Juca Kfouri

Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP.

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Muitas vezes é mais difícil saber ganhar do que perder

Nada que seja humano pode ser estranho e o esporte exala humanidade em estado puro

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O que sempre se diz sobre o esporte é que nele se aprende lidar com a frustração e com a euforia. Muitas vezes é mais difícil saber ganhar do que perder.

O futebol brasileiro tem exemplos para todos os gostos.

O "vocês vão ter de me engolir" de Zagallo depois da conquista da Copa América em 1997 é um desses casos.

O capitão Dunga xingando os fotógrafos ao levantar a taça da Copa do Mundo de 1994 é outro.

No momento celebrizado por Hilderaldo Luís Bellini ao erguer a taça em 1958, e depois seguido por Mauro Ramos de Oliveira, em 1962, Carlos Alberto Torres, em 1970 e, finalmente, por Cafu (Marcos Evangelista de Morais), em 2002, para Dunga (Carlos Caetano Bledorn Verri), virou desabafo.

Até se brinca que enquanto quatro capitães da seleção brasileira ergueram a taça aos céus, Dunga a xingou, o que é meia-verdade porque depois de xingar ele também a ergueu.

Um atleta está jogando tênis de mesa, usando uma camiseta amarela com detalhes coloridos. Ele está em movimento, prestes a rebater uma bola que está no ar. Ao fundo, há pessoas assistindo ao jogo, mas não são claramente visíveis.
Hugo Calderano durante a disputa em que perdeu a medalha de bronze nos Jogos de Paris - Mathilde Missioneiro/Folhapress

Já o Doutor Sócrates, capitão do time que perdeu a Copa em 1982, ao terminar o jogo contra a Itália, sem nenhuma queixa ou busca de culpados, limitou-se a responder assim ao repórter que perguntou o que dizer à torcida: "Que pena, Brasil".

Mais tarde era até capaz de dizer que o melhor que poderia ter acontecido para aquele time foi exatamente ter perdido porque em caso contrário "ficaríamos bestinhas", declaração difícil de saber até que ponto era mesmo sincera.

Esta 33ª Olimpíadas diariamente nos dá aulas de como saber perder, muito porque um certo ufanismo nas transmissões antes de cada disputa faz parecer favoritismo brasileiro onde o favoritismo inexiste.

Imediatamente depois do gosto amargo da derrota vem a contextualização sobre o real significado do resultado, muitas vezes verdadeiramente excepcional.

O caso do mesa-tenista Hugo Calderano é exemplar.

Sobre seus ombros, sexto colocado no ranking mundial, criou-se a expectativa de que ele poderia trazer a primeira medalha do esporte para o Brasil.

Ao disputar a semifinal contra o sueco Truls Moregard, Calderano vencia o primeiro set por 10 a 4 e sofreu a impensável virada para 12 a 10.

Ainda conseguiu ganhar dois sets por 11/7 e 17/15, mas perdeu por 4 a 2.

Não é preciso entender de Psicologia do Esporte para perceber o tamanho do trauma depois da virada inicial. Impressionante mesmo, quase do tamanho da virada sofrida, foi ter conseguido vencer dois sets.
Na disputa da medalha de bronze aconteceu o previsível: perdeu para o francês Felix Lebrun por 4 a 0, com parciais de 7/11, 10/12, 7/11 e 6/11.

Já imaginaram a rara leitora e o raro leitor como foram as noites de Calderano da sexta-feira para o sábado e do sábado para o domingo? O quanto ele remoeu o insucesso na semifinal?

Calderano obteve simplesmente o quarto melhor lugar numa Olimpíada e segue entre os principais mesa-tenistas do mundo, algo que só passa a ser realçado depois de terminada a competição.

Ao perder para o sueco ele não escondeu a decepção e falou em ter de "passar a raiva" para disputar bem o bronze, ou seja, fez questão de não aliviar a barra para si mesmo.

"Nem que fosse na força do ódio", disse a judoca Rafaela Silva ao garantir o bronze por equipes depois de ter visto escapar a medalha na chave individual.

Raiva, ódio, desabafo, humildade, máscara, generosidade, nada que seja humano pode ser estranho e o esporte exala humanidade em estado puro.

Porque a emoção revela o que há de mais verdadeiro em cada um.

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