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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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Ministro de Lula viabiliza emissora disputada por bolsonaristas

Juscelino Filho (Comunicações) publicou portaria com regras que favorecem Sistema Patense de Radiodifusão; evangélicos têm interesse na compra

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Brasília

Em pleno governo do PT, uma portaria do ministro Juscelino Filho (Comunicações) privilegiou uma emissora de TV de Patos de Minas (MG) disputada por grupos ligados a Jair Bolsonaro.

O interesse pela empresa surgiu no ano passado, após o então ministro das Comunicações do governo Bolsonaro, Fábio Faria, conceder para o Sistema Patense de Radiodifusão quatro retransmissoras (repetidoras do sinal da geradora da TV) no canal 42 nas cidades paulistas de Avaré, Cananeia, Cajati e Juquiá.

O ministro Juscelino Filho ao lado do presidente Lula
O ministro Juscelino Filho ao lado do presidente Lula - Pedro Ladeira - 29.dez.2012/Folhapress

Com a medida, a emissora, registrada em nome do empresário Oscar Santos de Faria, se tornou um canal de rede e passou a valer, imediatamente, R$ 20 milhões.

Um canal de rede se forma por uma geradora e ao menos três retransmissoras (RTVs), que podem estar em outros estados. No caso do Sistema Patense, a geradora está em MG e as retransmissoras, em SP.

O ministério, então, abriu um chamamento público para que o canal 42, vago em São Paulo para geradoras, fosse concedido.

Naquele momento, aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro no Planalto tentavam transformar o Sistema Patense em um canal de direita.

Com o edital para o leilão, a emissora tornou-se alvo de grupos evangélicos ligados a Bolsonaro. O objetivo era ter um canal de rede com sinais em São Paulo, principal mercado do país.

No entanto, às vésperas do leilão, durante o governo de transição, emissários do presidente Lula pediram ao ministério que o edital fosse suspenso, adiado ou refeito.

O ministério, então, decidiu pelo cancelamento.

Na semana passada, o ministro Juscelino Filho publicou uma portaria com as regras do chamado Plano de Outorgas, que prevê editais para reorganização do uso das frequências pelos radiodifusores.

Frequências são avenidas no ar por onde as emissoras fazem trafegar seus sinais sem interferências.

De acordo com a portaria, em casos de concorrência por um canal, terá preferência a emissora que tiver canal de rede com retransmissoras na localidade pleiteada —algo que, no governo passado, o Sistema Patense conseguiu.

O segundo critério de desempate é a distância das retransmissoras instaladas no estado em relação à capital em que se pleiteia o canal.

Técnicos do ministério e da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) afirmam que, dentro dos grupos que hoje operam com o 42 em São Paulo, a retransmissora do Sistema Patense é a que está mais próxima da capital paulista.

Radiodifusores afirmam que, com a portaria, o canal 42 em São Paulo cairá no colo no grupo mineiro em leilão a ser definido pelo ministério.

Reação em cadeia

As grandes emissoras de TV reclamaram bastante sobre essa situação junto ao ministro Juscelino Filho antes que a medida fosse publicada –e não somente devido ao caso do canal mineiro.

Na última versão da minuta da portaria, a que a coluna teve acesso, o ministério também favorecia a Record, do bispo Edir Macedo, outro aliado de Bolsonaro.

Isso porque, ao disciplinar a concessão de retransmissoras, o critério definidor inicial era a idade da emissora.

A Record é a mais antiga do país e, por esse critério, seria favorecida caso pleiteasse um canal onde ainda não tem sinal.

Após intensa pressão, o ministro acabou deixando esse critério no fim da lista de exigências de uma concorrência pública.

O mercado estima que, se fosse outorgar o canal 42 em São Paulo via concessão, o vencedor teria de arcar com, pelo menos, R$ 200 milhões.

Outro lado

O Ministério das Comunicações informou que o Plano Nacional de Outorgas foi uma saída para "tratar, de forma sistêmica, todo o passivo processual referente a esse serviço [pedido de canais], que hoje supera 9 mil processos em estoque".

"A portaria buscou trazer regras para conferir maior transparência às outorgas desses canais, delineando que os mesmos devem ser submetidos a processos seletivos, análises de viabilidade técnica pela Agência Nacional de Telecomunicações, bem como estabelecendo critérios de desempate para cada solicitação", diz em nota.

Sobre o canal 42 em São Paulo, a pasta afirma que "será objeto de seleção por editais a serem lançados pelo Ministério das Comunicações, que contemplará os pedidos em localidades com canais vagos".

O ministério informa ainda que, atualmente, existem seis empresas classificadas como rede no estado de São Paulo, critério inicial para que entrem na disputa.

No entanto, segundo os radiodifusores consultados, todos já têm sinal no estado, o que os impede de entrar em um eventual certame.

O ministério foi questionado sobre isso, mas não respondeu até a publicação desta reportagem.

A coluna entrou em contato diretamente com o empresário Oscar dos Santos Faria, dono do Sistema Patense de Radiodifusão.

Por telefone, ele afirmou não ter conhecimento sobre a portaria. Ao ser informado pela reportagem sobre o teor da medida, comemorou.

A coluna enviou então questionamentos específicos por escrito.

Em resposta, o empresário disse que não tem qualquer ligação com grupos políticos ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro e que o pedido das retransmissoras teve "lastro em projeto de expansão da área de cobertura da Rede Patense para toda a região sudeste do país".

"Configurações políticas não fazem parte do escopo de prestação de serviços da emissora", disse Faria.

"Por ser concessionária, portanto geradora de programação, o Sistema Patense de Radiodifusão detém condição de pleitear outorgas de autorização visando à exploração de serviços de RTV [retransmissoras] em qualquer parte do território nacional", afirmou.

O empresário disse ainda que a emissora já recebeu ao longo dos anos, desde a sua constituição, diversas propostas comerciais de interessados na sua aquisição, desde entidades religiosas até outros grupos de televisão.

Com Diego Felix

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