São-paulinos acordaram na segunda como um pinto soberano no lixo após a conquista inédita da Copa do Brasil. Mas, se a primeira conquista relevante do São Paulo em muito tempo merece um filme, o terceiro título da Copa do Brasil de Dorival Júnior renderia uma série, daquelas em dez episódios.
Dorival parecia sempre aquele técnico do "ganhou, mas também…". O "mas também" era algo que desqualificava o trabalho do míster.
O primeiro episódio da série poderia ser com Dorival ainda jogador, volantão, quando atendia apenas pela alcunha Júnior. Podia ser uma cena com Júnior jogando no Palmeiras, no início dos anos 1990, e levando uma surra do São Paulo, no Morumbi (só para ter um ciclo completo).
O Palmeiras daqueles tempos costumava se sair melhor contra o Corinthians e pior contra o São Paulo (algo que variou pouco).
Os episódios seguintes mostrariam o início de Dorival como treinador, conquistando títulos estaduais fora dos principais centros (com todo o respeito).
Até que, em 2010, ele vai treinar o Santos, o Santástico, da dupla mais quente em terras brasilis: Neymar, o imparável, e Ganso, jogando mais do que qualquer ave aquática do universo.
Naquele ano, Dorival venceu a primeira Copa do Brasil, diante do Vitória. E aí os críticos diriam, "mas também", os times da Libertadores, como o São Paulo, não disputavam a copa. Ou, "mas também", com Ganso e Neymar, até eu. Dorival saiu do Santos após problemas com Neymar, que era só um menino, mas estava virando um monstro, diziam.
Os episódios seguintes teriam o professor salvando times grandes em crise, incluindo o próprio São Paulo, em 2017. Parecia que Dorival seria o eterno bombeiro, apenas apagando incêndios.
O capítulo 8 seria com drama e tristeza. Após recuperar o Flamengo e chegar ao vice-campeonato, o treinador foi dispensado do clube —na época, eles não gostavam de vice. Entre 2020 e 2022, ficou praticamente um ano e meio desempregado. Ninguém queria o professor. Ou o professor não queria quem aparecia —cenas dele em casa, jogando botão ou dando palestra motivacional para netos.
Até que veio o Ceará, e a tabela (mais o universo) conspirou a favor no Brasileiro-2022. (Este, aliás, será o episódio 9, o penúltimo. No melhor estilo "Game of Thrones", o penúltimo é aquele que inclui mortes inesperadas, traições e batalhas épicas.)
O Ceará estreou no Brasileiro ganhando do futuro campeão Palmeiras em pleno Allianz. Em apenas dez jogos, colecionou bons empates contra o São Paulo, no Morumbi, e o Flamengo, de Paulo Sousa.
Fosse outra tabela, talvez ninguém prestasse atenção nos resultados. Mas aquela sequência foi fundamental para o Flamengo (os "Lannisters" da série) usar seu dinheiro ilimitado e seduzir Dorival. E o moço terminou o ano com os títulos da Copa do Brasil e da Libertadores. No entanto, a turma do "mas também" voltou. Mas também, com esse time, qualquer um é campeão (menos Renato Gaúcho e Paulo Sousa). O capítulo terminaria com a degola de Dorival por Landim Lannister.
O último episódio, em 2023, começaria com destaque para o Corinthians. O time sem treinador preferiu dar chance para o simpático analista Lázaro. Depois, foi atrás de Cuca. Teve chances de procurar o desempregado Dorival mais de uma vez, mas fechou com Luxemburgo, o Vanderlei.
Dorival foi parar no São Paulo. E, pelo capricho dos roteiristas do futebol —que não são deuses, são demônios—, eliminou o Corinthians na semifinal e o ex Flamengo na decisão da Copa do Brasil.
Desta vez, não há mal-humorado capaz de colocar um "mas também" na conquista do professor. A série poderia acabar com o celular de Dorival tocando ao vivo. Do outro lado, Braz Lannister, o Mão de Landim: "Oi Dorival, parabéns, queremos você de volta. Temos mais ouro". Dorival, sorridente e sempre cavalheiro, diria, "enfia o ouro no…(piiii)". Nome da série? Talvez "Soberano É o Dorival".
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