Devido a um engano qualquer, os jornais noticiaram que o ainda presidente americano Joe Biden concedeu um indulto ao seu filho Hunter. É preciso ser mais rigoroso, porque não foi só isso que aconteceu. Biden concedeu um indulto ao filho e uma anistia a Donald Trump. Tudo ao mesmo tempo.
No preciso momento em que perdoou o filho, Biden anistiou Trump de todas as trambiquices que já fez e das que virá a fazer. Talvez possamos parar de conjecturar sobre a razão pela qual candidatos como Trump obtêm tantos votos. Será por eu ainda usar as terríveis palavras denegrir e esclarecer?
Será pela nossa recusa em passar a dizer "todes", "amigues", e fazer com que todas as palavras passem a acabar em "e" —com a óbvia exceção da palavra presidente, que já acaba em "e" mas tem mesmo de passar a acabar em "a" porque é indispensável ser presidenta?
A princípio —surpresa!— isso é totalmente irrelevante. Talvez sejam outras coisas. Por exemplo, há quem tente impor a ideia segundo a qual há uma trambiquice do bem e uma trambiquice do mal.
Creio que o povo —que, me lembro, é quem manda— não tem o paladar suficientemente apurado para distinguir as sutilezas da trambiquice. Quando vê trambiquice, curiosamente, considera que está a ver trambiquice, em vez de ter a sofisticação necessária para distinguir a boa da má.
Joe Biden tentou dar uma ajuda, dizendo esperar que o povo americano compreendesse a razão pela qual um pai e um presidente tomariam aquela decisão. É mais provável que os americanos tenham entendido que, ao contrário do que pensavam, não tinham eleito um presidente, mas alguém que é um presidente e um pai.
Infelizmente, não é o seu pai. Os eleitores que fogem dos impostos e são acusados de crimes continuam a ser julgados. Só o eleitor que é filho do presidente é quem usufrui do direito de ser indultado.
Donald Trump já tinha conseguido a proeza de transmitir a ideia de que não pertence à elite quando é um milionário que tem o privilégio de não pagar impostos, e já se tinha apresentado como o salvador que vai "drenar o pântano" quando a sua conduta dificilmente poderia ser mais pantanosa.
Agora, com a ajuda de Joe Biden, o futuro presidente dos Estados Unidos obtém a última vitória: ele pode se apresentar como uma pessoa normal.
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