Nem os pais do Gabi sabem ao certo como ele é capaz de fazer tantos cálculos mentais, uma vez que não pega no papel e no lápis, muito menos manuseia calculadoras para sustentar suas contas. Pouco importa, ele acaba de se tornar, ao lado de três colegas de escola, campeão nacional de matemática, com o requinte de ser convidado para a etapa mundial da competição, na Tailândia.
O que é clarividente na realidade do garoto de 12 anos, que não usa a comunicação verbal e tem os movimentos de todo o corpo comprometidos pela paralisia cerebral, é o impacto das amizades e da escola inclusiva para seus resultados.
Certa vez, em uma prova, Gabi se negou a apontar o resultado de uma conta para a professora –ele tem botões de sim e não acoplados na cadeira de rodas. Intrigada, ela percebeu, depois, que a recusa era porque nenhuma alternativa oferecida era a correta.
Ninguém é obrigado a ler mentes, é óbvio, mas é do nosso tempo passar a entender formas múltiplas de interação com o mundo, ter disposição e ser receptivo a elas.
O que me comove mais na história não é o batido "exemplo de superação" e blablablá. É a humanidade se movimentando para que as diferenças não fiquem para trás.
Gabi tem amigos de sala que dão a ele suporte, tem professora que o assiste nas tarefas de classe, tem ônibus acessível para ir nos passeios com a turma, tem todo o amor familiar e, mais do que tudo, é visto em sua completude, a sua maneira.
A turma do Gabi criou até uma "parede de escalada", no chão da quadra, para que ele pudesse brincar e jogar igual a todos os outros. As diferenças vão sempre reagir positivamente diante da simplicidade de poderem se manifestar, serem vistas.
A família ainda não sabe como irá levar o garoto para o outro lado do planeta, onde a prova terá de ser realizada individualmente –também ainda não há clareza se ele terá a acessibilidade que precisa, suporte tecnológico.
Há muita coisa a se pensar, a enfrentar, a estudar, a preparar e a saber se dará certo. Ainda não é tão simples embarcar um pré-adolescente com tantas demandas num avião rumo a Bancoc.
O que já está consolidado é o efeito que o campeonato causou no garoto e na comunidade que habita: sorrisos ininterruptos, sensação de realização, de alegria e de caminho escancarado para a formação de pessoas melhores.
Outra coisa também é certa nesta história, a verdade do desabafo emocionado da professora que deu a notícia da conquista à família: "Eu sempre disse que o mundo ainda iria ouvir falar muito do Gabriel. Eu tenho o maior orgulho dele. Ele está numa alegria sem fim. A matemática levará ele para muito longe ainda."
Por todos os cantos há pequenos clamando por entendimento, olhares menos estigmatizados e oportunidades para chegarem onde todos queremos estar, nos lugares onde gritam nossas emoções, vontades, habilidades e amores. Que o Gabriel e seus amigos sigam jogando luz em soluções.
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