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É preciso se despir de roupas e preconceitos para entrevistar pessoas em um cruzeiro naturista

Em 'Folha por Folha', repórter Anna Virginia Balloussier relata bastidores de reportagem sobre viagem em alto-mar no Caribe com adeptos do nudismo

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Rio de Janeiro

Veja bem, sou uma repórter acostumada a cobrir religião (saia no pé, decotes tímidos, colarinho de padre, o pacote todo) e política (o Congresso, para ficar num exemplo, orienta que mulheres usem calça comprida, camisa com manga, vestido ou saia na altura do joelho).

Até o dia em que me vi em alto-mar com dezenas de pessoas, na maioria idosas, todas completamente nuas, todas sincronizadas numa coreografia para a música daquele refrão “Play that funky music, white boy” (algo como “toque aquela música funk, garoto branquelo”).

E agora? O “Manual da Redação” da Folha não traz um tópico sobre “como entrevistar um sexagenário pelado enquanto ele toma uma marguerita”.

Foram nove dias a bordo do Big Nude Boat, um cruzeiro que ziguezagueava pelos mares do Caribe com 2.167 adeptos do nudismo… E eu.

Tinha tudo o que um cruzeiro normal tem, como piscina, jacuzzi, tobogã, drinque colorido, spa e passageiro vomitando por causa do balanço do mar, exceto uma coisa: roupas —você até podia usá-las, mas a praxe era o dress code “como vim ao mundo”.

Cenas que no começo acionavam o aluno da quinta série que existe dentro de mim —aquele com um senso de humor tão maduro quanto piada de pum— ao longo dos dias ficaram mais naturais.

Como quase ser atropelada, na fila do almoço, por um idoso despido numa scooter para pessoas com dificuldade de locomoção.

Seria muito fácil, numa cobertura como esta, ressaltar apenas o lado pitoresco dessa gente tão peculiar para mim.

Mas não demorou para que eu me tocasse da importância de tirar a roupa, já que era difícil entrevistar pelados que se sentiam julgados pela repórter de casaco —em minha defesa, fazia cerca de 15ºC 
nos dois primeiros dias.

Foi preciso me despir também de preconceitos para enxergar as tantas histórias que valiam a pena serem contadas entre aquela trupe peladista.

Como a de Margaret, 67, estreante em nudismo. Embarcou nesta aventura para se sentir mais próxima da filha caçula, que amava praias naturistas e morreu aos 28 anos, de câncer. Um brinde de marguerita a ela.

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