Inteligência artificial, fake news e racismo são temas que merecem atenção apurada, porque os desdobramentos desses processos podem mudar cultura, comportamento e democracia. A cada 30 segundos uma mulher é agredida no Twitter, e a probabilidade de ser negra, asiática ou latina é 34% maior. Nem sempre as denúncias são levadas adiante, sendo, algumas vezes, tomadas como calúnia. Os dados apresentados pela influenciadora Monique Evelle, fundadora do Inventivos, plataforma de formação de empreendedores negros, durante a 13ª edição do Web Summit Rio, trouxe à tona questão também abordada por Ayo Tometi, fundadora do Black Lives Matters, considerado o maior movimento social já visto.
A tecnologia vem dando voz ao discurso de ódio e os algoritmos que comandam redes sociais podem contribuir para amplificar o problema. “Quando Elon Musk comprou o Twitter, houve aumento de 53% de termos transfóbicos e 61% a mais de termos contra judeus. Temos usado as redes pensando em como monetizar além da publicidade, mas tudo tem consequências, inclusive na produção de conteúdo e no relacionamento dos criadores de grupos sub-representados com marcas. Precisamos falar sobre isso abertamente”, afirma Evelle.
A influenciadora baiana chamou atenção para a dificuldade em se visualizar impactos negativos do consumo diário de conteúdo racista e preconceituoso sobre o trabalho dos profissionais, mas as estatísticas evidenciam o problema. “Jovens negros são os mais suscetíveis a suicídios. Essa chance aumenta se somos mais atacados”, diz. Por essa razão, a PL das Fake News que tramita no Congresso é tão relevante, embora as discussões estejam restritas às big techs, aos partidos políticos e ao governo, passando ao largo da sociedade.
“Como não se está falando sobre a PL em um evento como este?”, questionou, completando: “Não estamos discutindo sobre como vai impactar grupos sub-representados. Mais uma vez vamos ficar de fora dessa discussão. Se há fake news sobre você, pessoa preta, você precisa poder acionar a plataforma, porque está destruindo sua vida. Estamos adiando a possibilidade de construir futuros.” Evelle chamou atenção para o impacto do racismo, que faz com que pessoas negras incorporem a ideia predominante de que não são tão boas quanto trabalhadores brancos. “Com isso, você não consegue ver valor no que faz”, diz. Tanto que, segundo ela, criadores de conteúdo negros recebem valores bem inferiores aos dos brancos, pagos por agências em campanhas de grandes empresas, interessadas em carimbar em sua marca o tema diversidade.
A Inventivos foi criada recentemente como forma de mitigar o problema. A plataforma de empreendedorismo, que ajuda pessoas que começam do zero a solucionar problemas com base em saídas encontradas por outros participantes, lançou fundo de investimento para startups de pessoas negras. Duas já receberam aportes e até o fim do ano a ideia é investir em outras oito.
Maior inclusão étnica e de gênero se traduz em fortalecimento da democracia. A tecnologia pode ser grande aliado nesse processo, mas, segundo Ayo Tometi, não é o que se vê. Ao contrário, tecnologia de mídia não é neutra. “Os algoritmos das redes sociais estão trabalhando contra nossas vozes. Algumas histórias, que não são as nossas, têm mais visibilidade. Nossos conteúdos, muitas vezes, são colocados em posições inferiores. É lastimável ver como nossas mensagens são tratadas”, diz. Para Tometi, o momento é de garantir que a tecnologia seja desenvolvida pensando em um mundo diverso e inclusivo.