Giovana Madalosso

Escritora, roteirista e uma das idealizadoras do movimento Um Grande Dia para as Escritoras.

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Giovana Madalosso

De uma mãe suada para milhões de outras

Eventos extremos, como o do Rio Grande do Sul, não vão mais parar; e o que isso tem a ver com a nossa maternidade? Tudo e mais um pouco

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Antes de mais nada, feliz dia das mães. Embora esteja difícil ter um feliz Dia das Mães. As flores que colhi para o nosso almoço já murcharam com o calor. E isso não é nada: há milhares de mães que estão passando por esta data desabrigadas, sem um sofá para se sentar com seus filhos. Sem falar daquelas que perderam os filhos.

Eventos climáticos extremos, como esse que aconteceu no Rio Grande do Sul, não vão mais parar de acontecer. E o que isso tem a ver com a nossa maternidade? Tudo e mais um pouco. Quem vai estar no meio dessas tragédias somos nós e nossos filhos. Pela primeira vez, uma crise está impactando todas as espécies de pessoas e de vida no planeta, estejam elas conscientes ou não do que está acontecendo. E não tem amor de mãe, nem ímpeto de super heroína que vá dar um jeito nisso.

Como já vimos, não tem impermeável nem boia que vá protegê-los de enchentes e deslizamentos. Não tem vitamina nem xarope que vá blindá-los contra as bactérias e vírus desconhecidos que serão liberados com o derretimento do permafrost. E nem contra as epidemias que vão surgir com a proliferação de insetos no calor extremo.

Mulher segura criança no colo
Roseana Freitas, abrigada no abrigo da Unisinos, após as chuvas que deixaram milhares de desabrigados no Rio Grande do Sul - Pedro Ladeira/Folhapress

Não tem colo nem canção de ninar que vá apaziguar o pesadelo de viver sob estresse hídrico, sem água para todos. Não tem mangueira de jardim que vá apagar os incêndios que passarão a se proliferar por áreas cada vez mais vastas e diversas. Não tem vela nem corrente de orações que vá recobrar aquele velho regime de chuvas. Nem receita de sopa que vá disfarçar o impacto que isso vai causar na produção agrícola e, portanto, na nossa geladeira.

Não tem ventilador ou ar condicionado que elimine o calor que já está agravando os problemas de saúde dos idosos —num país com divisão desigual de tarefas, quem cuida dos pais como se fossem filhos também somos nós.

E não tem mãos sobre os olhos possam esconder a imagem desoladora de um mundo fraturado pela injustiça climática, em que privilegiados viverão em lugares um pouco mais seguros, enquanto milhões de outros terão que deixar suas regiões. Sem falar nas outras espécies.

E estamos nessa emergência por que grande parte dos políticos, que têm o poder de evitar a crise climática, está há muito tempo colocando seus interesses pessoais acima do coletivo. Aqui no Brasil, seguem passando a boiada do desmatamento, desmontando leis ambientais, empatando a demarcação de terras indígenas, cedendo ao lobby dos combustíveis fósseis e ralentando uma transição energética que deveria estar sendo feita de forma muito mais ágil. Sem falar naqueles prefeitos e pré-candidatos a prefeitos que sequer apresentam um plano de ação climática nas suas cidades. Ou naqueles que disseminam fake news negacionistas para atender aos próprios interesses.

Mas não estou aqui para estragar o nosso dia. Eu estou aqui para lembrar uma coisa boa: no Brasil, somos dezenas de milhões de mães. Dezenas de milhões de gritos. Dezenas de milhões de dedos na cara dos negacionistas. E acima de tudo, dezenas de milhões de votos. Será que isso não é um super poder?

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