Lúcia Guimarães

É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

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Lúcia Guimarães
Descrição de chapéu Eleições EUA

Pesquisas não conseguem registrar cenário pré-eleições dos EUA

Executados sem debate público, levantamentos não avaliam com precisão eleitores que, na reta final, ficam em casa

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Uma consequência nefasta das intermináveis campanhas presidenciais nos Estados Unidos é a obsessão com pesquisas. A campanha de 2024 é a mais longa e entrou no quarto ano, graças ao ex-presidente que não aceitou o resultado de 2020 e tentou um golpe de Estado.

A possibilidade de uma vitória do candidato no momento esquentando o banco dos réus no sul de Manhattan tem tornado o ritual de anúncios de novos números comparável à exibição de um novo filme de terror de Jordan Peele.

Um eleitor marca cédula em referendo sobre aborto em uma seção eleitoral do condado de Wyandotte, na cidade de Kansas - Eric Cox - 2.ago.22/Reuters

A maioria –sim, ainda a maioria– dos americanos que prefere eleições limpas, justiça independente e proteções constitucionais tem reações de pânico com as manchetes, como a da recente pesquisa realizada pelo The New York Times com o instituto Siena: "Trump lidera em cinco estados-chave, com eleitores jovens e não brancos descontentes com Biden".

A escolha de presidentes nos EUA que não reflete a maioria, obtida na base de um eleitor/um voto, resulta na eleição de presidentes derrotados no voto popular, mas vitoriosos no Colégio Eleitoral. Projeções este ano variam, mas colocam de 100 mil e até ínfimos 10 mil o número de eleitores que podem decidir a vitória em novembro. É assustador.

As pesquisas, apesar de mencionar o universo de "eleitores prováveis", não tomam com precisão o pulso do perene terceiro candidato viável neste alquebrado sistema bipartidário: o eleitor que, na reta final, fica em casa.

As pesquisas são capturas tênues de momentos. São executadas sob modelos proprietários, não debatidos em público e desenvolvidos por acadêmicos, estatísticos, previsores econômicos e frequentemente criticadas por miopia sobre as criaturas de carne e osso na disputa.

Elas refletem também a explosão de desinformação da última década, abraçada e amplificada pelo Partido Republicano e alimentada pela mídia trumpista.

Com a humildade de quem ficou em recuperação em estatística na universidade, não posso compreender a pergunta colocada pela pesquisa Times/Siena: "Quem é o maior responsável pela Suprema Corte ter acabado com o direito constitucional ao aborto?" A pergunta é absurda, já que Biden, além de ferrenho defensor do direito ao aborto, não indicou um só dos juízes que recriminalizaram o aborto.

Bingo! 18% dos que responderam nos estados-pêndulo que devem decidir a eleição atribuíram a responsabilidade a Biden.

"Democratas agem como termômetros. Republicanos agem como termostatos," lembra a consultora política e especialista em psicologia cognitiva Anat Shenker-Osorio.

Um exemplo seria o efeito do movimento de protesto anti-Israel numa possível derrota de Biden. Muito antes de erguerem acampamentos na Universidade Columbia, na cidade sede da mídia americana, republicanos já atormentavam universidades, denunciando reitores e professores, espantalhos perfeitos para sua rotação de vilões usados para provocar indignação recreativa.

Quando os protestos se tornaram violentos, a receita para culpar democratas já estava no ponto. Uma pesquisa que ignore esta diferença pode prever uma eleição daqui a quase seis meses?

O fato é que republicanos decidem primeiro o que querem tornar popular para martelar na cabeça do eleitor, como a inexistente ameaça trans na educação. Isso ajuda a explicar os altos números de angústia com a economia, que se recuperou com rapidez. Já os democratas andam a reboque de temas que são populares no mundo real. Não há pesquisa no momento que possa registrar este cenário.

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