Da sacada da casa do embaixador brasileiro em Londres, o presidente Bolsonaro berrou, para o pequeno grupo de apoiadores aglomerado na rua, que qualquer resultado diferente de sua vitória no primeiro turno seria indício de que "algo anormal aconteceu dentro do TSE".
Mais tarde, em entrevista a um blogueiro simpatizante, repetiu o mote, antecipando o que deverá ser a sua reação em face da derrota que as pesquisas indicam. Se não há por que esperar anormalidades nem na votação nem na contagem eletrônica dos sufrágios, a campanha que as precede reduz a pó o padrão ao qual o país se habituou já lá se vão três décadas.
Denúncias, ataques e até golpes baixos têm sido recursos corriqueiros dos caçadores de votos. Inédita é a desqualificação antecipada das instituições eleitorais por quem se candidata —de novo, no caso— ao posto mais ambicionado da República. Tampouco as paixões de confrontos idos se comparam ao clima funesto resultante da sistemática disseminação de suspeitas sobre o modelo de votação; da coreografia violenta das motociatas; dos cartazes brandidos em passeatas pedindo a volta da ditadura; das ameaças, nas redes e nas ruas, a simpatizantes de Lula ou dos tenebrosos episódios de assassínio de adeptos do ex-presidente.
Não surpreende, portanto, que a pesquisa "Violência e Democracia", feita pelo Datafolha para a Raps (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade) e o FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública), revele que 7 em cada 10 brasileiros têm medo de ser agredidos em razão de sua escolha partidária e que espantosos 5,3 milhões de cidadãos relatem haver sofrido ameaças por causa de suas posições políticas.
Tampouco é normal que nem sequer com a mais poderosa das lentes imagináveis se possa vislumbrar um pronunciamento —um só!— do aspirante à reeleição sobre o que pretende fazer no segundo mandato. Qual sua visão acerca do que realmente importa: como fazer a economia crescer; como substituir o teto de gastos; como dar segurança mínima aos muito pobres; como remediar o atraso educacional agravado pelo prolongado fechamento das escolas na pandemia; como robustecer o SUS; como cumprir os compromissos do Acordo de Paris e defender o meio ambiente dos agentes da destruição; como reconquistar o respeito internacional perdido.
Por fim, quem viu o presidente usar o 7 de Setembro para mobilizar eleitores e o ouviu degradar a tribuna da ONU em palanque sabe que nada é normal na sua lida para permanecer no Palácio do Planalto a qualquer preço, pouco se importando com a vergonha que inflige ao Brasil mundo afora.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.