Duas características tocavam quem conhecia Maria Elisa Alambert Gragnani, a vovó Elisinha: sua doçura acolhedora e sua imensa generosidade.
Nasceu numa terça-feira, 8 de maio de 1923, em uma casa no bairro da Lapa, em São Paulo, filha de um gerente de lojas e de uma professora de piano. Uma única irmã, mais nova, foi sua melhor amiga ao longo de toda a vida.
Quando fez o exame para entrar no curso de ciências econômicas na Faap (Fundação Armando Álvares Penteado), contava ter ouvido de um funcionário da faculdade: "A senhora é a única mulher que está se inscrevendo. Duvido que vá entrar". Ela entrou.
Foi a única mulher de uma turma com 55 homens. Quando fazia perguntas nas aulas, um colega fazia questão de sublinhar suas dúvidas de forma negativa. "Eu dizia: 'Não entendi mesmo, algum problema?'", ela contou uma vez rindo, sem se importar. Formou-se em 1945.
Conheceu Attilio Ângelo Gragnani pouco antes disso em um baile, quando ela subia as escadas para o salão e ele descia para ir embora. Ele mudou de ideia, acabou ficando e dançaram juntos —naquela noite e nos 50 anos seguintes.
Mais tarde, ele admitiria a paixão de longa data: já reparava em Maria Elisa quando a via carregada de livros de estudo tomando o bonde no viaduto do Chá.
Sempre foi muito boa em matemática. Já com 100 anos, respondia sem pestanejar a questões de multiplicação. Trabalhou a vida inteira no IRB, resseguradora criada em 1939 por Getúlio Vargas.
A ternura ela dizia ter puxado do pai. "Papai era um doce, muito meigo. Acho que eu puxei o gênio dele", disse uma vez. Ouvia atentamente seus interlocutores e, com paciência, empatia e uma fala sempre mansa, acolheu com sabedoria inúmeros parentes, amigos e vizinhos.
Reservava o maior dos carinhos ao filho Rui. Netos e bisnetos também curtiram a infância no amplo jardim da casa da avó, subindo em árvores e dividindo o espaço com o jabuti Tilinho. Ícones da religião católica, de Jesus ao papa, estampavam as paredes de sua casa. Tinha uma fé inabalável e exemplar, e foi bastante ativa na paróquia de seu bairro.
Celebrou seu centenário no dia 8 de maio deste ano, sempre lúcida e rodeada de família e amigos. "Gracias por la vida tan plena", escreveu o papa Francisco em carta manuscrita dirigida a ela, único presente à altura da avó que esta neta conseguiu conceber. Obrigada pela vida tão plena, vovó Elisinha.
Morreu no dia 18 de setembro, na manhã seguinte a um jantar com a família com direito a partida de damas —quem venceu foi ela. Deixou irmã, filho, quatro netos e três bisnetos.
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