O STF (Supremo Tribunal Federal) derrubou nesta quarta-feira (6) a possibilidade de fixação de uma data limite para a regularização fundiária de territórios ocupados por remanescentes de comunidades quilombolas e de fundo e fecho de pasto, comuns no sertão nordestino.
Esse prazo, que estava previsto em uma lei da Bahia como 31 de dezembro de 2018, foi questionado no Supremo pela PGR (Procuradoria-Geral da República) em 2017.
Manifestaram-se contrários ao prazo o presidente da corte e relatora da ação, Rosa Weber, e os ministros Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia e Luiz Fux.
Já o ministro Kassio Nunes Marques se manifestou por uma solução intermediária, para prorrogar o final do prazo para cinco anos a partir da data da publicação da ata do julgamento. Os ministros André Mendonça, Dias Toffoli e Gilmar Mendes não participaram da sessão.
Rosa pôs o processo em pauta após o assassinato a tiros da líder quilombola Bernadete Pacífico, 72, conhecida como Mãe Bernadete, em Simões Filho, na região metropolitana de Salvador.
Ela era coordenadora nacional da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos) e liderava o Quilombo Pitanga dos Palmares. Era mãe de Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, o Binho, assassinado há seis anos.
A morte de Bernadete aconteceu em agosto. No mês anterior, Rosa, que preside do Supremo, havia se encontrado com Mãe Pacífico, que falou sobre a violência a que os quilombolas estão expostos.
A lei da Bahia que tem dispositivos questionados pela PGR trata da regularização de terras públicas estaduais ocupadas tradicionalmente por comunidades remanescentes de quilombos e por comunidades de fundo e fecho de pasto —que são grupos tradicionais que vivem de pastoreio comunal em áreas rurais do sertão baiano.
Segundo a PGR, há mais de 500 comunidades de fundo e fecho de pasto no estado da Bahia e "não é possível afirmar com exatidão o número dessas comunidades, tendo em vista o longo período de invisibilidade, isolamento e desinformação que viveram".
Essas comunidades sofrem intensa e constante pressão de fazendeiros, segundo a PGR, interessados na apropriação das terras, o que agrava conflitos na agrários na região.
Ainda de acordo com a PGR, "a Constituição não criou limite temporal algum para que tais comunidades sejam reconhecidas como tradicionais e tenham resguardado seu direito à existência".
"Aquelas comunidades que, cinco anos após edição da lei, não protocolizarem pedido de certificação do autorreconhecimento e de regularização fundiária, não mais terão direito à posse de seus territórios tradicionais, de acordo com a norma atacada", acrescentou.
Em seu voto, Rosa disse que "negar a garantia às terras tradicionalmente ocupadas é negar a própria identidade e o reconhecimento da comunidade tradicional na sua singularidade cultural".
"É condenar o grupo culturalmente diferenciado, centrado na particular relação com o local que que estrutura suas formas de criar, fazer e viver, ao desaparecimento. É impor-lhe a assimilação à sociedade circulante e violar a dignidade da pessoa humana em sua expressão comunitária, com anulação cultural e até mesmo física da comunidade", afirmou a ministra.
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