Jair Bolsonaro não é nem mesmo original. Vários de seus ataques à ciência e às instituições são cópias pioradas de investidas ensaiadas por Donald Trump. O caso mais emblemático é o 8/1, reprodução do assalto ao Capitólio patrocinado pelo ex-inquilino da Casa Branca. Outras "coincidências" incluem o negacionismo climático e vacinal, as agressões ao sistema eleitoral, o apreço pelas fake news. Até a tentativa de pôr as mãos em presentes de Estado os irmana.
Se isso configura um padrão, temos motivos para preocupação. Trump está mostrando que, mesmo fora do poder, ainda é capaz de impor desgastes às instituições. Aliados do republicano pintam sua denúncia pelo Departamento de Justiça como uma declaração de guerra e conclamam seus apoiadores a revidar. Eles próprios fazem questão de lembrar que o público trumpista inclui 75 milhões de portadores de armas.
Não creio que essa retórica inflamada levará a uma guerra civil, mas ela decerto contribui para a normalização da violência política e o descrédito do sistema de Justiça. Ao menos para o eleitor trumpista, uma eventual condenação será a "prova" de que a elite de Washington persegue o republicano e fará tudo para impedi-lo de voltar à Presidência.
Bolsonaro terá em breve outra oportunidade de emular seu ídolo. Está marcado para o próximo dia 22 o julgamento, pelo Tribunal Superior Eleitoral, de uma ação que poderá torná-lo inelegível por oito anos. Em caso de condenação, não é difícil vislumbrar o capitão reformado insuflando seus apoiadores contra a Justiça. É verdade que nosso sistema não precisa de ajuda externa para desmoralizar-se. A incapacidade do Supremo Tribunal Federal de promover um mínimo de estabilidade jurídica em casos envolvendo políticos já torna tudo sempre meio suspeito, pouco importa se real ou imaginariamente.
O ponto é que, mesmo na derrota, Bolsonaro ainda conserva o poder de dividir a sociedade —e isso faz um mal tremendo à democracia.
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