No futuro, as pessoas n�o morrer�o por envelhecimento, diz cientista
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O biogerontologista ingl�s Aubrey de Grey, 53, diretor da ONG Funda��o Sens |
Aubrey de Grey, 53, quer curar o envelhecimento. Sim, para esse pesquisador ingl�s, formado em ci�ncias da computa��o na Universidade de Cambridge, envelhecer � uma doen�a tal como a mal�ria –ou ainda pior, por vitimar muito mais pessoas– que pode ser perfeitamente evit�vel.
A seu ver, para pensar em uma solu��o � preciso entender o envelhecimento e a morte como resultado de um processo de ac�mulo de danos e imperfei��es no organismo.
A chave, ent�o, seria reparar esses danos celulares antes de efeitos graves que fariam o corpo pifar –com solu��es hipot�ticas, ainda pouco testadas mesmo em animais. A raz�o disso, afirma ele, � a falta de financiamento suficiente para sua Funda��o Sens, ONG californiana dedicada a minimizar a senesc�ncia com engenharia.
Acabar com o envelhecimento, portanto, seria dar fim tamb�m aos problemas associados a ele –c�ncer, dem�ncias, problemas cardiovasculares, degenera��o macular.
Nenhuma de suas ideias, por�m, causa tanto espanto como a de que, com as ditas terapias, chegaremos aos mil anos, estimativa at� conservadora, afirma. Ele vem ao Brasil pela primeira vez nesta semana para divulgar suas ideias em palestra na Campus Party no dia 1�. Antes, falou com a Folha por telefone.
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Como come�ou sua batalha contra o envelhecimento?
Eu me formei em ci�ncias da computa��o em Cambridge e comecei a trabalhar com intelig�ncia artificial. Nesse per�odo conheci uma geneticista, com quem me casei. Por meio dela aprendi muito de biologia e vi que ela n�o estava muito interessada em pesquisar o envelhecimento nem achava que era algo importante.
Outros bi�logos tinham a mesma opini�o. Fiquei chocado, porque sempre foi �bvio para mim que o envelhecimento era o problema mais importante do mundo. Sempre presumi que os bi�logos estavam tentando evit�-lo. O pr�ximo passo foi mudar de �rea.
Normalmente as pessoas n�o pensam no envelhecimento como inimigo, mas sim nas doen�as associadas, como c�ncer e mal de Alzheimer.
Tento mostrar para as pessoas que elas est�o se enganando. Acho que sempre soubemos que esse era o pior problema do mundo, mas tamb�m sab�amos que era algo completamente inevit�vel.
Fazia sentido deixar ele de lado e aproveitar ao m�ximo nossas vidas miseravelmente curtas. Uma forma de fugir disso � a ideia de doen�as relacionadas ao envelhecimento, como alzheimer, e c�ncer. Essas coisas n�o s�o doen�as.
E o que elas s�o ent�o?
Doen�as s�o coisas como tuberculose, coisas que v�m de fora. Voc� n�o pode curar as doen�as do envelhecimento porque elas s�o efeitos colaterais do fato de estarmos vivos. Elas surgem como consequ�ncia do funcionamento normal do corpo, e n�o h� nada que possamos fazer para impedi-las. O que podemos fazer � ser criativos e limpar os est�gios iniciais que d�o origem a essas doen�as, e � nisso que a Funda��o Sens trabalha.
E como o senhor acredita que podemos fazer essa limpeza para reverter os processos que levam �s doen�as?
S�o v�rias as estrat�gias. Uma delas � a limpeza de fato. Uma das coisas que acontecem no corpo � a cria��o de detritos que podem afetar a maneira como as c�lulas funcionam. Nossa estrat�gia � introduzir enzimas no corpo para destruir esse "lixo".
Mas h� outros tipos de conserto que n�o t�m a ver com limpeza, quando as c�lulas morrem e n�o s�o automaticamente repostas. A solu��o aqui � repor essas c�lulas por terapias com c�lulas-tronco.
Em que est�gio est�o essas pesquisas? Em 2004 voc� disse que os testes em roedores seriam finalizados em dez anos e ent�o os testes em humanos poderiam come�ar.
Desde que comecei a falar coisas desse tipo, houve muito progresso, mas n�o como eu esperava. A boa not�cia, por�m, � que a �nica raz�o foi uma quantidade menor de dinheiro para financiar as pesquisas do que eu esperava.
E qual seria o novo prazo para os testes em humanos?
Dez anos atr�s eu dizia que havia 50% de chance de implementarmos tudo isso em 25 anos. Idealmente, eu diria que h� 50% de chance de implementarmos isso em 15 anos, mas tem as raz�es que citei... Acho que podemos atualizar esse prazo para 20 anos.
O senhor se tornou famoso por dizer que um dia poderemos chegar aos mil anos. De onde tirou esse n�mero?
