� jornalista gastron�mica, 'foodtrotter' e autora de 'Jantares de Mesa e Cama'. Escreve aos domingos, a cada duas semanas.
'A Fran�a est� de volta!'
No in�cio do m�s Yannick All�no, chef-propriet�rio do Ledoyen, tr�s-estrelas "Michelin" parisiense, passou tr�s dias embrenhado na cozinha do D.O.M., enquanto Alex Atala estava em Nova York, "tomando conta" da cozinha de outro super-restaurante, o Blanca. Um projeto audaz chamado "The Great Gelinaz Shuffle" (o grande embaralhamento do Gelinaz) fez com que 37 grandes nomes da gastronomia mundial trocassem de restaurante por uns dias, aleatoriamente, culminando em 37 jantares, no dia 9.
All�no, que integra o trio de chefs mais estrelados e famosos da Fran�a –ao lado de Alain Ducasse e Jo�l Robuchon– arrega�ou as mangas e trabalhou muito com a jovem equipe de Atala, inclusive desossando um monte de patos.
A certa altura, uma cozinheira lhe perguntou se usara o Rotaval –engenhoca espanhola– para fazer seus molhos l�mpidos e intensos. "O que � isso?!", perguntou, sendo ir�nico (pois sabe muito bem do que se trata). Quis deixar claro que sua cozinha n�o precisa de t�cnicas alheias para ser boa. Esses molhos, ou extra��es, como ele diz, t�m sabor limpo e potent�ssimo porque s�o extra�dos a frio, atrav�s de centrifuga��o e congelamento. "A Fran�a est� de volta, podem anotar!", exclamou.
Entre cozinheiros, como entre os que v�o muito a restaurantes gastron�micos, a Fran�a perdeu for�a h� mais de d�cada. Os n�rdicos liderados por Ren� Redzepi (do Noma, em Copenhague) e os espanh�is, encabe�ados pelos irm�os Adri� (Tickets, Pakta, em Barcelona) e Roca (El Celler de Can Roca, em Girona), dominaram a cena nos �ltimos anos. Sa�ram em mais reportagens, estrelaram mais filmes, ascenderam ao topo de mais rankings.
Entretanto, como quis sublinhar All�no durante sua passagem por S�o Paulo (ele al�m de cozinhar fez palestra sobre suas impressionantes novas t�cnicas para grupo de jornalistas), n�o se pode esquecer que a Fran�a ainda tem sua import�ncia, mesmo que esteja d�mod�.
Quando anunciaram o troca-troca global de chefs, muitos torciam para que o sorteado para cozinhar no D.O.M. fosse Redzepi ou alguma outra estrela em voga (os nomes foram mantidos em segredo at� a hora do jantar). Naquela noite, alguns no sal�o come�aram a noite com uma pontinha de desapontamento. Durou pouco. All�no maravilhou a todos com um menu brilhante, executado com a maestria t�cnica de um aut�ntico tr�s-estrelas "Michelin".
Serviu, entre outros pratos, uma "tucubouillabaisse" onde tucupi substitu�a o caldo tradicional de uma bouilabaisse, o peixe no ponto perfeito, a harmonia irretoc�vel. Abrasileirou um pato � royal (uma das receitas mais ic�nicas da Fran�a, geralmente feita com lebre) casando-o com pupunha gratinado, em panelinhas � parte. Incorporou modernidade na medida justa, como na aloe vera (babosa) glaceada com mel de abelhas nativas. Ele, que iniciou a carreira como chef-p�tissier, arrematou com um desconcertante merengue de gergelim preto seguido de um mil-folhas de am�ndoas, chocolate e avel�s de fineza e croc�ncia impressionantes.
Se a Fran�a est� de volta, pelo menos midiaticamente, n�o tenho certeza. A desuni�o entre os maiores chefs, a resist�ncia (ou incapacidade) em dialogarem nas m�dias sociais e a viol�ncia com que se op�em ao prestigioso ranking dos 50 melhores restaurantes do mundo atrapalham muito. Pa�ses como Dinamarca, Espanha, M�xico e Peru continuar�o a dominar a cena por um bom tempo, aposto –por saberem se promover melhor.
Mas est� claro que All�no –um virtuoso, defensor e representante-m�r da alta cozinha francesa– mesmo n�o sendo o queridinho da vez, jamais sair� de moda. Modas ofuscam a realidade. E a realidade � que enquanto a Fran�a tiver seus All�nos, seguir� sendo uma pot�ncia e uma refer�ncia na gastronomia.
Livraria da Folha
- Cole��o "Cinema Policial" re�ne quatro filmes de grandes diretores
- Soci�logo discute transforma��es do s�culo 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD re�ne dupla de cl�ssicos de Andrei Tark�vski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade