Nascido em Santo Anast�cio (SP), em 1978, � autor de 'Esquim�' (Cia. das Letras, 2010) e 'Golpe de Ar' (Ed. 34, 2009). Escreve aos domingos, a cada duas semanas.
Encontros
Pedestre
Em Buenos Aires, as quatro esquinas de um cruzamento de duas ruas formam um oct�gono. Evidentemente s�o esquinas que n�o terminam num �ngulo de noventa graus, mas sim num corte generoso da ponta do quadrado de cada quarteir�o. Ouvi dizer que a ideia � madrilenha, e o objetivo � permitir que n�o haja encontros bruscos entre, por exemplo, um velho que vai a passos de tartaruga, de bengala e chap�u, pela cal�ada da Thames e um adolescente com fones no ouvido e meio alucinado que flana ligeiro pela Guatemala —a fim de que possam perceber o outro com alguma anteced�ncia, evitando acidentes, chatea��es, assaltos. O fato � que essas ochavas, como s�o chamadas ("yo vivo en una ochava", me confessou certa vez uma argentina; tentei mudar pra casa dela na hora), criam um espa�o circular e aconchegante, que lembra uma pra�a invis�vel, n�o realizada mas amplamente sugerida. Isso de cem em cem metros, sobre um terreno plano e com lajotas claras. Aos poucos essas zonas arejadas se incorporam � paisagem �ntima do pedestre, e voc� se sente mais livre, mais inteligente, mais otimista em rela��o ao amor e � conviv�ncia pac�fica entre os homens —sem imaginar que no fundo � uma v�tima de uma grande sacada arquitet�nica.
Ilustra��o Guazzelli | ||
Churrasqueira
Um desejo que ainda n�o realizei: morar numa casa branca, simples, com duas janelas e uma porta entre elas (pintadas de azul-gr�cia) dando pro quintal —onde h� um gramado, um p� de lim�o-taiti (em homenagem ao meu pai) e uma roseira. No interior de S�o Paulo, n�o muito longe da fam�lia. Paralela ao muro baixo, perpendicular � rua, que vejo atrav�s do port�o, eu colocaria uma churrasqueira, dessas m�veis, de tambor, que seria acesa duas vezes durante a semana, no fim do dia, e uma vez aos s�bados, antes das dez da manh�. O cheiro da gordura queimando e a cerveja sagrada. As crian�as do bairro e os adultos do mundo. Estrelas reencontradas e nuvens passando sem remorso. Meu pai! Minha m�e! O fantasma da minha av� num pano de prato que ela pintou. O sol se move e mudamos as cadeiras de lugar. Algu�m se corta e eu penso: o sangue natural. Descal�a, minha mulher caminha na grama. Seu p� em movimento equivale ao nicho de poesia francesa de uma biblioteca p�blica. Um amigo enrola um baseado. Boto mais carv�o e come�amos de novo. A lua, sadia como um dente, fica de longe pra n�o sofrer.
Casa
L� poemas e � lida por eles. Os versos entram pelas pupilas e o sangue corre nas veias. A pele � quase dourada. As pernas parecem dois �clairs de caramelo. Sua cama � alta. O len�ol, de linho. O quarto —onde ainda deixarei um par de chinelos e alguns rascunhos— tem paredes de pedra, com janelas vermelhas. No seu telhado moram os deuses inafetivos. Em volta � pasto. Pasto e porcos. Porcos e a estrada que vai dar na B�lgica.
Livraria da Folha
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