Na noite de 5 de janeiro de 1998, por volta das 22h, João Acácio Pereira da Costa, 56, conhecido como Bandido da Luz Vermelha, foi assassinado com um tiro na cabeça num bar em Santa Catarina.
O crime aconteceu no bairro de Cubatão, na zona norte da cidade de Joinville, e foi registrado na 4ª Delegacia de Polícia do município.
O disparo que tirou a vida de Luz Vermelha foi efetuado pelo pescador Nelson Pinzegher, de 46 anos, que confessou o crime.
Na ocasião, João Acácio estava em liberdade havia pouco mais de quatro meses, após ter cumprido 30 anos de pena por homicídios e assaltos em São Paulo durante os anos 1960.
Conforme o "Notícias Populares" informou na época, Luz Vermelha morava de favor havia dois meses na casa do pescador.
O jornal noticiou ainda que, segundo o algoz do ex-detento, o disparo foi efetuado para salvar a vida do irmão, Lírio Pinzegher, que fora agarrado e ameaçado com uma faca depois de um desentendimento por causa de um suposto assédio sexual cometido por Luz Vermelha contra a mãe e a mulher do pescador.
Em novembro de 2004, Nelson Pinzegher foi absolvido pela Justiça de Joinville, que apesar da denúncia de crime qualificado, sustentou que o ato do pescador foi em legítima defesa.
O FAMIGERADO LUZ VERMELHA
A trajetória criminal do Bandido da Luz Vermelha começou na década de 1960, quando passa a dominar o noticiário criminal nos periódicos de São Paulo ao cometer diversos assaltos à residências na capital paulista.
A fama do criminoso ganhou tamanha proporção midiática, que entre os dias 23 de outubro de 1967 e 3 de janeiro de 1968, o "Notícias Populares" publicou uma série* de 57 capítulos sobre a vida do criminoso.
Nascido em 20 de outubro de 1942, em São Francisco do Sul (SC), João Acácio e seu irmão mais velho, Joaquim Tavares Pereira, foram criados por um tio após a morte precoce dos pais.
MAUS-TRATOS NA INFÂNCIA
Em 1967, ano em que foi preso em Curitiba (PR), Luz Vermelha relatou à polícia maus-tratos cometidos pelo tio tutor, José Pereira da Costa, na época em que ele e o irmão viviam sob a sua guarda em Joinville (SC).
O bandido contou que ele e o irmão eram submetidos a trabalhos forçados pelo tio em troca de comida. O criminoso disse ainda que ambos foram torturados física e psicologicamente pelo parente, que negou as acusações.
João Acácio, então, decidiu viver nas ruas de Joinville, onde começou a praticar pequenos crimes, como roubo de guarda-chuva nas entradas dos cinemas e roupas em lojas. Este último delito para saciar seu lado vaidoso.
Nessa época até ganhou alguns trocados como engraxate, mas não conseguiu se manter longe da marginalidade, a ponto de ficar manjado no município após passagens por roubos e furtos. Às vezes, em vez de voz de prisão, recebia conselhos dos policiais. Mas nada parecia tirar o jovem da rota do crime.
João Acácio também fracassou na tentativa de trabalhar em duas tinturarias. Na primeira, um beijo na filha do patrão, flagrado pelo próprio, o fez sair do emprego. Na segunda, confiscou o terno de um cliente para ir ao cinema, mas foi visto pelo dono da roupa e acabou sendo demitido pelo proprietário da tinturaria.
Com a polícia de Joinville em seu encalço após cometer algumas transgressões, ele se mudou para Curitiba, mas não ficou por muito tempo lá, tanto que, no início dos anos 1960, fixou-se na Baixada Santista, em São Paulo, de onde passou a viajar para a capital paulista para praticar roubos em residências de luxo.
Nesse período, em que fez do crime sua profissão, tornou-se um dos bandidos mais temidos e procurados de São Paulo, muito, pela forma impetuosa com que agia diante das vítimas. Foram mais de cinco anos de perturbação pública, com dezenas de assaltos, estupros e homicídios atribuídos a ele pela polícia.
A PRISÃO
De volta a Curitiba, Luz Vermelha foi preso no dia 7 de agosto de 1967, após incessante investigação policial, que descobriu que ele vivia sob a identidade falsa de Roberto da Silva.
No dia da prisão, o "Notícias Populares" havia publicado o retrato falado do criminoso, com uma longa legenda: "Este é o homem que a polícia está caçando. É ele Roberto da Silva, o Bandido da Luz Vermelha. Sua identificação só foi possível através de levantamentos, comparações e análises de impressões digitais coletadas em diversos locais de assaltos, principalmente nas mansões das ruas Ágata e Rafael de Barros, na zona sul de São Paulo."
Segundo o jornal, havia "um verdadeiro exército de policiais em seu encalço". A prisão do meliante era iminente.
Na edição de 8 de agosto de 1967, o "NP" trouxe a seguinte manchete: "Preso Bandido da Luz Vermelha em Curitiba - com malas cheias de dinheiro."
A reportagem informou com detalhes toda a movimentação da polícia paulista até a captura do assaltante, no Paraná.
Os episódios da fuga e da prisão foram resumidos nos primeiros parágrafos do noticiário: "Acuado pelos policiais paulistas, o mascarado conseguiu ludibriar a vigilância de que era alvo, fugindo ao cerco, tomando o rumo do sul, passando por Santos. A polícia paulista, certa de que Roberto Silva [nome falso] procuraria se homiziar no Paraná, imediatamente entrou em contato com as autoridades daquele Estado, alertando-as."
