A indústria do café solúvel tem tentado desvencilhar o produto da pecha de bebida de baixa qualidade, com lançamentos de linhas gourmet, ações de marketing e criação de protocolos de avaliação de qualidade.
A pioneira Nescafé, gigante do setor, colocou nos mercados duas novas linhas: a Gold Espresso, que chega às prateleiras em três intensidades diferentes (torras clara, média e escura), e a Origens do Brasil, com grãos cultivados em São Sebastião do Paraíso (MG), Alto Paranaíba (MG) e Chapada Diamantina (BA).
A empresa tem investido forte em ações de divulgação, com degustações em eventos, por exemplo, e busca atrelar os novos produtos a uma imagem gourmet.
Torrefações independentes também têm desenvolvido seus próprios cafés especiais em versões solúveis. A paulistana Coffee Lab chegou a planejar a fabricação de um instantâneo em 2020, mas precisou adiar os planos devido à pandemia. O projeto, contudo, ainda deve ser colocado em prática.
Também nesse contexto de esforço para melhorar a percepção sobre o setor, a Abics (Associação Brasileira da Indústria de Café Solúvel) lançou um padrão de avaliação e categorias de qualidade, algo que já existe há décadas no mercado de cafés para coar.
Segundo especialistas ouvidos pelo Café na Prensa, hoje há opções efetivamente melhores no mercado de solúveis, sobretudo aqueles fabricados por meio do processo de liofilização.
É que o café instantâneo pode ser feito por diferentes métodos industriais, que têm grande papel na qualidade final da bebida. São eles:
Em suma, a diferença principal é a temperatura, explica o cientista de alimentos Rodolfo Zanin, que desenvolve pesquisas sobre café há mais de uma década e fez pós-doutorado empresarial na IGC, uma das maiores companhias de café solúvel do Brasil.
"Quando a gente usa o spray dried, o café é pulverizado dentro de uma câmara em temperaturas altas, de 150 a 180 graus. Quando a gente faz a liofilização, esse extrato é congelado e a secagem é feita a baixa pressão. Como a pressão é mais baixa, a gente consegue fazer a secagem em uma temperatura mais branda, e então ele preserva mais as características, principalmente as características aromáticas", diz.
Segundo Zanin, a melhoria dos solúveis se deve sobretudo às maiores exigências dos consumidores, que fizeram a indústria correr atrás de processos mais sofisticados e matéria-prima de maior qualidade.
Antes, o mercado usava principalmente grãos do tipo canéfora em suas composições. A espécie, mais barata e mais limitada em aromas e sabores, tem gradativamente dado lugar à espécie arábica –hoje, há vários cafés solúveis 100% arábica.
Apesar da melhoria, o café solúvel sempre terá algumas perdas sensoriais em relação aos preparos tradicionais. É que, neste método de preparo, só é possível extrair elementos que são solúveis em água.
Assim, outros componentes do café coado, como as gorduras e os carboidratos maiores, não estarão presentes na bebida preparada com o solúvel, explica Zanin.
Mas, em situações em que não há a possibilidade de preparar um coado, o solúvel pode ser uma alternativa prática. A barista e Q-Grader (avaliadora profissional de café) Isabela Raposeiras, do Coffee Lab, diz que hoje de fato há cafés instantâneos melhores no mercado.
"Não sou contra a cápsula, mas às vezes eu acho melhor ter um bom liofilizado à mão do que uma cápsula", diz.
Apesar de ainda carregar o estigma, o setor tem registrado crescimento constante. Dados fornecidos ao Café na Prensa pela Abics mostram que o consumo de café solúvel tem crescido, em média, quase 4% ao ano nos últimos cinco anos.
A fatia de mercado no varejo, contudo, ainda não é tão grande. Pesquisa encomendada em 2021 pela Abic (Associação Brasileira da Indústria de Café) mostra que apenas 6% dos brasileiros dizem tomar café solúvel.
No atacado, a presença é maior, já que o setor fornece muita matéria-prima para a indústria alimentícia, que recorre aos solúveis para a fabricação de produtos que levam café em sua composição –como, por exemplo, cappuccinos prontos ou comidas e bebidas com sabor de café.
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