![vladimir safatle](http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15152396.jpeg)
� professor livre-docente do Departamento de filosofia da USP (Universidade de S�o Paulo). Escreve �s sextas.
A guerra civil como forma de governo
Marcelo Cipis/ Editoria de Arte/Folhapress | ||
![]() |
H� dias um juiz negou o pedido de uma ex-funcion�ria do banco Ita� para processar seu antigo empregador por faz�-la trabalhar em horas extras n�o pagas, al�m de praticar ass�dio, obrig�-la a ac�mulo de fun��o e desrespeitar outros direitos trabalhistas elementares.
No entanto, baseado na nova lei trabalhista, o juiz em quest�o resolveu obrigar a trabalhadora a pagar os custos dos advogados do banco, ou seja, R$ 67 mil. Ele deve esperar, com isto, criar uma jurisprud�ncia que desestimule de vez trabalhadores a acreditar terem o direito de usar a Justi�a para se defender de seus empregadores.
Na mesma semana que ficamos sabendo desta nova modalidade de Justi�a, uma das maiores empresas nacionais de expropria��o de alunos, uma empresa que n�o teme macular o termo "universidade", demitiu sumariamente 1.200 professores. Sem se preocupar minimamente com o impacto de tal decis�o no ensino oferecido aos alunos, nas pesquisas desenvolvidas e orienta��es, a dita empresa de expropria��o estudantil espera aproveitar-se das nova legisla��o trabalhista para oferecer sal�rios ainda mais aviltantes a professores atemorizados em regime prec�rio.
Esses dois fatos n�o s�o fen�menos isolados, mas expressam de forma cristalina a raz�o pela qual atualmente existe governo no Brasil.
H� governo no Brasil para levar ao extremo uma guerra civil n�o declarada contra aqueles que vivem de sal�rios, para submet�-los a um regime de medo e inseguran�a social absoluta a fim de quebrar qualquer �mpeto poss�vel de mudan�a nos padr�es de circula��o do dinheiro e das riquezas. Por isto, o paradigma para entender o Brasil atual n�o � o paradigma do governo, mas o paradigma da guerra.
Ele come�ou com o uso da instabilidade pol�tica para insuflar a crise econ�mica por meio de pautas-bombas no Congresso, de assalto aos cofres p�blicos por meio de aumentos aviltantes ao Poder Judici�rio, de queda completa da credibilidade internacional do Brasil por meio de um governo de presidentes indiciados. Uma crise do tamanho da que vemos atualmente n�o foi resultado apenas de descaminhos econ�micos. Colaborou de forma decisiva uma dose maci�a de produ��o pol�tica. Pois em situa��o de crise, o paradigma da guerra civil pode reinar.
Mas para que esta guerra avance a ponto de levar a popula��o � capitula��o faz-se necess�rio o golpe final da reforma previdenci�ria, que deve ser dado na semana que vem. � digno de um cinismo diab�lico ver a casta de privilegiados que passa inc�lume da crise econ�mica atual (representantes do sistema banc�rio-financeiro, grandes empres�rios, pol�ticos com aposentadorias garantidas, ju�zes) tentar vender � popula��o a necessidade de destruir o sistema previdenci�rio brasileiro sob a capa exatamente do "combate aos privil�gios".
A n�o ser que, de agora em diante, o simples ato de aposentar-se seja descrito, na novil�ngua neoliberal, como "privil�gio".
No entanto, "privil�gio" n�o foi o termo usado para a decis�o da C�mara de conceder isen��o fiscal a gigantes petrol�feros que explorar�o o pr�-sal (MP 795/2017) impondo perdas de at� R$ 1 trilh�o em 25 anos. O governo aponta que tal isen��o gerar� bilh�es para o pa�s.
Deve ser um processo de gera��o da mesma natureza dos empregos que o mesmo governo prometia com a aprova��o da reforma trabalhista. Algo cuja exist�ncia � da mesma ordem do c�rculo quadrado, do unic�rnio e da honestidade do presidente Michel Temer. Se democracia houvesse em nossas terras, o fato de a maioria esmagadora da popula��o preferir candidatos fora do horizonte de sustenta��o do "governo" atual seria elemento fundamental impedir sua guerra travestida de pol�tica econ�mica.
Como democracia aqui � s� uma fachada j� bastante pu�da e degradada, o "governo" de menor aprova��o popular do mundo, que inveja at� mesmo os �ndices de aprova��o de Nicol�s Maduro, pode usar todo seu aparato jur�dico-policial para quebrar o �mpeto de defesa da classe trabalhadora. O que passa por pris�es arbitr�rias, "condi��es coercitivas" surreais, multas milion�rias para sindicatos que procuram exercer o direito de greve, amea�as de golpe militar, entre outros.
Melhor seria que a popula��o brasileira entendesse de vez que estamos em uma forma de guerra civil de baixo impacto no qual Estado brasileiro mostra claramente sua face de inst�ncia beligerante.
Livraria da Folha
- Cole��o "Cinema Policial" re�ne quatro filmes de grandes diretores
- Soci�logo discute transforma��es do s�culo 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD re�ne dupla de cl�ssicos de Andrei Tark�vski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade