Notícias
Entrega do principal prêmio literário da língua portuguesa aconteceu nesta terça (14), com as presenças da ministra da Cultura, Margareth Menezes, e do embaixador de Portugal, Luís Faro Ramos
Silviano Santiago recebe Prêmio Camões 2022 em solenidade na Biblioteca Nacional
O escritor mineiro Silviano Santiago recebeu o diploma do Prêmio Camões 2022, nesta terça (14), em solenidade na Biblioteca Nacional - um órgão vinculado ao Ministério da Cultura - no Centro do Rio de Janeiro. O evento contou com as presenças da ministra da Cultura, Margareth Menezes; do embaixador português no Brasil, Luís Faro Ramos - representando o ministro da Cultura de Portugal, Pedro Adão e Silva; e do presidente da Fundação Biblioteca Nacional (FBN), Marco Lucchesi.
O regresso à fraternidade
O primeiro discurso da solenidade foi proferido pelo embaixador português: “Silviano Santiago estudou e escreveu sobre Camões. Por isso, com muita propriedade e conhecimento de causa, recebe o prêmio que tem como patrono a figura maior das letras portugueses. Há que salientar que este ano conseguimos pôr a escrita em dia: é um ano em que são entregues quatro Prêmios Camões. Não é normal, mas eu diria que é um ano auspicioso para as relações entre os nossos países, que se consiga pôr a escrita em dia precisamente no primeiro ano de uma nova era para o Brasil e para suas relações com o mundo”, afirmou Luís Faro Ramos, antes de passar a palavra ao ministro da Cultura de Portugal, que se pronunciou por meio de um vídeo.
“Este tem sido um ano singular e de muita celebração em conjunto com o Brasil, uma vez que acabamos por entregar os prêmios correspondentes a quatro anos: tivemos a emocionante cerimônia que celebrou Chico Buarque, autor premiado no já longínquo ano de 2019; agora Silviano Santiago em 2022; mas também entregaremos o prêmio de caráter póstumo ao português Vítor Manuel Aguiar e Silva, por 2020; e entregamos, em maio passado, à moçambicana Paulina Chiziani, por 2021. Todas essas celebrações são uma forma de marcar simbolicamente o regresso do Brasil a uma fraternidade comprometida com o países de língua portuguesa, num regresso que, espera-se, prolongue-se por muitos anos”, afirmou Pedro Adão e Silva.
A importância da literatura
Em seguida, a ministra da Cultura Margareth Menezes falou aos presentes: “Pensar o Prêmio Camões no momento em que vivermos significa abraçarmos uma língua portuguesa que é diversa, multifacetada, multicultural e transformadora. Por isso, é tão representativo e necessário que escritoras e escritores da África, escritoras mulheres tenham sido agraciadas também com o prêmio - como Paulina Chiziani, primeira mulher a publicar um romance em Moçambique, premiada em 2021. O prêmio reafirma a importância da literatura como algo que nos constitui como cidadãos e cidadãs, pois nos permite reivindicar uma posição de donos e donas de nossas próprias ideias; reforça o papel fundamental da literatura como transformadora de vidas, e do acesso à escrita - em particular, para grupos marginalizados de falarem sobre si, pois passamos a falar de nossas vidas a partir de nossas vozes”.
A esperança e o sonho
Silviano Santiago dedicou o prêmio ao escritor Mário de Andrade, e falou em discurso sobre os sentimentos ambíguos ao saber da premiação, no segundo semestre de 2002:
“A pandemia tinha instaurado o medo e a infelicidade no planeta. Desaparecem as cenas de multidão e se multiplicam as fotos de covas e de retratos de pessoas tristes e ensimesmadas. O silêncio e o caos tomam conta das famílias e das ruas que, no Brasil, padecem o descaso administrativo do Ministério da Saúde e do próprio governo nacional. Não há clima digno para ambientar e encorajar o fluxo da autoestima e da alegria sentido pelo cidadão brasileiro contemplado. Nosso 2022 não será fácil de ser esquecido” disse.
“Ao final do ano de 2022, o resultado das eleições trouxe alento. Trouxe de volta ao povo brasileiro a possibilidade de se concretizar no dia a dia a esperança e o sonho duma nação mais igualitária e solidária. Era urgente a reconstrução meticulosa de um país da América do Sul que esteve a perigo de desaparecer no caos”, afirmou. Silviano terminou seu discurso recordando seu professor Mário de Andrade:
“Lanço os olhos para a infinita imensidade desse agora que vivo e vivemos e dedico o Prêmio Camões a Mário de Andrade, meu mestre. Em 1942, proibido pelo Estado Novo de falar no auditório do Itamaraty, Mário lê, na Casa do Estudante do Brasil, o seu sofrido testamento sobre o legado do Modernismo brasileiro. Ao final, a reflexão ensaística do mestre se torna pessoal e se exprime por palavras que roubo no momento em que agradeço a presença ilustre de todas e de todos neste auditório. Repito as palavras de Mário de Andrade: ‘E se agora percorro a minha obra já numerosa e que representa uma vida trabalhada, não me vejo uma só vez pegar a máscara do tempo e esbofeteá-la como ela merece. Quando muito lhe fiz de longe umas caretas. Mas isto, a mim, não me satisfaz”, completou.
Forças do futuro
O último discurso da solenidade foi proferido por Marco Lucchesi, presidente da FBN: “A astúcia da razão e a hipótese do acaso estão inscritos no saber de Silviano Santiago. Ele está disposto a correr todos os riscos, jamais sabemos sua direção, ele tampouco: porque a inteligência do processo para o qual ele está atento, aberto e sensível, empresta-lhe um horizonte, um pedaço oportuno de futuro, como quem manda para longe uma carta telegráfica”, afirmou. “É um momento forte que estamos vivendo, para convocar todas as forças do futuro – para apressá-lo diante dos desafios sociais para a construção de uma política da paz e da fraternidade”, completou Lucchesi.
Ao término da premiação, os presentes assistiram à apresentação do grupo Música Antiga da UFF, dedicado ao repertório da idade média e do Renascimento – do tempo de Camões – e cuja trajetória é profundamente ligada à Biblioteca Nacional, já que seu repertório inclui peças cujas partituras originais pertencem ao acervo da instituição.
Sobre Silviano Santiago
Nascido na cidade de Formiga (MG), em 29 de setembro de 1936, Silviano Santiago é ensaísta, poeta, contistas, romancista e professor. Considerado um dos maiores escritores brasileiros da atualidade, é autor de cerca de 30 obras – entre as quais, os livros “Em liberdade” (1981), “Uma história de família” (1993) e “Keith Jarret no Blue Note” (1996). Sua produção já foi traduzida para o inglês, espanhol, italiano e francês. Entre as premiações já recebidas pelo autor, constam: Prêmio Jabuti (1982, 1993 e 2017); Prêmio ABL de Ficção, Romance, Teatro e Conto (2009); Prêmio Machado de Assis (2013); Prêmio Iberoamericano de Letras José Donoso (2014) e Prêmio Oceanos (2015).
Sobre o Prêmio Camões
O Prêmio Camões de Literatura foi instituído em 1988 com o objetivo de consagrar um autor de língua portuguesa que, pelo conjunto de sua obra, tenha contribuído para o enriquecimento do patrimônio literário e cultural de nossa língua comum. A Menção Internacional foi criada pelo Protocolo Adicional ao Acordo Cultural entre os governos português e brasileiro, representados, respectivamente, pela Direção Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas/Secretaria de Estado da Cultura (Portugal), e pela Fundação Biblioteca Nacional/Ministério da Cultura (Brasil).
Considerado o mais importante prêmio da língua portuguesa, o Camões contempla anualmente autores da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP): Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe, Timor-Leste. A comissão julgadora é composta por representantes do Brasil, de Portugal e de países africanos de língua oficial portuguesa.
O autor premiado, além de ter o conjunto de sua obra reconhecida, recebe uma láurea no valor de 100 000€. Metade deste valor é subsidiado pela Fundação Biblioteca Nacional.