![fabrício corsaletti](http://f.i.uol.com.br/fotografia/2015/05/21/513495-115x150-1.jpeg)
Nascido em Santo Anast�cio (SP), em 1978, � autor de 'Esquim�' (Cia. das Letras, 2010) e 'Golpe de Ar' (Ed. 34, 2009). Escreve aos domingos, a cada duas semanas.
Droneiro
Pedro Piccinini | ||
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Meu pai me pede que eu o acompanhe. N�o sei pra onde ele vai, mas topo ir junto. Dou um beijo na minha m�e, que est� lendo no quarto, e vou pra garagem. Mas meu pai j� est� no meio da rua com o carro ligado.
Duas quadras depois, ele saca um bon� do bolso da jaqueta e diz solenemente:
— Filho, voc� sabe que existe o Paulinho Corsaletti dentista, um profissional s�rio, que nunca deixa um cliente na m�o. Esse n�o usa bon�. (Olho pra sua careca.) Mas tamb�m existe o Paulinho Corsaletti violeiro, que n�o recusa uma festa ou um botequim. Esse est� sempre de bon�. (Ele coloca o bon� na cabe�a.) Hoje voc� vai conhecer o Paulinho droneiro. Esse usa o bon� assim. (Ele tira o bon� e o coloca de novo, com a aba virada pra tr�s.)
Paramos numa curva de uma estrada de terra, debaixo de uma �rvore, e meu pai monta o drone. Tenta me explicar a fun��o de cada pe�a, mas de repente paro de acompanhar o racioc�nio. N�o me interesso muito por tecnologia. Meu pai sabe disso e diz pra eu n�o me preocupar com a parte t�cnica, que o melhor est� por vir.
Feito uma mosca gigante de fic��o cient�fica, logo o drone est� sobrevoando os pastos. Na tela do smartphone acoplado ao controle, vemos o vale do Sapo, o rio da �ncora, o rebanho de vacas e alguns cavalos do Camil. O zunido do aparelho assusta os animais. Eles correm, em miniatura, como corriam na minha imagina��o quando eu brincava com meu Forte Apache.
Ent�o meu pai conduz o drone em dire��o � cidade. A esta��o de trem, as casas velhas —alguns meninos soltando pipa. A pra�a Ataliba Leonel, com sua fonte em forma de vit�ria-r�gia. E no alto do morro a igreja amarela e branca, id�ntica a uma pe�a de maquete.
A vida toda � desse tama�nho. Meu pai se anima: vamos fazer uma visita pra Paula.
Ele baixa o drone em cima da casa da minha irm�, ao mesmo tempo em que telefona pra ela. Sai a� no quintal. E l� est� ela! Em seguida surgem minha sobrinha e meu cunhado. Eles acenam pra c�mera e voltam pra dentro. (Mais tarde me contam que dias antes deram um churrasco pra uns amigos e n�o convidaram meus pais. Minha m�e n�o se importou, imagina. Mas meu pai fez o drone descer a uns dois ou tr�s metros da piscina com um cartaz: "ESTOU DE OLHO EM VOC�S, TRAIDORES".)
Depois meu pai telefona pro Buinha. Cad� voc�, seu viado? Est� no Bar do Serginho, com Betinho e Aguinaldo. Vamos l� tamb�m. Na cal�ada, rindo e pulando com um taco de sinuca nas m�os, o Buinha amea�a arrebentar o drone.
Revejo os p�tios das duas escolas onde estudei, os quintais dos amigos, os escombros do supermercado que pegou fogo.
Um carcar� pousa numa cerca n�o muito longe de n�s e sinto vontade de tomar uma cerveja. Meu pai concorda que j� deu e guarda a tralha toda numa caixa cinza de isopor.
De carro, presos mais uma vez em nossos corpos grandes e pesados, meu pai me pergunta como v�o as coisas em S�o Paulo.
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A coluna "Prosa/Poesia" � publicada aos domingos a cada 15 dias na "revista s�opaulo"
Eduardo Knapp/Folhapress | ||
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