O Brasil é um caso curioso quando o assunto é compra de livros. Pesquisa divulgada nesta semana pela CBL, a Câmara Brasileira do Livro, mostrou que 84% dos brasileiros não adquiriram nenhum exemplar nos últimos 12 meses. Mas, ao mesmo tempo, entre essas pessoas, 60% delas disseram que a leitura é uma atividade importante em suas vidas.
A partir daí, muitas hipóteses podem ser levantadas para tentar entender o aparente paradoxo do estudo, feito pela Nielsen BookData com 16 mil entrevistados. Entre esses não compradores, 35% deles afirmaram que o livro está caro e 28% reclamaram da falta de uma livraria por perto. Então, pode ser que eles até não comprem, mas cultivem o hábito de leitura em outros lugares, como em bibliotecas —embora o país tenha perdido quase 800 bibliotecas públicas de 2015 a 2020.
Mas também podemos entrar na subjetividade dos entrevistados e suspeitar que, na verdade, ler não seja algo tão importante assim para muitos deles. Talvez exista um mecanismo psicológico que nos impeça de dizer que não cultivamos o hábito da leitura —seja por vergonha, seja porque pega mal, seja por qualquer outro motivo. Os dados completos da pesquisa podem ser vistos aqui.
De qualquer forma, entramos num mês que mexe com esse tema e esses números. Em breve teremos crianças de férias e prestes a ficar pelo menos dois meses longe das escolas, com tempo para viajar, brincar, passear —e, por que não, ler. Além disso, o Natal bate à porta, os shoppings já começam a ficar cheios e famílias quebram a cabeça para encontrar presentes para filhos, sobrinhos, netos e afilhados.
Se achamos normal gastar centenas de reais com um brinquedo, por que não presentear meninos e meninas com um livro neste fim de ano? Na comparação dos valores, o preço acaba não colando como argumento contra essa ideia. E, se gostamos de dizer que ler é importante, mesmo que seja só para agradar entrevistadores de pesquisas, a livraria é o lugar certo para o Papai Noel.
Abaixo, há dez boas opções, para vários gostos. Conheça todas a seguir.
Menino Estrela
Quem assistiu ao filme "Sempre em Frente" provavelmente vai se lembrar do texto que o personagem de Joaquin Phoenix lê para o sobrinho. É justamente este livro que acaba de ganhar uma edição brasileira. Para quem não conhece, nele a escritora e ilustradora americana Claire A. Nivola cria uma narrativa com alta carga poética para falar de algo gigante —a própria existência humana. Invertendo o olhar sonhador que olha para o céu, ela nos apresenta um menino-estrela que faz o inverso e mira a Terra. Ele morre de vontade de conhecê-la e não vê a hora de mergulhar nesse lugar "estranhamente bonito", onde a vida "sempre oscila entre a alegria, a tristeza, a plenitude e o vazio".
O Lobo da Lua
O primeiro livro ilustrado da curitibana editora Barbante dá vida, contornos e cores a um poema de Rodrigo Tadeu Gonçalves, que explora os sons das palavras e cria um jogo poético de onde surgem uivos, cachorros, matas e a Lua. Ao ler versos como "o lobo da lua ululando", "e o uivo se vai pelas matas" ou "e logo esses uivos no vento/ viajam nas ruas à noite/ chegando nas luzes dos postes", quase escutamos o barulho do ar e os ecos dos lobos e dos cães. Ia dizer que do outro lado estão as ilustrações de Felipe de Lima Mayerle. Mas, na verdade, não é bem assim. Palavras e imagens surgem juntas, misturam-se como uma dança e convidam o leitor a imergir numa narrativa sensível.
O Que É um Rio?
Este é um dos lançamentos visualmente mais bonitos desta temporada. Escrita e ilustrada pela lituana Monika Vaicenaviciene, a obra parte da conversa entre uma avó e uma neta para fazer uma verdadeira homenagem aos rios do mundo, equilibrando informação com um toque de poesia. O Brasil, é claro, está representado com o rio Amazonas, que ganha uma página dupla explicativa sobre a origem de seu nome. Lançado originalmente na Suécia, o título foi considerado um dos melhores de não ficção para crianças pelo jornal The Washington Post em 2021. Por aqui, ele dialoga ainda com outro título: "Diário das Águas" (ed. Peirópolis), de Gabriela Romeu e João Kammal, que já apareceu neste blog (clique aqui).
Korikósún, Meu Melhor Amigo
O nigeriano naturalizado brasileiro Kabiesi Oba Adekunle Aderonmu relembra neste lançamento a sua infância. Atualmente babalaô, presidente do Centro Cultural Africano no Brasil e vice-rei da cidade nigeriana de Abeokuta, ele nos transporta neste livro para as memórias de suas brincadeiras de menino e nos apresenta uma família cheia de reis e príncipes, donas do único poço com água potável e da única casa com televisão de toda a região naquela época. Entre o futebol com os amigos e as danças e músicas tradicionais, vamos descobrindo o que são griots, itans e de onde vêm palavras que usamos naturalmente hoje, como abadá, axé, acarajé e tantas outras de origem iorubá.
