Tecnologia e agronegócio caminham cada vez mais juntos. O êxito dessa parceria, que inclui o financiamento adequado do processo de transformação, pode tornar o Brasil uma potência global em bioeconomia. O agro 5.0 demanda inteligência artificial, blockchain, dados, marketplace -- ferramentas essenciais para a agricultura de precisão --, mas o desafio é levar essas tecnologias aos pequenos e médios produtores rurais.
O tema, debatido durante a Febraban Tech 2024, inclui a necessidade da inclusão digital e ampliação da conectividade no campo, visto que soluções tecnológicas para o agro não se resumem a software e hardware, mas abrangem práticas de manejo, de cultivo e de bioinsumos, sementes qualificadas para otimizar a produtividade, como as resististes à seca. “Tudo isso envolve tecnologia”, diz Ketlin Sfair Antunes, gerente-executiva de agronegócio do Banco do Brasil.
Há demanda por financiamento. No BB, por exemplo, a carteira de crédito sustentável soma R$ 359 bilhões, valor bem próximo à meta de R$ 500 bilhões até 2030, fixada pelo banco no compromisso firmado dentro da chamada Agenda 2030, da ONU, que estabelece 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
O BB, segundo Antunes, inovou ao levar crédito para os produtores rurais de uma forma integrada, principalmente para o pequeno. Como exemplo, citou o hub de tecnologia desenvolvido no Amazonas, ecossistema que conecta capacitação, tecnologia e recursos a produtores extrativistas, levando o que chamou de crédito sustentável à floresta. “Temos drones, algoritmos, blockchain, startups, mas o desafio é transferir tudo isso para nossos produtores rurais”, diz.
O que está em jogo é o uso da agricultura de precisão na transição para economia de baixo carbono, aumentando a sustentabilidade da produção rural. Isso, por meio máquinas autônomas, sensores de IoT (internet das coisas) e algoritmos sofisticados capazes de apontar problemas na lavoura antes que aconteçam e aumentar a produtividade por hectare, por exemplo.
“O produtor rural está sedento por tudo isso”, diz Teresa Vendramini, pecuarista e membro do Conselho de Administração da Embrapa. Segundo ela, o uso da inteligência artificial no setor elevou a produção rural em 59%, em quatro décadas.
O upgrade do agro 4.0 para o agro 5.0, como se vê, será impulsionado por tecnologia, levando ao produtor o acesso a dados em tempo real. Soluções como a do mapeamento digital de plantas daninhas, por exemplo, permitiu a economia de 36 milhões de litros de água utilizados para diluição de pesticidas, desde 2017. Isso, por meio do xarvio, marca global de agricultura digital da Basf.
“É importante para as grandes empresas fomentarem e apoiarem o desenvolvimento dessas tecnologias para garantir mais produtividade e menor impacto ambiental, com geração de valor”, diz Mirella Lisboa, gerente de inovação da Basf América Latina.
A questão tem como pano de fundo o crescimento da população global e a correlata necessidade de garantir segurança alimentar para todos, com uma produção agropecuária sustentável capaz de evitar o agravamento do aquecimento do planeta.
“A tecnologia se usada com cuidado poderá fazer a diferença, assegurando que poderemos usar todas essas forças a nosso favor. Temos, hoje, capacidade de scanear cada hectare no mundo, sem ir ao campo”, diz Srinivasu Pappula, cientista chefe global da Digital Food Initiatives da Tata Consultancy Services, que também enfatizou a importância da democratização do acesso às ferramentas tecnológicas, sobretudo em função do cenário atual. No Índia, 80% dos agricultores têm menos de 1 hectare de terra, realidade semelhante à do Brasil.
Bruno Alvez, diretor de tecnologia da BB Seguros, que dividiu um dos palcos do Febraban Tech sobre agronegócio com três lideranças femininas, enfatizou que a tecnologia aplicada ao campo transformou o modelo de negócios nos últimos cinco anos, resultando na ampliação da carteira de clientes do BB e margens mais reduzidas. Hoje, são 1,5 milhão de produtores rurais em mais de 4,5 mil municípios brasileiros e mais de 40 culturas cultivadas protegidas por seguros.
“Não tem como entregar solução customizada se não usarmos inteligência artificial. É fundamental conhecer cada cliente para entregarmos a solução mais adequada, no canal mais adequado, com preço mais adequado”, diz. Um exemplo é o sensoriamento remoto e diário com foto via satélite, que permite analisar concentração hídrica de cada semente, composição do solo e produtividade para cada área plantada. Os dados são entregues ao produtor.
Um dos principais consensos dos diversos painéis sobre agronegócio foi o de que o uso de tecnologia avançada contribuirá para adoção de práticas com menor pegada de carbono no campo. Srinivasu Pappula observa que, a partir do monitoramento em tempo real, os bancos terão acesso à produção agropecuária com mais precisão, ferramenta importante para a tomada de decisões adequadas sobre concessão de crédito para áreas não sustentáveis. “A cadeia de alimentação passará por uma disrupção enorme”, conclui.