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mudança climática

Ansiedade climática ou eco-ansiedade

Em época de COP 26, angústia de jovens mundo afora pede que saiamos da inércia

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Suzana Pádua

Doutora em desenvolvimento sustentável pela UnB, é presidente do IPÊ (Instituto de Pesquisas Ecológicas) e vencedora do Prêmio Empreendedor Social 2009

Dorothea Werneck

Economista e membro da Academia Brasileira da Qualidade

Jovens vêm sendo acometidos por uma angústia que ganhou os nomes "ansiedade climática" e "ecoansiedade". A falta de perspectiva de futuro, ou pelo menos de um futuro sadio e previsível, traz uma mistura de sentimentos: raiva de quem toma decisões que contribuem para as mudanças climáticas, medo do futuro incerto e ameaçador e culpa quando desejam algo que pode afetar negativamente a qualidade de vida planetária.

O símbolo dessa tendência é Greta Thunberg, que vem cobrando uma posição efetiva em relação às emissões de gases e medidas que priorizem a sustentabilidade.

menina indígena olha para o céu em evento com homens ao fundo
Em discurso na COP 26, Txai Suruí lembrou de amigo e familiares que morreram no último ano - Oli Scarff/AFP

Greta está em Glasgow para a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP 26, e representará aqueles que já perceberam a gravidade da situação, como ambientalistas e estudiosos de clima, que têm consciência das consequências dessas questões.

As evidências das mudanças climáticas são claras mundo afora, com chuvas torrenciais ou estiagens prolongadas, deslizamentos de terras, tufões, nuvens de poeira e outros fenômenos. Antes esporádicos ou inexistentes, são cada vez mais frequentes e intensos.

O ser humano, diferentemente das demais espécies, não se sente parte da natureza e evita refletir sobre o que o aborrece e assusta, como as alterações do clima.

Prefere distrair-se com consumo ou é levado por meios de comunicação e líderes manipuladores, como George Monbiot vem chamando atenção. Sendo assim, adia decisões que precisariam ser tomadas hoje.

A maior parte dos sistemas planetários está no limite e, quando um é agredido, outros são afetados por consequência. A interligação da vida nunca esteve tão clara.

Um bom exemplo é o desmatamento da Amazônia e do cerrado, que vem transformando os padrões hídricos do restante do Brasil, causando chuvas torrenciais ou falta de água em diversas partes do país.

Os jovens já despertaram para a urgência de se pensar nesses temas. O jornal The Washington Post tem trazido reportagens sobre a angústia climática com depoimentos do tipo "não vamos morrer de velhice, vamos morrer de mudanças climáticas" ou, "por que estudar para um futuro que não teremos" e ainda "minha vida seria melhor sem os riscos das mudanças climáticas."

A Universidade de Bath, da Inglaterra, em estudo com 10 mil jovens entre 16 e 25 anos, revelou que 75% se sentem ameaçados pelo futuro e 45% sofrem de ansiedade climática.

O governo brasileiro foi o pior avaliado pelos jovens, por não ouvi-los, enquanto o finlandês e o indiano foram os mais bem pontuados. Os jovens não creem que governantes priorizam as decisões que reduziriam riscos às crises climáticas que ameaçam o futuro.

Manter a temperatura do planeta estável precisa ser urgência máxima para todas as escolhas feitas, principalmente com redução ao uso de combustíveis fósseis.

Um caminho promissor é o modelo "donut" (rosquinha), da economista Kate Raworth, que propõe limites ao desenvolvimento. Nem pobreza nem riqueza devem ser exageradas para não ameaçarem o sistema vivo da Terra e o que ela pode suprir. Defende que as soluções estão na cooperação, e não na disputa entre setores governamentais, empresariais e da sociedade civil.

Cada um com responsabilidades próprias precisa oferecer à coletividade o que é de sua pertinência. Esse equilíbrio é chave para que as forças também se ajustem, evitando autoritarismo, capitalismo selvagem e aumentando a escala de iniciativas bem-sucedidas.

A mudança precisa ser estrutural, multifacetada e multisetorial. A urgência é inquestionável e é parte da angústia dos jovens e de muitas pessoas mais velhas que não querem adiar decisões que podem contribuir para a proteção da vida no planeta.

A juventude tem mostrado ativismo forte e inovador, mas não é justo que sejam as novas gerações as que resolvam problemas que não criaram.

Cabe a todos nós sairmos da inércia e rompermos com padrões estabelecidos, assumindo a responsabilidade pela vida na Terra. E é preciso a integração de todos os campos do saber para chegarmos a soluções que levem em conta o social, o ambiental e o econômico.

E o Brasil é o país com maior potencial de ser exemplo ao proteger efetivamente sua riqueza socioambiental e investir em modelos que tragam ganhos econômicos que priorizem a sustentabilidade. É possível e o futuro depende do nosso querer.

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