A Copa do Brasil era o atalho para a Libertadores.
Não parecia mais do que isso quando o São Paulo, campeão continental de 1992, entendeu que não precisava dela. "O torneio não nos daria nada", diz o diretor de futebol da época, Khalef João Francisco, repetindo o que se falava nas reuniões
Bem... poderia dar um título que ainda hoje o São Paulo persegue.
O troféu que falta à galeria do Morumbi.
Era uma delícia conviver naquele Centro de Treinamento da Barra Funda, do início da década de 1990.
Telê Santana era cercado por jornalistas em entrevistas coletivas improvisadas, ao lado da linha lateral do campo de treinos.
Ai de você se pisasse no gramado. Para Telê, era território sagrado.
Mascava seu chiclete e respondia resmungando, até que a rodinha de repórteres se desfizesse. Quem esperasse e tivesse sorte poderia ficar a sós com Telê.
Numa dessas vezes, perguntei-lhe se conhecia a crônica de Mario Filho cujo título era: "Telê!".
Diante da resposta negativa, fui ao carro, peguei o livro, abri na página certa e lhe apresentei o texto. Escreveu Mario Filho:
"A presença de Telê é uma dessas coisas que ninguém pode ignorar. Ele joga os 90 minutos. Dito assim parece que não é nada demais. O jogo dura 90 minutos, o que pode sugerir, como sugere à primeira vista, que todos jogam 90 minutos. Jogariam, se não fosse Telê. Quer dizer, a gente não ia desconfiar que não jogam, se não fosse Telê. Telê trouxe uma nova medida de tempo para o futebol. É, de algum modo, o ponteiro dos segundos, o que não para".
Mario Filho falava sobre o jogador do Fluminense dos anos 1950, não sobre o treinador-craque do São Paulo.
Telê leu, sorriu e saiu caminhando, sem olhar para trás, sem parar, porque Telê não parava nunca.
Nunca devolveu o livro e nunca o cobrei.
Comprei outro, até hoje em meu arquivo.
Numa das conversas da concentração, Telê disse aos dirigentes que a Copa do Brasil não interessava mais. Se seria apenas o atalho para a Libertadores, e se o São Paulo, campeão da Libertadores, já estava classificado para a próxima edição, não precisava dela.
"A Copa do Brasil não tinha relevância. Nós tomávamos decisões colegiadas. Comunicamos o presidente Pimenta e ele aceitou", lembra o diretor Fernando Casal De Rey, sem saber ao certo de quem partiu a ideia.
Para Telê, quanto mais jogos, menos qualidade. E o técnico, que não parava nunca, trabalhava sempre pelo bom futebol. O São Paulo entrou em campo 84 vezes em 1992, outras 98 no ano seguinte.
O time estava jogando demais. Era o argumento de Telê ou, pelo menos, com o qual concordava.
Seria a segunda participação do São Paulo, eliminado nas quartas de final de 1990, pelo Criciúma. No dia 14 de julho de 1992, menos de um mês depois do título são-paulino da Libertadores, o Palmeiras estreou no mata-mata, contra o Sampaio Corrêa. "Entra na disputa na vaga do São Paulo, que a considerou perda de tempo", escreveu a Folha, naquele dia.
O Palmeiras, dirigido por Otacílio Gonçalves, foi até as semifinais e perdeu para o Internacional, o campeão. Os gaúchos jogaram com Gato Fernández, Célio Lino, Célio Silva, Pinga e Daniel Franco; Ricardo, Élson e Marquinhos; Maurício, Gérson e Caíco. O São Paulo era o melhor time da América. Ia perder?
Não sou supersticioso, porque dá azar... É como se a Copa do Brasil rejeitasse, há 31 anos, o clube que a rejeitou em 1992.
Finalmente, neste domingo, o Tricolor pode ser campeão.
O Flamengo está vivo. Para o São Paulo, a Copa do Brasil pode ter o efeito de reconstrução que teve para o Palmeiras, há oito anos.
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