A generosidade foi uma marca que Maria Dominelli Campanerut deixou transparecer ao longo de sua vida quase centenária. Sempre foi assim, desde a chegada daquela mulher de sotaque italiano carregado ao bairro da Saúde, na zona sul de São Paulo, na década de 1950. Ajudar as pessoas era uma virtude.
Maria nasceu na Calábria, extremo sul da Itália. Tecelã habilidosa, confeccionou o próprio enxoval para se casar com Bruno Luigi Campanerut, 16 anos mais velho que ela e ex-combatente na Segunda Guerra Mundial, que a convenceu a largar tudo e se mudar para o Brasil.
Primeiro veio o marido para ajeitar as coisas. Depois ela desembarcou de um navio. E fizeram uma família em São Paulo.
Da união nasceram quatro filhos brasileiros: Ângelo, Pedro, Ana e Alba. Depois vieram seis netos: Flávia, Marcela, Júlio, João Marcos, Bruno e Regina.
Maria sempre cuidou de família —o marido trabalhou como mecânico de aviões na Varig e se aposentou na empresa aérea.
"Foi uma mãe muito dedicada aos filhos, aos vizinhos e a todo mundo que precisava de algum auxílio", conta Alba.
Exigente, acompanhava o desempenho escolar dos filhos. Se as notas não eram boas, lembra a caçula da família, marcava no relógio o horário até quando teriam de estudar.
"Ela incentivava [a educação], o estudo era importante", afirma a jornalista Alba.
Voltou quatro vezes para a Itália —a primeira para apresentar os filhos nascidos do outro lado do oceano aos Dominelli e Campanerut.
Maria gostava de reunir a família. Herdou a mão boa para a culinária e seu nhoque de batata dava água na boca. O "frittelle", espécie de bolinho de chuva italiano, era obrigatório no Natal.
A tristeza, porém, tomou conta de seu coração de mãe em 2021. Em um período de quatro meses, os filhos Ângelo e Pedro morreram de Covid-19.
Nona, como era chamada pelos netos —e também por duas vizinhas que a adotaram como avó afetiva—, se dedicava a cuidar de plantas. Semeou uma parreira no jardim onde recentemente brotou uva, em plena selva de pedra na zona sul paulistana. Um legado da dona daquela casa onde se distribuía frutas como sinal de generosidade.
Nos últimos anos, Maria enfrentou problemas pulmonares e passou por algumas internações. Na última delas estava de mãos dadas com a Alba e uma cuidadora, quando a filha colocou para tocar "Quel Mazzolin Di Fiori", clássico da música italiana. Assim morreu no último dia 27 de abril, aos 93 anos.
Viúva, Maria Dominelli Campanerut deixou duas filhas e seis netos, duas noras e dois genros.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.