Guadalajara, no México. A banana com certeza já precedeu e lá está como assunto obrigatório entre os chefes de Estado, ainda que em voz baixa. Se há precedente? Há. Cito um: o do Cristiano Machado. Candidato em 1950, de sua campanha ficou o jargão político "cristianizar".
Cristiano, irmão de Aníbal, tio portanto de Maria Clara, era um 'gentleman'. Em 1953, nomeado embaixador no Vaticano, lá morreu logo depois. Quem registrou a banana do Cristiano foi, logo quem, o Carlos Drummond de Andrade, que foi seu ghost-writer. O candidato apareceu num reduto getulista e a plebe começou a vaiá-lo. Cristiano não teve dúvida. Entrou no carro e saiu dando bananas homéricas, enquanto o poeta morria de rir.
Bom, Cristiano era só candidato. E a graça estava no insólito da cena. Um homem finíssimo como ele! Todo compostura. A sorte é que a TV não estava lá. Nem fotógrafos indiscretos. Quanto ao Collor, sugiro ao protocolo que acabe com a descida da rampa na sexta e crie a subida na segunda-feira. Depois do jet ski e do domingo, nervos em paz, a banana fica mais remota. Mas se quiser dar mesmo, dê para o FMI e para os credores americanos. Macho é isto.
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