Na minha pesquisa com famílias de nonagenários tenho encontrado muitas mulheres da chamada "geração sanduíche".
Elas receberam o nome de "geração sanduíche" por estarem "espremidas, comprimidas, apertadas, esmagadas, imprensadas, premidas" pelas obrigações e responsabilidades de cuidarem de extremos. São mulheres, em geral com idades que podem variar de 40 e 70 anos, que cuidam dos pais idosos, dos cônjuges, dos filhos e, em alguns casos que tenho pesquisado, também dos netos.
Nas 30 famílias que tenho acompanhado desde 2015, encontrei apenas dois casos de homens que são os principais responsáveis pelos cuidados de pais idosos, filhos e netos. Nas 28 famílias restantes, são as mulheres que estão "ensanduichadas".
Se, nas décadas passadas, as mulheres reclamavam das duplas jornadas de trabalho, hoje, elas falam de múltiplas jornadas de trabalho: casa, emprego, pais idosos, filhos, netos, cônjuges e muito mais. Elas se sentem doentes, deprimidas, impotentes e exaustas. Algumas me disseram que são, na verdade, uma "geração equilibrista".
Como o Censo de 2022 revelou, o Brasil está envelhecendo muito rapidamente. Além das mudanças demográficas, com muito mais idosos, é cada vez mais comum que filhos adultos, que ainda estão estudando ou desempregados, morem com seus pais e sejam sustentados por eles: é a chamada "geração canguru".
As mulheres sentem com muito maior intensidade o peso de cuidar dos pais idosos e dos filhos. Em uma das famílias que estou pesquisando, uma médica, de 65 anos, que se casou recentemente com um médico de 72, cuida da mãe, de 93 anos, que está com Alzheimer, do pai de 97 anos, e do filho de 32 anos que ainda estuda e mora com ela.
"É muito estressante, pois, além das responsabilidades familiares e conjugais, eu ainda trabalho muito. Meu marido também trabalha, e anda bastante estressado, mas quem cuida dos pais idosos dele é a irmã caçula, e quem cuida dos filhos dele é a ex-mulher. Nós, mulheres, ficamos muito sobrecarregadas. Todos os dias atendo, no meu consultório, mulheres que estão deprimidas, exaustas, ansiosas e impotentes, como eu também estou, mulheres que estão à beira de um ataque de nervos".
Além de cuidar dos pais idosos e do filho caçula, a médica ainda cuida do filho mais velho, de 47 anos, que teve um princípio de infarto e um Acidente Vascular Cerebral no início da pandemia.
"Para piorar ainda mais a situação, meu filho mais velho, que é músico, teve um AVC no início da pandemia. Ele tem dois filhos pequenos. Minha nora é enfermeira, não ganha o suficiente para sustentar a família. Além de ajudar financeiramente, preciso acompanhar de perto a sua recuperação. Estou pensando em me mudar para uma casa maior, pois seria mais fácil cuidar dele se morássemos juntos. Acabei de me casar. Como meu marido vai lidar com tudo isso? Ando tão estressada e exausta que só quero dormir o dia inteiro. Não consigo nem mais transar com meu marido."
A maior preocupação da médica é ter algum problema sério de saúde, pois, com a sobrecarga de obrigações, ela não tem conseguido cuidar da própria saúde física e mental.
"E se eu ficar doente? E se eu morrer? Quem vai cuidar dos meus pais idosos, dos meus filhos e netos? Eu, que sempre fui muito ativa, produtiva e saudável, estou me sentindo uma velha decrépita. Parece que envelheci 20 anos durante a pandemia. Apesar de ser médica, não tenho tempo para cuidar de mim, não faço exercícios, passo dias sem ter tempo para almoçar. Tive que abandonar o curso de especialização que estava fazendo. Precisei parar com a terapia, pois não tenho dinheiro para luxos agora. Não posso parar de trabalhar, pois muita gente depende de mim e minha aposentadoria não daria para nada. O pior de tudo é que me sinto completamente sozinha, não recebo apoio e ajuda de ninguém."
Como tenho acompanhado de perto o sofrimento e até mesmo o sacrifício das mulheres "ensanduichadas", a pergunta que não quer calar é: "Quem vai cuidar das mulheres que cuidam de todos, mas não têm tempo para cuidar de si?"
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