Talvez o grande legado dos técnicos estrangeiros nesta recente passagem por terra brasilis sejam as entrevistas coletivas no pós-jogo. Não são só as respostinhas atravessadas, com direito a extrato da conta bancária, que chamam a atenção. Os gringos falam do jogo como não ouvíamos antes —coloco Rogério Ceni nessa turma.
Mas, com os campeonatos se afunilando, as entrevistas coletivas estão ficando mais tensas, principalmente porque muitos estão embarcando no "comportamento quinta série", aquele que a gente tinha no ginásio, provocado pelo telefone sem fio nas conversas pós-jogo —os leitores mais jovens dirão que todo telefone é sem fio e que esse comentário não tem sentido, mas seus pais sabem do que estou falando.
Funciona assim (situação completamente hipotética): um técnico derrotado fala na entrevista, por exemplo, que o seu time teve dificuldade para marcar gol porque a equipe do amiguinho se defendeu bem e reduziu o campo. O jornalista (?) corre para a entrevista do outro coleguinha e diz, "oh, o professor disse que você só sabe jogar atrás… e que tem sorte". Pronto, o coleguinha vitorioso fica chateado e dá uma resposta atravessada, diz que foi o outro que não soube atacar direito. E aí vêm réplicas, tréplicas e mais sequências que "Sexta-Feira 13".
Tivemos alguns "true crimes" de leva e traz nas coletivas deste ano, como nos duelos Abel Ferreira x Rogério Ceni e Abel Ferreira x Cuca. Abel normalmente está envolvido. E por quê? Porque é o líder do Brasileiro, porque é o bicampeão da Libertadores, porque o sucesso incomoda —como diria Tom Jobim, o sucesso no Brasil é ofensa pessoal.
O problema em relação a Abel é que a coisa está passando do ponto. Seu confronto com Cuca deveria dizer respeito apenas a Abel e Cuca. Mas os treinadores —coincidentemente brasileiros— resolveram tomar partido.
Primeiro foi Mano Menezes, do Internacional, que falou, sem citar Abel, que o português queria dar aula e ensinar a jogar.
Depois veio Jorginho, do Atlético-GO. O técnico que era auxiliar de Dunga na Copa-2010 já apelou duas vezes para um falso patriotismo e está flertando perigosamente com a xenofobia ao se referir ao míster. Na última, disse que "não estamos na época em que portugueses estão vindo para cá e descobrindo o futebol".
Dois meses antes, quando perdeu para o Palmeiras, reclamou do comportamento de Abel novamente usando "a pátria", quando disse que Abel "vem ao nosso país e está desrespeitando nosso país, nossos árbitros". Abel não é madre Teresa, mas Jorginho não é professor de etiqueta.
No ano passado, Abel adotou um novo lema no Palmeiras. Trocou o "todos somos um" para um "contra tudo e contra todos", no qual ele pode encaixar todas as reclamações que faz (muitas vezes com exagero) contra a arbitragem.
Essa nova união de treinadores contra Abel provavelmente vai só fazer ferver o "contra tudo e contra todos" no vestiário palmeirense. Logo mais alguém está fazendo uma camiseta com o slogan. E talvez seja o combustível final para a arrancada do time no Brasileiro contra o Flamengo, único perseguidor.
Round 38 – Atualização
Ceará e Coritiba foram os últimos a demitir treinadores na carnificina da Série A. Este colunista confessa que já perdeu a conta de quantos técnicos já perderam a cabeça, mas acredita que chegaremos à meta de 20 degolas antes do round 38. Entre os sobreviventes, estamos diante de um empolgante empate após a demissão do paraguaio Gustavo Morínigo: Estrangeiros 4 x 4 Brasileiros (contando Dorival Júnior, que trocou de brinquedo, mas não perdeu nenhuma rodada).
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.