Lá Fora, os Fantasmas
Este é um daqueles livros labirínticos, nos quais se perder é mais interessante do que encontrar o fim do caminho. Em "Lá Fora, os Fantasmas", a chilena Sara Bertrand e a ilustradora mexicana Amanda Mijangos criam uma narrativa que gira ao redor dos nossos medos, principalmente aqueles que habitam a infância. "Quando a mamãe não está, é como se faltasse um braço, uma perna e as mãos", diz o texto. Mas surgem também os temores nascidos da noite, da rua, da escola. De maneira nada didática nem pedagógica, a obra deságua na certeza de que não há escuridão que resista a cosquinhas ou temores que sobrevivam à luz da tarde que ilumina os grilos.
Marina e o Monstro
Para quem está acostumado a ver Marcia Tiburi no papel de escritora, aqui há uma surpresa. Nesta história, a autora assume os pincéis de ilustradora e cria imagens para um texto de sua irmã, a professora e bióloga Bete Tiburi. Feito com rimas, "Marina e o Monstro" segue um modelo já bastante conhecido na literatura infantojuvenil —o dos "monstruários", ou seja, aqueles catálogos de monstros que às vezes são reais, às vezes metafóricos. Neste caso, é a segunda opção que prevalece. Marina tem uma dessas criaturas e decide ajudá-la, buscando um nome para ela: incerteza, ira, ansiedade, vergonha, egoísmo, avareza e tantos outros sentimentos que rondam as nossas vidas.
Três Baratos em Cobra Norato
É bom prestar atenção quando Luiz Bras publica um livro. Ainda mais para o público infantojuvenil. E sobretudo quando o ilustrador é Teo Adorno. Não só porque, no fundo, Bras e Adorno são a mesma pessoa nesta cinzenta realidade —são alter egos ou heterônimos do escritor Nelson de Oliveira. Mas sobretudo porque suas histórias sempre tentam balançar as estruturas e brincar com as ambiguidades do jogo que é a literatura. Nos três contos, a esquisitice é quem reina. Há chuva de buracos e de medos, discos voadores pilotados por dinossauros de Marte e casas que dão abraços mais fortes do que os de ursos. Mas, ainda mais do que isso, há um frescor. E a busca por um jeito novo de contar histórias.
Histórias Escondidas Dentro de Casa
A edição tem o formato de uma casa, que conversa com o título e a proposta do livro. São 18 textos, entre poemas e prosas poéticas, que fazem um inventário das mais diferentes aventuras, papos e interações que podem existir dentro de uma residência. São luvas que desaparecem, insetos que inspiram versos, diálogos entre toalhas, abajur e tapetes, além de outras invenções criadas pela autora, Adriana Yazbek. Cada história ganha os traços do ilustrador Bruno Nunes, que veste as roupas e as trenas de arquiteto para inventar essa casa, que também é muito engraçada, como aquela outra já famosa.
O Dia Dê
O que você faria se tivesse o poder de escolher um dia temático para ser seguido por todos? Nesse divertido lançamento nonsense de Estevão Azevedo, o rei da história cria várias maluquices. Por exemplo, o Dia Nacional de Andar para Trás, que é autoexplicativo, assim como o Dia Nacional de Pisar na Poça. No Dia Nacional de Comigo Foi Pior, todos devem responder a uma tragédia do colega com outra coisa ainda mais cabeluda. Já no Dia Nacional do Rei ou da Rainha por Um Dia, qualquer um pode decretar o que der na telha —como receber todo o sorvete do mundo. Mas isso também pode gerar problemas. As ilustrações inconfundíveis de Mariana Massarani embarcam nesse absurdo e tiram a fantasia para bailar.
ABZ dos Limeriques
Se esta lista começou com poesia, ela também termina com versos e com os limeriques de Caio Riter, um tipo de poema bem famoso na literatura inglesa, sobretudo por causa de autores como Edward Lear e Lewis Carroll, o autor de "Alice no País das Maravilhas". No Brasil, a forma ficou mais conhecida por causa de Tatiana Belinky. Na coletânea de Riter, cada letra do alfabeto apresenta um nome e uma personagem. Seguindo a lógica nonsense que costuma acompanhar os limeriques, os poemas apresentam a Sabrina que saracoteia feito gelatina, a Keiko que ofereceu picolé para o Saci, o Quincas que tem um faniquito, entre outras figuras que só poderiam ter nascido na poesia.
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