O n�mero nasceu da presun��o de que ningu�m morrer� mais de envelhecimento. As causas de morte ser�o as mesmas durante toda a sua vida, como acidentes. Ent�o qual � o risco de morte de um jovem adulto ocidental hoje? Muito baixa. Se voc� mantiver essa probabilidade para sempre, ent�o vai viver mais de mil anos, em m�dia.
� uma estimativa conservadora porque parte do pressuposto de que as outras causas de morte continuar�o as mesmas, mas os carros ser�o mais seguros e tudo melhorar�. H� chances de as pessoas viverem mais do que mil anos, mas mil anos j� � suficiente para assustar as pessoas, ent�o achei melhor parar por a� (risos).
A ideia de que vamos eliminar a morte por envelhecimento, por�m, precisa de outra justificativa. As terapias que estamos desenvolvendo para atacar os danos que levam ao envelhecimento n�o ser�o desenvolvidas nos pr�ximos 20 anos e, sozinhas, n�o eliminar�o o problema. O que elas provavelmente far�o � nos dar uns 30 anos a mais, porque n�o ser�o perfeitas. Assim vamos ganhar tempo at� uma nova vers�o das terapias, e por a� vai.
H� desafios tecnol�gicos no seu trabalho, mas aspectos morais parecem indissoci�veis dessa discuss�o.
Discordo. Acho que as pessoas fingem que h� quest�es �ticas como um truque psicol�gico para evitar pensar nessa coisa terr�vel que provavelmente vai acontecer com elas, e isso � algo bastante razo�vel.
Mas h� muitos que se op�em � sua ideia de imortalidade, por consider�-la antinatural.
O papel da tecnologia � lutar contra o que � natural. Antibi�ticos n�o s�o naturais. Voc� tamb�m pode dizer que � natural que os humanos tentem melhorar a situa��o em que se encontram e manipular a natureza para tornar a nossa vida melhor. O que n�o � natural � n�o agir e deixar que coisas terr�veis aconte�am.
Mas digamos que as pessoas consigam viver durante s�culos. Com uma taxa de mortalidade menor, uma consequ�ncia seria a superpopula��o da Terra, o que poderia significar ter menos filhos ou ter menos acesso a recursos.
H� tr�s respostas para essa pergunta. Com a inven��o de novas tecnologias, vamos aumentar o n�mero de pessoas que o planeta poder� abrigar sem s�rios problemas. O desenvolvimento de energias renov�veis, por exemplo, ser� mais r�pido do que o aumento na popula��o. Por isso n�o precisamos nos preocupar.
A segunda resposta �: supondo que eu esteja sendo otimista e que n�s de fato teremos um problema grave de superpopula��o. O que isso significa? Que a humanidade est� enfrentando um dilema entre ter consequ�ncias severas para o ambiente e ter menos filhos do que gostar�amos.
Ambas s�o ruins, mas t�m que ser comparadas com a alternativa de n�o desenvolver mos as terapias que far�o as pessoas viver mais. � melhor continuar desse jeito ou ter menos filhos do que gostar�amos? N�o � uma decis�o dif�cil. N�o conhe�o ningu�m que queira ter alzheimer.
Se dissermos "ok, vamos ter uma superpopula��o e � melhor n�o desenvolver essas terapias", o que faremos � atrasar o desenvolvimento dessas tecnologias, porque elas surgir�o em algum momento. Com isso, vamos condenar um monte de gente � morte. Est� claro que temos a obriga��o moral de criar essas terapias o mais r�pido poss�vel para dar a op��o de poder us�-las.
Uma cura do envelhecimento tamb�m poderia ter impacto sobre o trabalho. Ou trabalhar�amos ainda mais ou o sistema de previd�ncia simplesmente n�o aguentaria.
Isso me faz lembrar do meu primeiro trabalho, com intelig�ncia artificial. Houve grande avan�o na �rea nos �ltimos tempos. Vamos ter carros que dirigem sozinhos e automa��o em quase todos os trabalhos que temos hoje. Isso significa que todo o conceito de carreira de trabalho n�o existiria mais. E isso vai acontecer muito antes de curarmos o envelhecimento, nos pr�ximos 20 anos, eu acredito.
Quanto o sr. espera viver? Tem medo de envelhecer e morrer?
Acho que tenho 50% de chance de viver at� os mil anos. Eu n�o tenho ideia, na verdade. N�o � isso que me motiva. Meu trabalho � mais uma quest�o humanit�ria do que um objetivo individual.
Acho que medo n�o � a palavra certa. Certamente eu estou determinado a fazer tudo que posso contra isso.
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RAIO-X
IDADE
53 anos
NASCIMENTO
Londres
FORMA��O
Ci�ncias da computa��o, na Universidade de Cambridge
ATUA��O
� diretor da ONG Funda��o Sens (estrat�gias para engendrar o m�nimo envelhecimento, em tradu��o livre), em Mountain View, Calif�rnia
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