Marrocos só precisa de um empate com o Canadá, nesta quinta-feira (1º), para se classificar às oitavas de final pela segunda vez na história. Em 1986, fechou a primeira fase na liderança de um grupo que tinha Inglaterra, Polônia e Portugal, e foi eliminada no quarto jogo, com gol de falta de Lothar Matthäus, da Alemanha, no último minuto.
Os marroquinos não são "a África" na Copa. São árabes.
Mariah é garçonete do restaurante de um hotel em Doha. Nasceu em Casablanca. Na hora do hino nacional de Marrocos, minutos antes da vitória sobre a Bélgica, pôs a mão sobre o peito e cantou em posição de sentido.
Na véspera, torcia loucamente para a Tunísia. Pergunto: "Se você é marroquina, por que torce pelos tunisianos?" Respondeu: "Somos vizinhos". Os árabes estão na Copa torcendo pelos árabes, o que talvez ajude a explicar a vitória saudita contra a Argentina.
O único país árabe a colecionar derrotas foi o Qatar, primeiro anfitrião eliminado na segunda rodada.
Se a surpresa marroquina se confirmar, necessariamente haverá um dos semifinalistas de 2018 ausente das oitavas. Ou a Bélgica, terceira colocada, ou a Croácia, vice-campeã.
Zebra em Copa do Mundo é quando não há zebras.
Quatro anos atrás ninguém apostava em croatas e belgas nas semifinais. Não se imaginava a Costa Rica nas quartas de 2014, depois de eliminar Itália e Inglaterra, nem a França excluída na fase de grupos, em 2010, Portugal semifinalista, em 2006, ou Turquia e Coreia do Sul, em 2002.
A desunião do elenco da Bélgica é a razão aparente do péssimo início, vitória magra contra o Canadá e derrota inesperada para o Marrocos. O zagueiro Vertonghen falou sobre a lentidão –ou velhice– do ataque. O técnico espanhol Roberto Martínez minimizou a crise.
A Croácia tem um time mais envelhecido do que a Bélgica. Modric foi o homem capaz de desbancar o reinado de dez temporadas com Messi e Cristiano Ronaldo revezando-se como melhores do mundo. Já tem 37 anos. Como ele, oito titulares passaram dos 30.
A geração está na história por ter chegado a uma final, como os velhos iugoslavos esperavam conseguir antes da Guerra dos Balcãs.
Em 1987, no Chile, a Iugoslávia eliminou o Brasil e ganhou o título mundial sub-20 contra a Alemanha com uma geração poderosa e cinco jogadores que levariam a Croácia à sua primeira semifinal, na França-1998: Jarni, Stimac, Suker, Boban e Prosinecki.
Um ano antes de a guerra explodir, a Iugoslávia chegou às quartas da Copa da Itália e quase eliminou a Argentina, numa decisão por pênaltis em que Maradona desperdiçou sua cobrança. Três meses antes de se iniciarem as batalhas pela independência da Croácia, o Estrela Vermelha foi campeão da Europa, com Prosinecki em seu meio de campo e Savicevic no ataque.
Foi o período mais rico da história do futebol eslavo, abortado pela guerra.
Hoje, a Croácia não quer ser surpresa pela eliminação, nem ser vista como zebra. Simplesmente pretende ir de novo às finais.
O brasão de armas croata, quadriculado em branco e vermelho, estampa sua camisa e empurra a Croácia, assim como Marrocos é levado pelo canto do hino de Mariah.
É uma unidade que talvez falte à Bélgica.
Talvez...
Copa do Mundo não se ganha com a mão no coração. Ganha-se com os pés e com a bola.
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