A maior cidade do Brasil deveria ser um norte seguro para as outras cidades do país. Um exemplo a ser seguido em todos os segmentos possíveis, do saneamento básico à educação, passando por diversas outras camadas sob responsabilidade do poder municipal, entre elas, o patrimônio histórico. Contudo neste último citado São Paulo é um grande símbolo de vergonha e de descaso no padrão "for export".
Aqui, sabe-se, não é de hoje que quase nada é preservado. Uma cidade que já beira 5 séculos de história mas que muitas vezes lembra mais as cidades chinesas que cresceram do nada da década de 1980 em diante. O motivo? Quase não temos aqui construções históricas do passado colonial e imperial que tivemos.
Mas não se engane em pensar que só a São Paulo anterior ao século 20 desapareceu de nossos olhos. A cidade erguida nas primeiras décadas do século passado também já some como fumaça de nosso horizonte. São palacetes erguidos pelos industriais que surgiram com o crescimento de São Paulo, as casas geminadas construídas pelos "capomastri" que fizeram de São Paulo algo a imagem e semelhança de suas cidades na Itália, e também os pedreiros nordestinos que ergueram casas, sobrados, mansões e edifícios para com o salário sustentarem suas famílias.
Com a recente aprovação do novo plano diretor já estamos vendo que o pouco que resta da nossa memória histórica e de nossa dignidade como povo paulistano, desaparecerá nas mãos de construtoras, incorporadoras e imobiliárias que fazem da cidade um horror urbanístico e da vida do cidadão, um inferno.
A prefeitura na imagem e voz do atual prefeito paulistano, Ricardo Nunes (MDB), nada faz para preservar o patrimônio histórico, pelo contrário. O obscuro mandatário que só chegou ao poder porque o eleito infelizmente morreu, nem sequer disfarça mais seu desprezo à memória paulistana, ao fazer do cargo que ocupa o trabalho de porta-voz, ou melhor, de "tchuthuca" do setor imobiliário e de todos aqueles que se beneficiam da terra arrasada que São Paulo se transformou.
O anúncio do Seminário "Real Estate" acima não deixa dúvidas que o prefeito escolheu um lado na sua tentativa de firmar-se no poder. E esse lado não é o do cidadão, mas sim daqueles que odeiam nossa identidade histórica, nosso patrimônio cultural. São aqueles estão sempre a "um jatinho de distância" das belezas arquitetônicas europeias ou estadunidenses, como quem pensa: patrimônio cultural que vale a pena só o estrangeiro, o nosso jamais.
O empresariado do setor imobiliário e construtivo brasileiro é o mais cafona do mundo. No afã de enriquecer-se a todo custo, defeca sobre o patrimônio de São Paulo como se não houvesse amanhã. Não são capazes de enxergarem que história e crescimento podem e devem caminhar juntos.
Por isso não me causou espanto acabar em chamas o maravilhoso e tombado casarão histórico da rua Cardoso de Almeida, nas Perdizes, na última semana. O incêndio pouco importa se foi provocado ou acidental, mas causa espanto e ojeriza que até o momento não houve qualquer pronunciamento público sobre o ocorrido, seja por parte da Secretaria Municipal de Cultura (SMC), do Departamento do Patrimônio Histórico (DPH) ou da secretária responsável por ambos os órgãos, Aline Torres.
Faz tempo que o que menos se faz na SMC é cultura ou preservação da memória. Na atual gestão a secretaria se transformou em mera divulgadora e produtora de eventos, numa confusão do que é cultura e o que é entretenimento. Não que o segundo não faça parte do primeiro, mas o problema é quando um engole o outro.
Na somatória de problemas envolvendo a cultura da cidade, a memória paulistana e seu patrimônio histórico, agora também em chamas, resta esperar por um milagre para que São Paulo siga sobrevivendo. Mesmo que respirando por aparelhos.
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