O e-commerce tem elevado sua participação no setor de varejo. A Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm) afirma que as vendas on-line representam cerca de 10% do faturamento do varejo. Mas, para algumas empresas, essa fatia já se aproxima de 40%. Em levantamento para o Valor, a Suno Research avaliou os balanços de cinco varejistas listadas em bolsa - Carrefour, Grupo SBF (Centauro), C&A, Petz e Renner - de 2019 até o segundo trimestre deste ano. Todas tiveram alta na participação do e-commerce no faturamento, e o consenso entre os analistas é o de que o isolamento imposto pela covid forçou o movimento de início ou de aprimoramento das vendas digitais.
“A pandemia teve um efeito na nossa economia e em especial nos varejistas no sentido da necessidade da digitalização. Nada melhor do que uma crise para fazer com que todo mundo se mexa”, afirma José Eduardo Darconco, analista da Suno Research.
E mexeu mesmo. A Petz, com 233 pontos de pet shops físicos pelo país, vinha modelando a entrada nas vendas on-line desde 2015, inspirada por gigantes estrangeiras como Amazon e Whole Foods. Em 2018 o modelo de negócio, que usava lojas físicas como espécie de hubs - chamado hoje de omnichannel -, estava pronto, de modo que, com a pandemia, foi um movimento natural que só cresceu. “As pessoas realmente gostaram de comprar o segmento pet pelo meio digital e conseguimos entregar assim serviço pelo menor custo”, afirma o CEO da Petz, Sergio Zimerman. O e-commerce, que representava 7% das receitas da companhia em 2019, passou para 34% de participação no segundo trimestre de 2023. “Mas chegamos a 40%”, diz Zimerman.
Na Renner, a fatia do comércio digital passou de 5,6% para quase 19% no mesmo período. Na C&A, essa relação foi de 0,8% para 15,16%. No Carrefour, de 3,82% para 6,42%, e na Centauro, de 17,56% para 21,81%. De acordo com a Abcomm, o número de lojas on-line saltou de 30 mil, em 2019 para 200 mil durante a pandemia, em 2021.
Apesar de as vendas digitais estarem cumprindo papel relevante nos resultados de algumas das principais varejistas do país, essa alta não foi o suficiente para livrá-las de apurações negativas nos balanços e de queda nos retornos das ações na Bolsa. Isso porque o setor de varejo é muito correlacionado com o contexto macroeconômico. À exceção da C&A, que melhorou caixa, aumentou margem e teve retorno de mais de 100% nos papéis nos últimos 12 meses até agosto, segundo a Quantum Finance, as demais empresas observadas aqui tiveram desempenho negativo na B3 no período.
Segundo os analistas, o cenário, que no início da pandemia era de juros baixos e franco crescimento do e-commerce, passou, já em 2021, para inflação ascendente e consumidor endividado. “No início de 2021 o mundo percebeu que a inflação seria um problema maior do que do que estava imaginando”, diz Lucas Rietjens, analista da Guide Investimentos. Os bancos centrais elevaram as taxas de juros para conter as altas dos preços, com impacto direto no varejo. As operações on-line ajudaram a segurar as vendas, mas não a ponto de animar os investidores. “Algumas dessas operações de e-commerce eram muito boas do ponto de vista de venda, mas não de lucro”, analisa Rietjens.
No segundo trimestre deste ano, a C&A reportou lucro líquido de R$ 4,2 milhões, mais que o dobro do aferido no mesmo período de 2022. O resultado da Renner caiu 36,3% no período, para R$ 229,7 milhões, enquanto o Grupo SBF teve prejuízo líquido de R$ 32,6 milhões no segundo trimestre de 2023. A Petz teve R$ 24,54 milhões de lucro líquido ajustado, uma queda de 25,1% em relação ao mesmo período do ano anterior. “Mas tivemos toda a geração de caixa operacional suficiente para pagar os investimentos nos primeiros seis meses, e isso não acontecia em dez anos”, conta Zimerman.
Apesar dos resultados fracos no último trimestre, daqui para a frente o setor trabalha com expectativas melhores para o e-commerce, em função, entre outros, do esperado ciclo de queda da taxa de juros e de um desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) acima do esperado. “Mesmo nos tempos de crise de bolso apertado o consumidor corre para o on-line, porque ele tem aquela percepção de que comprar pela internet é mais barato”, afirma Mauricio Salvador, presidente da ABComm.
Para o CEO da Petz, o varejo pet ainda é beneficiado pelo aumento populacional que o país experimenta. Segundo o último censo do IBGE, a população cresceu 6,5% em 2022, comparando com 2010. “Isso ajuda a cada vez mais famílias terem um pet em casa e garante a resiliência do segmento”, afirma.