Saltar para o conte�do principal

Publicidade

Publicidade

 
 

cl�vis rossi

 

08/02/2011 - 16h07

Revolu��o, anestesia e incertezas

O governo eg�pcio, pela voz do vice-presidente Omar Suleiman, a nova cara da ditadura, est� dando por iniciada a transi��o --e com Mubarak-- ao anunciar a cria��o de comiss�es para a reforma da Constitui��o e at� um cronograma para a chegar � democracia.

Se vai funcionar ou n�o, est� por se ver. Na sexta-feira, conforme reportagem desse excelente Samy Adghirni que a Folha despachou para o Cairo, o movimento j� dava sinais de cansa�o.
Natural: a fila anda (ou a vida continua, escolha a sua frase preferida) e as pessoas t�m que continuar sua luta di�ria para p�r o p�o pita na mesa da fam�lia.

N�o h�, pelo menos n�o no Egito, revolucion�rios profissionais. H�, sim, anti-revolucion�rios profissionais, pagos pelo regime, o que complica ainda mais as coisas.

Mesmo assim, nesta ter�a-feira, a pra�a Tahrir, uma esp�cie de QG revolucion�rio a c�u aberto, permanecia lotada. A BBC diz que � a maior manifesta��o desde o in�cio do movimento.

Ajuda a explicar a tentativa de anestesia, seja qual for a �tica pela qual se olhe. Pelo lado do regime, trata-se, como � �bvio, de ganhar tempo para fazer aumentar o cansa�o dos manifestantes e, por extens�o, tirar ou reduzir a press�o vinda da rua. N�o est� funcionando mas � o �nico movimento poss�vel, fora um banho de sangue.

Pelo lado da parte politicamente estruturada da oposi��o, para dizer de alguma forma, o que j� foi conquistado parece importante embora insuficiente. A desist�ncia de Hosni Mubarak de disputar em setembro mais um mandato e a retirada de seu filho Gamal da lista de eventuais candidatos � o triunfo da revolu��o, mas em "slow motion".

Depois do �mpeto que alcan�aram as manifesta��es, parece que a rua quer pressionar o "fast forward". A ver.

De parte dos Estados Unidos, as mensagens emitidas s�o contradit�rias. O enviado especial de Obama, Frank Wisner, disse que a transi��o deveria dar-se com Mubarak. Houve desmentidos posteriores, mas o regime eg�pcio n�o os levou em considera��o. Afinal, � pouco razo�vel que o enviado especial de um governo d� palpites pessoais, em vez de oficiais, mais ainda em uma conjuntura vol�til como esta e em uma regi�o permanentemente vol�til como � o Oriente M�dio.

O presidente Barack Obama voltou ao mantra de "transi��o agora", que � muito simp�tico, pelo menos para o meu gosto, mas tamb�m algo irrealista.

Para quem entregar as chaves do Pal�cio? A oposi��o n�o tem um l�der que seja plenamente aceito pelos diferentes grupos e menos ainda pelos jovens que lan�aram e continuam liderando os protestos.

A Europa, por sua vez, est� completamente tonta, sem saber direito o que fazer, em um momento em que "seu futuro est� em jogo", segundo um dos acad�micos mais ouvidos no continente, Timothy Garton Ash, em artigo para "El Pa�s".

Esse catedr�tico de Estudos Europeus da Universidade de Oxford lembra: "O arco em que se est� produzindo a crise �rabe, desde o Marrocos at� a Jord�nia, � o vizinho do lado da Europa. E dec�nios de migra��es fazem com que os jovens �rabes que gritam irados nas ruas do Cairo, T�nis e Am� tenham primos em Madri, Paris e Londres".

Pode-se gostar ou n�o das posi��es europeia e norte-americana (ou da aus�ncia delas), mas � for�oso reconhecer que o Ocidente est� diante do que o jornalista franc�s Jean-Marie Colombani, ex-chefe de reda��o do "Monde", chama de "contradi��o fundamental" suscitada pelos acontecimentos: "De um lado, o trip� autoritarismo-estabilidade-garantia dos equil�brios internacionais; do outro, liberdade, coer�ncia de valores e incertezas".

Est� diante tamb�m de algo que o mais famoso colunista norte-americano, Thomas Friedman, confessa na coluna do "New York Times" de ter�a-feira jamais ter visto em seus 40 anos escrevendo sobre Oriente M�dio. Friedman foi correspondente primeiro em Beirute, depois em Jerusal�m, p�riplo que resultou no livro "De Beirute a Jerusal�m", indispens�vel para qualquer um que queira ser jornalista mas tamb�m para quem queira entender melhor uma regi�o extremamente complexa.

Esse ineditismo abre, como � �bvio, o espa�o para a incerteza apontada por Colombani. Mas, j� que as certezas oferecidas pelos autoritarismos est�o ruindo, viva a incerteza.

Afinal, como escreveu nesta ter�a-feira para "El Pa�s" o fil�sofo franc�s Andr� Glucksmann: "Jamais deve-se lamentar a queda de um tirano".

Quanto ao ritmo da transi��o, cito de novo Glucksmann: "Levemos em conta que, no Egito, h� cerca de 40% de mortos de fome e uns 30% de analfabetos. Isso faz com que a democracia seja dif�cil e fr�gil, mas n�o imposs�vel, porque, caso contr�rio, os parisienses n�o teriam jamais tomado a Bastilha".

Bingo.

clóvis rossi

Cl�vis Rossi � rep�rter especial e membro do Conselho Editorial da Folha, ganhador dos pr�mios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundaci�n por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. � autor de obras como 'Enviado Especial: 25 Anos ao Redor do Mundo' e 'O Que � Jornalismo'. Escreve �s ter�as, quintas, sextas e domingos.

 

As �ltimas que Voc� n�o Leu

  1.  

Publicidade

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da p�gina