Com a maternidade, mergulhei na seguinte rotina de autoengano: termino toda sexta-feira me culpando pelo tempo que não consegui dedicar a meus filhos e me prometendo que, na próxima semana, será diferente.
Ocorre que nunca é.
Acontecimentos que não consigo prever —criança doente, imprevisto no trabalho, carro quebrado, reunião na escola, problema familiar— são parte do fluxo contínuo da vida e comem uma fatia substancial das nossas horas.
Acontecimentos que posso prever —como o tempo gasto no WhatsApp— desafiam incansavelmente meu autocontrole.
E assim seguimos.
O difícil equilíbrio me torna uma mãe ausente? Quero acreditar que não. Espero que, com os altos e baixos inevitáveis, o balanço do meu esforço diário esteja sendo positivo.
Ainda assim minha preocupação —e a de muitos pais com quem convivo— é constante porque sentimos intuitivamente o que pesquisas comprovam com dados e evidências: o tempo dedicado a nossos filhos é remédio. Não é capaz de curar e evitar todos os males que podem lhes afligir e atingir em algum momento, mas ajuda a preveni-los.
A edição mais recente da “Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar", do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), de 2015, diz que: “O fortalecimento de vínculos familiares é considerado muito importante na prevenção de comportamentos de riscos entre jovens e adolescentes”.
E segue: “O monitoramento feito pelos responsáveis dos adolescentes tem efeito protetor quanto aos hábitos de fumar, beber, usar drogas ou iniciação sexual precoce”.
De acordo com os adolescentes do nono ano do ensino fundamental (equivalente à faixa etária de 13 a 14 anos), nosso nível de atenção à sua vida varia bastante, dependendo do tópico.
A pesquisa do IBGE —conhecida pelo sugestivo acrônimo PeNSE— revela que 80,4% dos jovens declararam que seus responsáveis estavam cientes do que eles faziam em seu tempo livre nos 30 dias anteriores à entrevista.
No quesito “presença em ao menos uma refeição durante a semana”, o percentual cai para 74%.
A percepção entre os alunos de que os pais entenderam seus problemas se reduz um pouco mais para 66,6%.
Já a fatia de jovens que disseram perceber que os responsáveis verificaram se as lições de casa estavam sendo feitas despenca para 56,6%.
Pesquisas como essa são importantes porque nos ajudam a refletir sobre a difícil tarefa de equilibrar a criação dos filhos com todo o resto.
Monitorar o tempo livre das crianças e jovens é muito importante, sem dúvida. No mundo das muitas possibilidades de contatos virtuais, estar dentro de casa, por exemplo, deixou de representar proteção contra perigos de fora.
Mas conversar e acompanhar a vida escolar também são atividades cruciais.
Segundo pesquisa recente da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), estudantes que afirmam que os pais passam tempo apenas falando com eles ou comendo junto ou discutindo sua rotina nos estudos tendem a reportar um nível de satisfação com a vida entre 22% e 62% maior do que os que relatam não desfrutar desses momentos.
O desafio é encontrar tempo para equilibrar essa parte da criação dos filhos com todo o resto.
O que já ficou claro para mim é que não há mágica que fará com que a próxima semana seja diferente da que passou.
Se sentirmos que precisamos aumentar a fatia de tempo que dedicamos a eles, são necessárias ações concretas que, muitas vezes, exigem sacríficos ainda mais concretos.
Sei que, além de difícil, essa tarefa pode acabar sendo insuficiente. Mas, nesse caso, o risco não justifica a paralisia.
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