Ronaldinho Gaúcho surgiu sorridente e todo de branco na cerimônia de encerramento da Copa da Rússia, em 2018. No lugar de dribles e gols, o ex-atacante da seleção brasileira tomava os holofotes para arriscar uns batuques desengonçados num atabaque —enquanto ao fundo tocava "Kalinka", uma das músicas mais famosas daquele país.
A cena, de tão inusitada, virou um dos memes mais queridos pelos brasileiros naquela competição e serviu para amenizar, ao menos naquele momento, a dor nacional de mais um fracasso em Copas. Para além disso, ajudou a consagrar a fama de totalmente aleatório que o ex-atacante passou a ter nas redes sociais desde sua aposentadoria dos gramados.
A coleção de situações meio nonsense do ex-craque não para por aí: ele foi preso no Paraguai por uso de passaporte falso, participou de live dentro da prisão, recebeu honrarias da ABL (Academia Brasileira de Letras), foi nomeado embaixador do Turismo no governo Bolsonaro, lançou bitcoins estampando o próprio rosto e, mais recentemente, foi ouvido pela Câmara dos Deputados sobre um possível envolvimento em esquemas de pirâmide financeira, o que ele nega.
Inspirado pelas peripécias de Ronaldinho, o blogueiro Ricardo Zedan resolveu criar uma página de humor que compilasse essas situações absurdas do cotidiano brasileiro. "O Ronaldinho é muito aleatório, mas o brasileiro também é. Sempre foi. Então comecei a pesquisar."
Ainda em 2018, o Rolê Aleatório publica sua primeira pérola no X (antigo Twitter): o Comandante Hamilton, piloto de helicóptero e figura ilustre do jornalismo televisivo brasileiro, entrevistando a banda de forró Falamansa.
A peça despretensiosa gerou uma repercussão inesperada. "Meu celular não parava de tremer. Em um final de semana, tinha 10 mil seguidores, no próximo já tinha 20 mil, e aí foi escalando a coisa."
Com o alcance da proposta, a página passou a receber centenas de sugestões de conteúdos enviadas por meio dos seguidores, ou como conta Zedan, "um inbox [caixa de mensagens] lotado de vídeo de gente fazendo maluquice todo dia."
Hoje, a Rolê Aleatório tem mais 700 mil seguidores no Instagram e no X, seus dois maiores perfis, e é figura conhecida de quem compartilha peças engraçadas na internet. Além dos vídeos, a página também mistura futebol, memes, manchetes memoráveis do jornalismo e outras curiosidades.
Segundo Zedan, os conteúdos que mais geram engajamento envolvem tudo o que é mais popular no país, como o programa Big Brother Brasil, as festas juninas, o cartão amarelo, o Zeca Pagodinho.
"Eu tentei fazer o contrário do Ronaldinho. Os rolês dele são tipo com a ministra da África do Sul ou com um xeique. O que eu tentei fazer é trazer para o comum, para o bar, para o rolê do bairro, para o aniversário", diz.
Ele defende uma abordagem de humor mais positiva e leve, que se afasta do tom autodepreciativo e melancólico de outras páginas de sucesso do momento, como a Galinhas Inseguras, e se aproxima de perfis de exaltação da cultura popular, como o Brasil que Deu Certo.
"Talvez pelos últimos anos de situação econômica, sinto o jovem atual muito pessimista. Sobre o futuro, sobre a carreira. Esses memes mais tristes entram como um alívio cômico", afirma.
"Mas as pessoas são bem plurais. Essas páginas funcionam para aqueles dias em que você não está muito bem e o Rolê entra ali nos dias em que você quer sair da bad."
O trabalho é feito de forma solitária por Zedan, que dedica de 5 a 6 horas por dia na seleção dos conteúdos, quando retorna do seu emprego formal como analista de sistemas, função que já realiza há quinze anos.
Mesmo depois ter conquistado celebridades entre os seus seguidores e atraído marcas interessadas em parcerias, ele afirma não ter intenção de montar uma equipe ou tornar a página a sua ocupação principal.
"Fico fazendo (as publicações) porque vejo graças nas coisas e porque a galera comenta coisas geniais", conta.
Nascido no furacão político de 2018, a página sempre teve um viés de esquerda, ao mesmo tempo que busca limitar os conteúdos políticos, segundo Zedan. O blogueiro divulgou sua posição contrária à eleição de Jair Bolsonaro (PL) ao seu público, de maioria masculina, que vai da esquerda à direita, mas diz que não usa a página para militância.
"Não fico que nem um picolé de chuchu quando a timeline está pegando fogo", diz, "mas eu tento ficar muito na borda. E aonde me cabe, que é no humor."
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