“O ser humano fica melhor com uma porcentagem de álcool no sangue”, diz um filósofo norueguês que certamente nunca foi ao Baixo Gávea. O filme “Druk” conta a história de professores que descobrem a felicidade na embriaguez e em seguida se deparam com o alcoolismo. Entre a sobriedade e o vício, optam por champanhe —opção que revela o excelente salário de um docente dinamarquês.
A tese do filósofo nórdico talvez faça sentido por lá. Os escandinavos têm uma tensão social que só a bebida alcoólica parece diluir. Tenho medo do efeito que o filme pode causar neste hemisfério.
O carioca definitivamente não nasceu com um déficit de álcool no sangue. Aqui nascemos é com um superávit de cachaça. A bebida não faz nada bem pra um povo já famoso pela irreverência e extroversão, que são dois eufemismos pra falta de noção e ausência de limites.
Posso dizer, na condição de carioca, que viemos ao mundo com uma ducha de água fria e um balde de café a menos que o resto do país.
Por isso, inclusive, o café carioca é mais longo que os outros.
Ao paulista tampouco faz bem o álcool. Veja o que se tornou a Vila Madalena.
Não quero dizer, no entanto, que o paulista acorde pronto pra vida. Nem tampouco que precise de café.
O paulistano com uma dose de expresso abre uma tapioqueria e elege um fascista. Não é disso que a gente precisa. O sangue bandeirante tem um déficit claro de LSD. Se eu fosse prefeito espalhava pela cidade um daqueles caminhões de fumacê com psicodélico. Um paulista em estado lisérgico equivale a um carioca cafeinado que equivale a um mineiro bêbado.
Sim, o mineiro, polido e discreto, merece o álcool: é o nórdico brasileiro. Já o pernambucano, elétrico, carece de canabinoides. O baiano, em contrapartida, já nasce em ponto de bala. De João Gilberto a Marighella, passando por Gil e Caetano, eu entregaria o país nas mãos do baiano abstêmio.
Não deveria ter assistido a “Druk” sóbrio. Tenho horror a bêbado quando não bebi. O bêbado só é tolerável quando se está mais bêbado que ele. Tenho muita saudade do boteco, mas saudade nenhuma do bebum . O filme me lembrou a existência dele, o bêbado-zumbi, seu olhar diagonal, sua boca mole metralhando perdigotos direto na sua pálpebra.
Espero que o filme “Druk” não empodere o bêbado profissional. Caso contrário, não hesitarei em bradar: Vai pra Dinamarca! Ou então me dá um gole.
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