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Mensageiro Sideral - Salvador Nogueira
Salvador Nogueira

Encélado tem todos os ingredientes para a vida –exceto, talvez, o tempo

Oceano da lua de Saturno tem fósforo, mais raro dos elementos essenciais da biologia

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Encélado, a pequena lua de Saturno com um oceano subsuperficial que rotineiramente vaza para o espaço na forma de gêiseres, tem todos os ingredientes essenciais para a vida. A revelação veio com a detecção da peça que faltava –fósforo– nas plumas de água ejetadas dele. Resta agora saber se houve tempo suficiente para que a vida surgisse por lá.

São seis os elementos químicos absolutamente essenciais à biologia, conhecidos pela sigla Chonps: carbono, hidrogênio, oxigênio, nitrogênio, fósforo e enxofre. Desses, todos já haviam sido detectados antes, menos o bendito fósforo –que calha de ser o mais raro deles. Mas essa história acaba de mudar.

Frank Postberg, da Universidade Livre de Berlim, e colegas apresentaram, na última edição da revista Nature, uma análise de grãos de gelo sondados pelo CDA (Analisador de Poeira Cósmica, na sigla em inglês) da sonda Cassini, que operou em órbita de Saturno até 2017, realizando vários sobrevoos das plumas de Encélado.

As plumas de Encélado, registradas em cores pela sonda Cassini em 2010
As plumas de Encélado, registradas em cores pela sonda Cassini em 2010 - NASA/JPL-Caltech/SSI/Cassini Imaging Team/Jason Major

Os dados sugerem que, em meio a esses grãos de gelo, havia fosfatos de sódio. É a primeira vez que um composto com fósforo é detectado em um oceano que não seja o terrestre. É há um bocado dele por lá. Combinando as medições a experimentos de laboratório, Postberg e seus colegas estimam que as concentrações de fósforo nas águas de Encélado são pelo menos cem vezes maiores que as presentes nos oceanos da Terra.

O achado reforça a hipótese de que a camada global de água que existe entre um núcleo rochoso e uma crosta de gelo na pequena lua de 504 km de diâmetro é um ambiente potencialmente favorável à vida. Futuras missões destinadas a Encélado poderão explorar mais possibilidades e tentar detectar evidências diretas de atividade biológica, como moléculas orgânicas complexas.

Se tivermos sorte, talvez nem seja preciso esperar tanto para realizar essa busca. No mês passado, o Telescópio Espacial James Webb foi apontado na direção de Encélado e detectou uma enorme pluma de água ejetada da lua, com comprimento de cerca de 10 mil km. Os instrumentos não foram capazes de detectar outras moléculas, que não fossem água, mas isso pode mudar com futuras observações. E o resultado, publicado na Nature Astronomy, confirma que a taxa de ejeção de água em Encélado se mantém intensa e constante há décadas, pelo menos desde as primeiras detecções das plumas pela Cassini.

O maior desafio para a presença de vida por lá, portanto, talvez seja o tempo. Há evidências de que a lua (bem como os famosos anéis de Saturno) é de formação relativamente recente, coisa de 100 milhões de anos. Seria esse período suficiente para o surgimento de formas biológicas? Não há como ter certeza, já que nem mesmo sabemos quanto tempo levou para acontecer aqui na Terra (embora saibamos que foi algo que surgiu cedo, em algum ponto dos primeiros 500 milhões de anos dos 4,5 bilhões que tem hoje o planeta). Modelos para explicar as quantidades de metano presentes nas plumas, publicados na Nature Astronomy em 2021, sugerem que organismos chamados metanógenos talvez estejam em ação por lá. Mas isso é algo que só uma exploração mais detalhada de Encélado permitirá corroborar ou refutar.

Esta coluna é publicada às segundas-feiras na versão impressa, na Folha Corrida.

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