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� jornalista com mestrado em Economia Pol�tica Internacional no Reino Unido. Venceu os pr�mios Esso, CNI e Citigroup. M�e de tr�s meninos, escreve sobre educa��o, �s quartas.
Quando a escola 'mata' o aluno
Apu Gomes - 18.ago.2011/Folhapress | ||
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Alunos em sala de aula em SP |
"Se a escola destr�i a autoconfian�a do aluno, ela matou o aluno pobre."
Quando ouvi a frase acima durante entrevista recente com o pesquisador Ricardo Paes de Barros, foi como um soco na boca do est�mago.
As palavras dele me remeteram a hist�rias que tenho escutado de pais convocados para reuni�es escolares nas quais ouvem dos respons�veis pedag�gicos que seus filhos s�o incapazes de acompanhar o ritmo, de se comportar ou de se concentrar.
Vou me restringir a narrar uma delas com algum detalhe aqui.
H� pouco tempo uma amiga psic�loga me contou que sua empregada dom�stica chegou a sua casa aos prantos depois de participar de uma reuni�o na escola p�blica municipal do filho, localizada em um bairro de classe alta de S�o Paulo.
A convoca��o ocorreu porque o menino, de cinco anos, vinha apresentando comportamento desobediente e, por vezes, explosivo (como chutar brinquedos quando era contrariado por amigos).
Essa m�e foi recebida pela coordenadora pedag�gica, que comandou a conversa, e por uma assistente de dire��o.
Come�ou ouvindo, segundo seu relato, que seu filho era o principal desestabilizador de sua turma, que tinha tend�ncia � agressividade e era insubordinado. Assustada, a m�e come�ou a chorar.
Ela tentou contar algo positivo que pensava em fazer para ajudar o filho: coloc�-lo no jud� para aumentar sua disciplina e concentra��o.
A coordenadora teria retrucado que isso s� iria piorar as coisas pois ele se tornaria ainda mais violento. E a m�e continuou chorando.
Em um momento, a coordenadora pediu que chamassem o aluno � sala. Quando a crian�a entrou, ouviu dela que era o respons�vel pelo estado emotivo de sua m�e e que, se ela perdesse o emprego por estar ali na hora do trabalho, a culpa seria dele.
O menino, claro, caiu no choro tamb�m.
A m�e ficou arrasada e envergonhada. Seu primeiro pensamento foi o de persistir na estrat�gia que j� vinha tentando: brigar com o menino em casa e puni-lo com castigo.
Mas contou toda a hist�ria para sua empregadora, que, chocada, resolveu agir em duas frentes.
Confirmou para sua funcion�ria o que ela j� suspeitava, que a profissional que a recebeu havia se excedido, e a orientou a mudar de estrat�gia com o menino, a falar que juntos iriam superar aquilo, que ela iria ajuda-lo, que ele conseguiria melhorar seu comportamento.
Minha amiga ligou tamb�m para a escola, se desculpou pela interven��o, mas argumentou que, diante da gravidade do fato, gostaria de conversar pessoalmente com a diretora.
Foi bem recebida pela profissional que contou ter assumido h� pouco tempo, vinda de outro estabelecimento, e afirmou n�o estar presente no dia da reuni�o com a m�e.
A assistente de dire��o, que havia presenciado a conversa entre coordenadora e m�e, confirmou a maior parte das informa��es relatada por ela.
Alegou que n�o fez nenhuma interven��o porque, como a diretora, era rec�m-chegada ao estabelecimento, mas afirmou que elas estavam tentando mudar a atitude de profissionais como aquela coordenadora.
Minha amiga perguntou se elas conheciam a hist�ria do menino e da m�e, que foram abandonados pelo pai dele ainda na gravidez. As profissionais admitiram que n�o e que isso era uma falha.
Ela saiu da escola com a impress�o de que as duas tinham sido sinceras e com uma ponta de esperan�a de que realmente estavam empenhadas em mudar as coisas.
Essa hist�ria � chocante. Chamar uma crian�a de cinco anos para assistir ao sofrimento da m�e e ainda dizer que ela � a causadora de tudo aquilo � mais do que despreparo e abuso. Entra na classifica��o de crueldade.
Ser� que acontecimentos assim s�o uma exce��o? Quero muito acreditar que sim, mas, com base em outros relatos que ou�o, n�o tenho certeza.
Por isso entendi Paes de Barros, que � economista-chefe do Instituto Ayrton Senna e professor do Insper, quando ele afirmou que a escola pode matar o aluno.
� uma morte simb�lica, da confian�a, que geralmente deixa marcas.
Ele acrescentou que, embora isso tamb�m ocorra em escolas de classe alta, os pais, nesses casos, est�o mais bem equipados para ajudar seus filhos a reconstruir sua autoestima.
Concordo. Mas, mesmo nessas situa��es, quando a escola sugere que o aluno � incapaz —ainda que a palavra usada n�o seja essa e que a abordagem seja mais polida—, h� consequ�ncias.
A filha de uma fam�lia conhecida trocou de escola h� pouco tempo porque "n�o estava acompanhando o ritmo" do estabelecimento, considerado muito puxado e exigente.
A transi��o n�o tem sido f�cil. Ora ela se sente bem, mais valorizada na escola nova, ora se sente inferior aos amigos antigos que n�o precisaram fazer a mesma transi��o.
Parece que ainda falta compreens�o sobre o verdadeiro papel da educa��o, que n�o � o de fazer com que todos cheguem ao mesmo patamar, mas ajudar cada um a atingir seu pr�prio potencial, a acreditar que tem uma voca��o e a perseguir seus sonhos.
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