"Exercendo severa vigilância em todos os pontos por onde o marginal poderia estar no Paraná, os policiais locais conseguiram prender o perigoso bandido que já alcançara Curitiba, submetendo-o, então, a cerrados interrogatórios."
O criminoso, que gastou boa parte do dinheiro dos roubos com mulheres e boates na Baixada Santista, agora não passava de mais um número no sistema prisional brasileiro.
A CONDENAÇÃO
Luz Vermelha foi condenado em 88 processos, sendo 77 roubos, quatro homicídios e sete tentativas de homicídios, que renderam a ele 351 anos, 9 meses e 3 dias de reclusão em regime fechado. Porém a lei brasileira não permite que um preso permaneça mais do que 30 anos na prisão.
Logo nos primeiros meses de detenção, João Acácio escreveu de dentro da cela uma carta em que denunciou frequentes ameaças de morte que vinha sofrendo. O relato foi publicado na capa do "Notícias Populares", em 6 de outubro de 1967.
CRIMES E ALCUNHAS
Todas as quatro mortes atribuídas a João Acácio, efetuadas nos últimos dois anos antes de sua prisão e confessadas por ele nos seguidos interrogatórios feitos pela polícia, foram manchetes nas edições do "NP".
A primeira delas, em 3 de outubro de 1966, foi a do estudante Walter Bedran, de 19 anos, que, ao tentar surpreender o bandido, que acabara de invadir o quintal de sua residência no Sumaré, foi alvejado com um tiro na cabeça.
Dez dias depois, a vítima foi o operário José Enéas da Costa, 23, morto durante uma briga com o criminoso em um bar no bairro da Bela Vista.
No ano seguinte, em 7 de junho, no Jardim América, o industrial Jean von Christian Szaraspatack, ao reagir a uma tentativa de roubo, foi assassinado numa troca de tiros. Em menos de um mês, em 6 de julho, João Acácio ainda matou o vigia José Fortunato, que tentou impedir sua entrada na mansão em que fazia guarita, no bairro do Ipiranga.
Luz Vermelha não foi o primeiro a ser chamado desta forma. No dia 2 de maio de 1960, morria na câmara de gás do presídio de San Quentin, na Califórnia (EUA), o americano Caryl Whittier Chessman, também chamado de "Red Light Bandit". Assim como o brasileiro, Chessman costumava usar uma lanterna com facho de luz vermelho para intimidar as vítimas.
Antes de se tornar o Bandido da Luz Vermelha, João Acácio já havia preenchido as páginas policiais do "NP" como o "Homem Macaco", época em que usava um macaco hidráulico para alargar as grades das casas que pretendia furtar. Outra denominação atribuída ao bandido foi a de "Mascarado".
CINEMA
A fama e a repercussão em torno de suas ações criminosas fizeram sua história chegar às telas de cinema com o filme "O Bandido da Luz Vermelha", de Rogério Sganzerla (1946-2004).
Em 2012, a viúva de Sganzerla, a atriz Helena Ignez, lançou o filme "Luz nas Trevas", com o cantor Ney Matogrosso no papel principal. O longa, uma continuidade do filme de 1968, foi produzido a partir de um roteiro inacabado do cineasta.
No campo das artes, João Acácio ainda ganhou referência nas músicas "Rubro Zorro", do grupo de rock Ira!, e "O Bandido da Lupa Vermelha", gravada pelo rapper Patrick Horla.
FIM DA LINHA
Após cumprir 30 anos de prisão –com idas e vindas entre a Penitenciária do Estado e a Casa de Custódia de Taubaté, onde realizava tratamento psiquiátrico–, Luz Vermelha seria solto em 23 de agosto de 1997. Mas uma liminar concedida pelo então segundo vice-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, o desembargador Amador da Cunha Bueno Neto, o impediu de sair da prisão.
O magistrado, a pedido do Ministério Público, alegou que era evidente que a sociedade não poderia ficar à mercê de eventuais atos cometidos pelo sentenciado. O bandido, então, permaneceu em reclusão.
No dia 26 de agosto, porém, depois de analisar novos laudos médicos realizados pelos psiquiatras Charles Louis Kiraly e Norberto Zollner Júnior, Cunha Bueno revogou a liminar, e Luz Vermelha ganhou as ruas. O despacho emitido pelo desembargador dizia: "Ante a clareza das conclusões, não se justificava a permanência do sentenciado na Casa de Custódia."
No dia seguinte, Acácio voltou a ser notícia no "Notícias Populares". Na capa, uma chamada curta: "Luz Vermelha está solto". "João Acácio Pereira da Costa, 55, o 'Bandido da Luz Vermelha', está finalmente de volta às ruas."
Livre, João Acácio seguiu para Curitiba, para a casa do irmão, Joaquim Tavares Pereira. Porém, após divergências com os familiares, o ex-detento procurou acolhimento em Joinville, na casa do tio José Pereira da Costa, o mesmo que fora acusado por ele de maus-tratos durante a infância. Mas novos conflitos fizeram Luz Vermelha deixar a residência do tio e trilhar um caminho que, poucos meses depois, o tornaria vítima de assassinato.
Na época, o "NP" apurou que o diretor do Hospital Regional de Joinville teria assinado o atestado de insanidade do ex-detento, dias antes de ele ser morto pelo pescador. Ou seja, ele estava prestes a ser internado em um hospital psiquiátrico.
*Na série publicada pelo "NP" na década de 1960, a história do bandido foi adaptada, e nomes fictícios de personagens foram criados.
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