Descrição de chapéu Projeto Saúde Pública

Pacientes relatam falta de remédios para Alzheimer e Parkinson no SUS

OUTRO LADO: Ministério da Saúde afirma que aquisição do Prolopa é descentralizada e que, no caso da Rivastigmina, houve atraso na entrega por parte do laboratório fornecedor

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São Paulo

A professora Maria Aparecida Saccani, 67, toma, há 15 anos, remédios para aliviar os sintomas do Parkinson. Há pelo menos três anos, no entanto, ela tem tido dificuldade para conseguir os medicamentos pelo SUS (Sistema Único de Saúde).

O Prolopa BD, considerado carro-chefe no tratamento da doença, é um dos que compõem relatos de abastecimento irregular para a retirada nas unidades de saúde. Sem ele, sintomas como tremores e rigidez podem impedir atividades simples, como movimentar as mãos ou andar.

Os efeitos têm quatro horas de duração e, por isso, o remédio costuma ser tomado várias vezes ao dia, a depender da progressão da doença. Um atraso de horas pode gerar o retorno de sintomas como rigidez nos pés, como no caso de Saccani. Um atraso de meses afeta diretamente a qualidade de vida do paciente.

"Cheguei a ficar três meses sem tomar no ano passado e, neste ano, quase dois meses. Na maioria das vezes o remédio não está disponível", diz Saccani, que mora na zona sul de São Paulo.

A professora Maria Aparecida Saccani, 67, chegou a ficar três meses sem tomar o Prolopa BD, para Parkinson, no ano passado e, neste ano, quase dois meses - Karime Xavier/Folhapress

Na capital paulista, o aplicativo Aqui Tem Remédio, da prefeitura, é usado pelos pacientes para encontrar em quais unidades municipais estão os medicamentos que precisam. "Pacientes me mostram, pelo próprio aplicativo que, principalmente em postos da periferia, a falta é com frequência. Em postos mais centrais, a oferta é mais contínua", diz a fisioterapeuta Érica Tardelli, atual presidente da ONG Associação Brasil Parkinson.

À Folha, o Ministério da Saúde afirmou que a aquisição do Prolopa é descentralizada, sendo responsabilidade do gestor local a programação, a aquisição e a dispensação. A Secretaria Municipal da Saúde (SMS) afirmou que dispõe do medicamento Prolopa BD (Levodopa 100 mg + Benserazida 25 mg comprimido) nas farmácias da rede municipal da capital.

Há irregularidade, ainda, na distribuição da Rivastigmina, princípio ativo do Exelon, medicamento conhecido usado tanto para tratamento de Alzheimer quanto de Parkinson.

Para o paciente Paulo Alves, 71, diagnosticado com Alzheimer há nove anos, a medicação é importante para evitar sintomas como a agressividade, diz Willian Santos, 46, que trabalha como cuidador do sogro. "Chegou um momento em que o medicamento estava em falta por dois meses e tivemos que comprar, porque não tem como ficar sem", afirma Santos.

Ele faz uso regular de quatro tipos de medicações que, além de tratarem diretamente o Alzheimer, ajudam a evitar crises convulsivas e de ansiedade, sintomas relatados em pacientes com a doença. Pagar por todas elas, portanto, é muito caro para a família. A caixa com 30 adesivos do Exelon pode chegar a custar R$ 700 reais.

O paciente recebe os remédios em casa, por meio de um programa do Hospital das Clínicas, em São Paulo, e, segundo Santos, é comum a intermitência. "Num mês falta um, no próximo não vem outro."

Thais Bento Lima da Silva, gerontóloga do Grupo de Neurologia Cognitiva e do Comportamento do HC-FMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) e membro da diretoria da ABRAz (Associação Brasileira de Alzheimer), relata que a situação se repete por questões de licitação e logística.

"É comum que aquele indivíduo que vai buscar o seu medicamento, conforme agendamento, não encontre e tenha que comprar, e então ele adquire um custo extra. E ele não tem o direito de voltar na semana seguinte, tem que voltar no mês seguinte, dentro do calendário de agendamento. É apenas uma oportunidade no mês", diz.

Segundo ela, não é qualquer farmácia do SUS que tem esse tipo de medicamento, mas apenas aquelas que pertencem a grandes hospitais ou municípios.

Pelo Programa Farmácia Popular, Carlos Alberto Palheta, 41, morador de Parauapebas, cidade a 721 km de Belém, no Pará, não consegue nem mesmo adquirir Prolopa, mas por um motivo diferente.

"Quando comecei o tratamento comprava por R$ 4 reais a caixa do Prolopa no Farmácia Popular, quando ia a Belém. Um ano depois da descoberta da doença, não estava mais disponível para mim e ouvi que só pessoas acima de 49 anos podiam ter acesso. Hoje, tenho que comprar quatro caixas a R$ 200 reais", diz.

Essa restrição por faixa etária começou em 2017, quando o Ministério da Saúde impôs um limite mínimo de idade para compra de remédios para colesterol alto, hipertensão e Parkinson. O programa federal complementa, nas principais cidades do país, a disponibilização de remédios usados na Atenção Primária à Saúde, por meio de parceria com farmácias e drogarias da rede privada.

Sobre a irregularidade no Exelon, o Ministério da Saúde diz que fornece medicamentos nas formas oral e transdérmica (adesivos). A aquisição é centralizada pela pasta e faz parte do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF).

Segundo a pasta, houve um atraso na entrega dos comprimidos de 4,5mg e do adesivo transdérmico de 9mg por parte do laboratório fornecedor e que está adotando medidas para o cumprimento dos prazos contratuais e, paralelo a isso, iniciando outros processos de aquisição para assegurar o atendimento aos pacientes.

"Em relação às demais dosagens (comprimido de 1,5mg e 3mg; e 18mg adesivo transdérmico), mais de 85% da demanda nacional foi entregue", diz em nota. A Knight, farmacêutica fornecedora do Exelon em adesivos, foi procurada pela Folha e negou atraso na entrega.

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