Calouro vira CEO de rede de escolas de ingl�s de baixo custo na periferia
� comum que o CEO de uma empresa se atrase para compromissos. � incomum que esses compromissos sejam aulas de sua primeira gradua��o, ainda incompleta, como � o caso de Gustavo Fuga, 22.
H� algum tempo o universit�rio faz malabarismo para conciliar o curso de economia da USP (Universidade de S�o Paulo) com suas atividades na 4You2, rede com cinco escolas populares de ingl�s em bairros pobres de S�o Paulo, que ele criou em 2011 dentro da pr�pria faculdade.
"Eu comecei porque conhecer gringos mudou minha vida", conta Fuga. O estudante tinha chegado a S�o Paulo vindo do sub�rbio do Rio de Janeiro, onde nasceu, um ano antes, para dividir uma quitinete e fazer cursinho pr�-vestibular.
A admiss�o na conceituada universidade p�blica seria um divisor de �guas, mas nem tanto pelas aulas ou professores que encontrou.
Logo no in�cio das aulas, Fuga entrou na Aiesec, uma rede estudantil internacional que organiza est�gios para universit�rios ao redor do mundo. L�, teve contato com os primeiros estrangeiros. Aprendeu, convivendo com eles, a falar ingl�s."Tinha at� feito aulinha, mas n�o falava de verdade."
Mais do que aprender a l�ngua, ele diz que o processo serviu para abrir a mente e se preparar para o que viria a seguir.
Um dos projetos da Aiesec, que havia trazido um estrangeiro para trabalhar na regi�o do Cap�o Redondo, acabou sendo cancelado quando o aluno americano j� estava no bairro da zona sul paulistana.
Sem nunca ter tido carteira assinada, Fuga decidiu abrir a pr�pria empresa num blefe. "Criei na hora um projeto de aulas de ingl�s que, na verdade, n�o existia, e contei sobre ele para as outras pessoas." Ao chegar em casa, varou a noite para, de fato, colocar a empreitada no papel.
O acr�nimo 4You2, formado pelo fonema dos n�meros, significa "para voc� tamb�m", em ingl�s, e o plano era trazer estrangeiros para ensinar o idioma voluntariamente em regi�es pobres, onde seriam recebidos por fam�lias locais e viveriam um interc�mbio cultural.
O projeto recebeu aval da Aiesec nos primeiros meses, mas o estudante o tocou quase por conta pr�pria.
Contou com ajuda da m�e, do pai (cujo sonho era de que ele se formasse) e de amigos estrangeiros da faculdade quando decidiu ir a uma feira para a comunidade de Campo Limpo e oferecer seus pr�stimos, de um curso de ingl�s dado por professores nativos a um custo de por R$ 55 mensais.
Saiu de l� com uma lista de 70 interessados, mas sem salas de aula.
A ideia foi encontrar apoio num pr�dio envidra�ado de tr�s andares nas bordas da favela do Cap�o Redondo. L� funcionava a F�brica de Criatividade, uma ONG que tinha algumas salas ociosas e estava disposta a emprestar a estrutura.
Fuga, a irm� e uma amiga investiram suas economias para montar uma escola, em que uma era recepcionista, outra coordenadora e o aconselhamento pedag�gico foi dado gratuitamente por um amigo, que se mestrava em letras. "Os primeiros alunos sabiam que era um teste, a gente avisava", diz o empreendedor.
Em um ano, o neg�cio havia se expandido e alcan�ado mais de 500 clientes –60% deles adultos em busca de melhoria profissional, 30% adolescentes e 10% crian�as.
Nesse meio tempo, a 4You2 se desvinculou da institui��o estudantil e os s�cios passaram a tocar sozinhos o neg�cio, que precisava de uma reformula��o para que conseguisse se expandir para outros bairros de forma sustent�vel.
Foi quando Fuga convidou um ex-colega de Aisec para trabalhar com ele. O americano Raley White, 27, entrou na 4You2 em 2013 e est� at� hoje como diretor.
A maior mudan�a foi o valor da mensalidade, que teve de passar por reajuste: foi de R$ 55 para R$ 76. "N�o devemos subir mais do que isso", diz o administrador americano.
Outra nova t�tica foi procurar funcion�rios mais jovens, das comunidades no entorno da escola, para trabalhar na recep��o. White elaborou um manual de normatiza��o de cem p�ginas, para que o m�todo de ensino e de administra��o pudesse ser replicado em outras unidades: hoje s�o cinco escolas e um total de 1.500 inscritos.
At� o fim de 2017, o plano � que haja 14 escolas pela cidade e uma plataforma eletr�nica de ensino, esp�cie de jogo que seria vendido na pr�pria sala de aula e ajudaria os alunos na did�tica.
Fuga j� foi procurado por comunidades de outras cidades do pa�s para franquear seu modelo de neg�cio social.
"Acho que deu certo por causa do pre�o, mas tamb�m pelo est�mulo de ter um professor gringo. Nossa taxa de evas�o fica bem abaixo do mercado", diz.
Nenhum professor � brasileiro. Jovens estrangeiros que nunca deram aula aprendem a focar em conversa��o e s�o direcionados a que conte�do abordar.
"A sele��o � muito parecida com a que a Aiesec faz. Pegamos as propostas de valor que eles t�m e usamos", diz o consultor americano. O processo seletivo dura tr�s meses, e, segundo a empresa, tem uma procura de cinco candidatos por vaga.
A 4You2 trouxe ao Brasil mais de cem alunos-professores, de lugares t�o d�spares quanto S�ria e Palestina, ganhando um sal�rio simb�lico, pouco mais que o m�nimo. H� ainda seis refugiados que ensinam a l�ngua do bardo, por mais que ela n�o seja a sua natal.
A empresa que come�ou com um capital de R$ 10 mil ter� em 2015 receita superior R$ 1 milh�o. Fuga comprou a parte das outras duas s�cias por "bem mais do que elas haviam investido".
A equipe come�ou um processo de capta��o externa com fundos de impacto para dar um outro salto.
A transfer�ncia de algum poder para administradores mais sens�veis ao lucro n�o vai mudar a estrutura do neg�cio social, defende seu fundador.
"Se eu resolvo cobrar mais, meu aluno vai ter de ser mais rico e o professor n�o vai querer vir dar aula para ele", explica Fuga. "Da� vou ter de pagar mais para o professor e mudar de bairro, ir para os Jardins e virar uma escola normal de ingl�s", completa o empreendedor com seu visual estudantil, que inclui �culos remendados com esparadrapo.
"Eu nunca consegui fazer um interc�mbio. Agora vivo em um", diz Fuga.