Que imposto é esse

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Que imposto é esse - Eduardo Cucolo
Eduardo Cucolo
Descrição de chapéu
Maria Paula Carvalho Molinar

A bilionária, o mordomo e o namorado

O que esperar da reforma tributária em relação aos planejamentos patrimoniais?

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Maria Paula Carvalho Molinar

advogada do Candido Martins Advogados

O título deste artigo faz alusão a uma história verídica, retratada por um streaming, que tem relação direta com o dia a dia daqueles que lidam com planejamento patrimonial e sucessório.

Em resumo, a narrativa trata de um caso emblemático de um conflito entre uma das mulheres mais ricas do mundo (herdeira da L’Oréal) e sua filha, da Família Bettencourt. O caso virou um escândalo na França por envolver temas relacionados à sucessão, doações exacerbadas, evasão de divisas e um mordomo que registrava todos os fatos.

Com as peculiaridades de cada família, fatos semelhantes estão presentes em nosso cotidiano. As doações em vida possuem limitações e requisitos, que devem obrigatoriamente ser observados, sob o risco de serem invalidadas e/ou questionadas futuramente por herdeiros que se sentem lesados.

A busca pelos planejamentos patrimoniais cresceu significativamente neste início de ano em razão da iminente possibilidade de alteração legislativa. Muitas famílias passaram a avaliar com mais cuidado a possibilidade de se planejar e antecipar o pagamento do ITCMD (Imposto Sobre Transmissão Causa Mortis e Doação), que incide sobre heranças e doações. Com a aprovação da reforma tributária, os estados passarão a exigir o imposto com base nas alíquotas progressivas até 8% (que pode eventualmente dobrar para 16% em razão do Projeto de Resolução n° 57/2019 em trâmite no Senado).

Os contribuintes estão vendo este ano como a janela de oportunidade para organizarem seu patrimônio e garantirem uma otimização da carga fiscal incidente na sucessão. Não há, atualmente, uma alíquota padronizada para este tributo. Por ser um imposto de competência estadual, cada estado tem sua legislação específica.

Mulher branca de cabelo comprido
Maria Paula Carvalho Molinar, advogada do Candido Martins Advogados - Divulgação/Tadeu Brunelli

Estados como Rio de Janeiro, Pernambuco, Ceará, Santa Catarina e outros, já se utilizam das alíquotas progressivas. Em contrapartida, estados como São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Amazonas e Paraná possuem alíquotas fixas abaixo de 8%.

Especialmente para contribuintes destes últimos estados, agora é uma boa hora para pensar no planejamento. É preciso cautela na hora de desenhar a estrutura para que todas as pontas sejam devidamente mapeadas. Pensando apenas na perspectiva fiscal, vale chamar atenção de que não basta olhar apenas para o ITCMD, é necessário também observar as regras para o Imposto de Renda.

Os casos envolvendo bens no exterior são um bom exemplo para evidenciar a importância do olhar cuidadoso. Com a mudança da regra para residentes fiscais no Brasil com bens no exterior, é importante observar o impacto do ITCMD —levando em consideração todas as regras vigentes— bem como as consequências para fins do IR.

Sobre o ITCMD, o olhar deve se dividir entre dois fatos geradores distintos: doação e herança. Na primeira situação, não há discussão e o imposto deve ser recolhido. Em relação à herança, o entendimento também deveria ser simples e objetivo de que não há incidência do imposto, em razão da ausência de lei complementar.

Para esta última situação, mesmo após a decisão do Supremo Tribunal Federal e a ausência de lei complementar para regulamentar estes casos de falecimento de residente no Brasil com bens móveis no exterior, a tentativa do legislador é impor a exigência do tributo —ainda que isso implique em violação a regra constitucional.

É possível observar este comportamento por meio da edição de Emenda Constitucional nº 132/2023. O artigo 16 faz menção à necessidade de se aplicar o entendimento de que o imposto seria devido até a edição de Lei Complementar regulamentando o tema. Ou seja, ignorando a decisão da Suprema Corte e o processo legislativo adequado conforme disposto na Constituição Federal, houve a clara tentativa de impor a validação da possibilidade de os estados exigirem o ITCMD nos casos de falecido no Brasil com bem móvel no exterior (por exemplo, participações em sociedades no exterior).

Não bastasse desrespeitar a decisão do STF, a EC nº 132/2023 viola também os requisitos exigidos pelo artigo 146 da Constituição Federal que dispõe sobre a necessidade de Lei Complementar para regulamentação de conflitos de competência.

Sob a perspectiva do IR, o impacto fiscal na sucessão também não é claro. O legislador não trata especificamente deste tema, mas, considerando os recentes pronunciamentos da Receita Federal do Brasil em relação aos temas envolvendo transmissão de ativos financeiros e o desejo do legislador em replicar o entendimento dado aos ativos financeiros detidos no Brasil para aqueles que estão no exterior, é possível que haja algum tipo de questionamento sobre a necessidade de se tributar a diferença positiva entre o valor de mercado (no momento de transmissão) e o custo às alíquotas progressivas de 15% a 22,5%.

Todas essas variáveis e análises são relevantes no momento de pensar no planejamento patrimonial e sucessório. De fato, este pode ser um bom momento para estudar a melhor estrutura visando otimização de tributos. É importante olhar também os demais elementos que permeiam o trabalho e ter um olhar global sobre os impactos causados na implementação.

Para as famílias que desejam desenvolver o trabalho, é importante pensar não só na parte fiscal, mas ter em mente os outros dois pilares que norteiam o trabalho: governança e proteção patrimonial. Com todos estes elementos na mesa, as famílias podem ficar amparadas e os conflitos futuros mitigados —evitando surpresas desagradáveis, como no famoso caso da Família Bettencourt.

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