![fabrício corsaletti](http://f.i.uol.com.br/fotografia/2015/05/21/513495-115x150-1.jpeg)
Nascido em Santo Anast�cio (SP), em 1978, � autor de 'Esquim�' (Cia. das Letras, 2010) e 'Golpe de Ar' (Ed. 34, 2009). Escreve aos domingos, a cada duas semanas.
Fralda
Pedro Piccinini | ||
![]() |
Ele queria livros emprestados. Tinha planos de come�ar a escrever. Mas principalmente queria ler boa literatura. "Nada de beatnik tomando pico de hero�na no banheiro ou nego doido fazendo suruba no quarto da sogra. Disso eu j� vi o suficiente. Tamb�m n�o t� com saco pra literatura brasileira. Me arruma uns desses gigantes a�, Dostoi�vski, James Joyce."
Sem problemas. Entrei no escrit�rio e olhei as estantes. Pra come�ar, "Matadouro 5", de Kurt Vonnegut, "Franny & Zooey", de J. D. Salinger, "Tanto Faz", de Reinaldo Moraes (mesmo sendo brasileiro, resolvi arriscar), "Iniciantes", de Raymond Carver, e "Amuleto", de Roberto Bola�o.
Devorou tudo em menos de dois meses. Dessa vez levou Philip Roth, Virginia Woolf e Kafka. Na seguinte: Tchekhov, Poe, "Mem�rias de um Sargento de Mil�cias", Dickens e Jane Austen.
Depois vieram Borges, Cort�zar, Felisberto Hern�ndez. Adorou Maupassant, Mark Twain e Italo Calvino. Quando leu Faulkner, disse que nunca mais queria ler Bola�o. Entrou de cabe�a em Dostoi�vski e ficou perturbado. Se encheu um pouco do "Ulysses" mas foi at� o fim. Ouviu dizer que Proust � que era o cara e dedicou um semestre ao "Em Busca do Tempo Perdido".
Ent�o enchi uma sacola s� com poetas: Fernando Pessoa, Drummond, Jo�o Cabral, Szymborska, Ang�lica Freitas, Matilde Campilho, Byron, Cummings, Eliot, Baudelaire, Chacal, N�zim Hikmet. Virou f� dos tr�s �ltimos.
Da prosa brasileira contempor�nea (a essa altura, n�o recusava nada), curtiu o "Di�rio da Queda", do Michel Laub, e o "Budapeste", do Chico Buarque, que ele chama de Chico Buraco.
Passou por Homero, Cervantes, Shakespeare e Voltaire. Voltou pros s�culos 19 e 20. Se surpreendeu com Machado e Graciliano.
Neste momento, est� lendo "Tar�s Bulba", do G�gol (anoto suas leituras num caderno). "Aqueles cossacos malucos", ele diz.
Quem v� o Fralda n�o acredita. Baixista de bandas punks (Ratos de Por�o, Blind Pigs, Lobotomia), parece mais um l�der dos Hells Angels do que um leitor compulsivo e vagamente aristocr�tico, que prefere Balzac a Hunther Thompson.
Mora nos fundos de um est�dio de m�sica de uns amigos e trabalha numa loja de vinis em Perdizes, onde faz a faxina e tira chope artesanal; tem 40 anos e uma semibarriga de cerveja; tatuou na testa a frase "STONE DEAD FOREVER" e usa mais pulseiras e colares que uma falsa baiana de acaraj� de shopping.
�s vezes, tenho a impress�o de que trata o pr�prio corpo como se fosse uma galeria de arte —� uma performance ambulante. Minha mulher diz que ele tem uma no��o forte de estilo. Mas acho que o Fralda (ali�s, Christian Wilson, embora assine os e-mails como "tia Fralda") daria risada dessa conversa.
Na semana passada, veio me devolver o Karl Ove e pegar uma nova leva. Fumando um cigarro enquanto esperava a chuva passar, contou de uma �poca em que dormia num "catre" na cozinha da casa da av�. E antes que eu demonstrasse qualquer estranhamento por aquela palavra t�o pouco underground, ele interrompeu a hist�ria e perguntou rindo, orgulhoso:
- Gostou de "catre", animal?
Livraria da Folha
- Cole��o "Cinema Policial" re�ne quatro filmes de grandes diretores
- Soci�logo discute transforma��es do s�culo 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD re�ne dupla de cl�ssicos de Andrei Tark�vski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade