Cozinha Bruta

Comida de verdade, receitas e papo sobre gastronomia com humor (bom e mau)

Pizza das ruínas de Pompeia impõe dilema para os napolitanos

Pintura antiga mostra que o Império Romano comia um pão achatado com outras comidas por cima

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São Paulo

Meu amigo Giuliano nasceu em Pompeia, na Itália, que abriga o mais preservado sítio arqueológico da Roma antiga. Ainda não entendi o porquê, mas ele veio ser guia turístico em São Paulo.

Giuliano soube por mim da descoberta, num afresco, da pintura de algo semelhante a uma pizza, com algo que se parece com tâmaras e algo que se parece com figos. Ele fingiu irritação: "Pô, minha mãe trabalha nas ruínas e não me contou!".

A tal pizza dos romanos, para nós, não passa muito de curiosidade, de um fato interessante a mais a respeito da cidade engolida pelas cinzas do Vesúvio.

Pintura que mostra ancestral da pizza, descoberta em Pompeia, na Itália
Pintura que mostra ancestral da pizza, descoberta em Pompeia, na Itália - Reprodução

Para os napolitanos, porém (Pompeia está na província de Nápoles), o assunto suscita discussões sérias. A pizza é algo muito importante na identidade regional.

Nápoles busca o reconhecimento global como berço único da única pizza verdadeira que existe. É uma ambição e tanto, e os napolitanos têm sido bem-sucedidos em emplacar sua visão. As pizzarias napolitanas se espalharam pelo mundo, e uma associação foi criada para dizer o que pode e o que não pode haver na pizza verdadeira.

A pizza da Roma antiga, por um lado, mostra que o alimento (ou algo que o valha) está na área desde muito tempo atrás. Ponto para Nápoles.

Em compensação, o que aparece no afresco lembra apenas remotamente a pizza napolitana contemporânea. É um pão achatado com outras comidas por cima, algo que existe e sempre existiu nas civilizações ao redor do Mediterrâneo.

Em grego "pita" quer dizer torta e é também o nome do pão que conhecemos como pão sírio. "Pide", em turco, um meio-caminho entre a pizza e a esfiha. Em outras partes do sul da Itália, há tipos diferentes de pães e tortas chamadas pizza, pita ou coisa bem parecida.

Os napolitanos, portanto, estão diante de um dilema.

Se não admitem que a pintura de Pompeia é uma pizza, deixam de faturar com a evidência mais antiga da cidadania napolitana do prato.

Se acatam e abraçam a pizza pompeana como seu patrimônio cultural, contrariam a cartilha ortodoxa que pregam para o resto do mundo.

Pizza, no final das contas, é pão com umas coisas por cima.

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