Há certa confusão conceitual no debate sobre as consequências de nossos governos de coalizão para a economia e a governabilidade. Entre os cientistas políticos, a ênfase é posta na relação Executivo-Legislativo e a governabilidade. A questão de interesse é a capacidade do Executivo em aprovar sua agenda. Para os economistas, é a de promover o crescimento.
Crises canônicas de governabilidade envolvem presidentes impondo unilateralmente suas agendas a um Legislativo recalcitrante, e deflagrando crises institucionais e intervenções militares.
Os poderes constitucionais do Poder Executivo —reativos (ex. vetos) e proativos (ex. MPs, iniciativas exclusivas)— influenciam a relação Executivo-Legislativo. Idem para a distribuição de pastas ministeriais e execução de emendas. O manejo destes instrumentos permite ganhos de troca entre Legislativo e
Executivo e pode assegurar governabilidade: ele determinará o grau de prevalência da agenda presidencial. Sim, a agenda é endógena: o Executivo escolhe o que submeter ao Congresso; pode inclusive garantir governabilidade renunciando a sua agenda. Mas governabilidade não é garantia de eficiência das politicas.
A visão estereotipada é de Legislativo perdulário e Executivo racionalizador. É certo que o Executivo tem incentivos eleitorais mais potentes para se assegurar bens públicos nacionais (ex. crescimento; inflação baixa), enquanto os parlamentares da base têm incentivos para garantir bens públicos locais. Estes podem ou não internalizar os incentivos nacionais e locais; a variável central aqui será os partidos.
A agenda do Executivo, no entanto, pode estar ancorada em crenças tecnicamente infundadas (ex. que estatais e gasto público garantem crescimento). E muito pior: ser abertamente oportunista e curto prazista em anos eleitorais. O enorme potencial de abuso político da política econômica tem implicações sobre o crescimento.
Canes-Wrone e colegas em estudo recente, com painel de 57 países durante 40 anos, mostra que a existência de restrições ao Executivo na forma de instituições independentes (Judiciário, agências reguladoras, bancos centrais) mitigam o impacto da alternância de poder, em virtude da competição eleitoral, com impactos positivos sobre o fluxo de investimentos. Ademais, como mostrou Noorudin em Coalition Politics and Economic Development (2011), governos de coalizão têm maior capacidade de fazer compromissos críveis quanto às políticas a serem adotadas pois minimizam a volatilidade e abusos que podem decorrer de concentração de Poder no Executivo.
Assim, as evidências sugerem que nossas patologias fiscais não derivam de termos governos de coalizão. Elas podem até ter sido minimizadas por elas.
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