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Eventos como a megaenchente em Porto Alegre também trazem riscos econômicos — Foto: Gustavo Mansur/ Palácio Piratini
Eventos como a megaenchente em Porto Alegre também trazem riscos econômicos — Foto: Gustavo Mansur/ Palácio Piratini

Seguindo a tendência do ano passado, quando desastres naturais como enchentes, secas extremas, furacões e queimadas causaram prejuízos financeiros globais de US$ 380 bilhões, o primeiro trimestre de 2024 já registra perdas bilionárias decorrentes de eventos climáticos. De janeiro a março, elas somam

US$ 45 bilhões, com um total de 12 eventos com prejuízos acima de US$1 bilhão. Dois deles ocorreram na América do Sul: a seca prolongada na região Norte do Brasil, que resultou em perdas econômicas estimadas em US$ 1,3 bilhão, com impactos para a agricultura, abastecimento de água e produção de energia; e os incêndios florestais no Chile em fevereiro, que, potencializados por uma forte onda de calor, vitimaram 131 pessoas e levaram a perdas estimadas em mais de US$ 1 bilhão, ainda sendo contabilizadas. O Brasil também sofreu diferentes eventos de inundações, com perdas somadas que alcançaram US$ 425 milhões.

Os dados são do relatório Q1 Global Catastrophe Recap, da Aon Seguros, e ainda não levam em consideração as fortes chuvas e inundações que devastaram o Rio Grande do Sul, na primeira quinzena de maio, causando a perda de mais de 160 vidas e prejuízos que ainda não foram calculados. Segundo Isabel Solano, CEO de resseguros da Aon Brasil, a recorrência de secas e inundações severas sugere uma tendência agravada pelas mudanças climáticas, exigindo uma reavaliação das estratégias de gestão de risco e infraestrutura. “Do ponto de vista público, é fundamental investir em infraestrutura e planejamento urbano que considerem os riscos de desastres naturais. No âmbito privado, é crucial ampliar a cobertura de seguros”, afirma a executiva.

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Ano após ano, cresce a percepção da severidade dos riscos decorrentes do clima para a economia global. O Relatório de Riscos Globais 2024, produzido pela seguradora Zurich em parceria com o Fórum Econômico Mundial e a corretora Marsh McLennan, mostra que, tanto no horizonte de curto prazo quanto no de longo prazo, os riscos ambientais crescem em importância. O relatório, divulgado anualmente às vésperas da conferência de Davos, na Suíça, é elaborado a partir das percepções de 1.400 lideranças globais, entre CEOs, políticos, acadêmicos e líderes comunitários. Neste ano, dois terços das lideranças classificaram o clima extremo como o risco com maior probabilidade de apresentar uma crise material em 2024, também sendo visto como o segundo risco mais grave à economia global no período de dois anos. Já num horizonte de uma década, as crises ambientais dominam o cenário, representando metade dos dez principais riscos: eventos climáticos extremos, alterações críticas nos ecossistemas, perda da biodiversidade, escassez de recursos naturais e poluição.

Isabel Solano, da Aon: ampliar as coberturas é crucial — Foto: Divulgação
Isabel Solano, da Aon: ampliar as coberturas é crucial — Foto: Divulgação

“No dia a dia dos negócios, os efeitos das mudanças climáticas já estão sendo sentidos na maioria dos segmentos do mercado. Os riscos físicos são as ameaças mais imediatas, com os inúmeros casos de inundações, furacões, secas e outros riscos naturais causando danos às pessoas, bens e infraestruturas críticas”, diz José Bailone, diretor-executivo de seguros corporativos e de subscrição de ramos elementares da seguradora Zurich. O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden/MCTI) monitora diariamente 1.038 municípios com risco elevado para essas ocorrências. Em 2023, o Brasil registrou ainda uma média de três eventos climáticos significativos por dia em todo o território e mais de meio milhão de pessoas foram forçadas a sair de suas casas por causa deles.

Com o aumento da frequência e da gravidade dos eventos climáticos, avançam as discussões para a criação de um seguro social contra catástrofes, que funcionaria como um amparo financeiro para vítimas de desastres provocados por alagamentos e deslizamentos de terras. Uma das propostas em discussão prevê a criação de uma apólice que seria contratada mediante pagamento de

R$ 3 mensais, a serem cobrados na conta de energia elétrica. A proposta, elaborada pela Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), prevê uma indenização de até R$ 15 mil por unidade habitacional, para cobertura de despesas materiais, e R$ 5 mil de auxílio funeral, no caso de vítimas fatais. O valor seria depositado por Pix após as autoridades decretarem estado de calamidade pública.

Há ainda a possibilidade de o seguro ser acionado quando o município entrar em situação de emergência – ou seja, na iminência de danos, o que ocorre com maior regularidade, e neste caso a indenização ficaria entre

R$ 7 mil e R$ 10 mil. “Trata-se de um recurso emergencial, que apoiaria o segurado de forma rápida numa situação de crise, ajudando a comprar medicamentos, pagar o aluguel, sem colocá-lo na dependência de uma resposta governamental”, diz Esteves Colnago, diretor de relações institucionais da CNseg. O projeto foi debatido em duas reuniões técnicas com a Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR) e no dia 17 de abril foi apresentado em audiência da comissão especial da Câmara dos Deputados sobre prevenção e auxílio a desastres e calamidades naturais, junto com outras propostas, para aumentar a resiliência das populações aos impactos das mudanças climáticas.

Lhano, da Marsh: produto é resposta de curto prazo para proteção de eventos extremos — Foto: Divulgação
Lhano, da Marsh: produto é resposta de curto prazo para proteção de eventos extremos — Foto: Divulgação

Uma delas é sobre um seguro para proteger a infraestrutura das cidades dos desastres climáticos, que está sendo formatado por meio de uma parceria entre a CNseg e o ICLEI, organização internacional de governos locais e subnacionais dedicada ao desenvolvimento sustentável, com recursos do Banco Alemão de Desenvolvimento (KfW). O objetivo é formar um grupo de cidades para que seja avaliada a infraestrutura urbana e identificados os principais riscos e, a partir daí, desenvolver um modelo de seguro, com as coberturas, formas de contratação e características da apólice. O projeto prevê a participação de dez cidades da América Latina e do Caribe, alcançando uma população de 7,5 milhões de habitantes. No Brasil, as cidades que integram a iniciativa são Recife, Belo Horizonte, Curitiba e Porto Alegre. A ideia é que os recursos do KfW subsidiem em 60% a contratação do seguro e os municípios entrem com uma contrapartida de 40%, além de definir qual a infraestrutura que deverá ser segurada.

No Recife, por exemplo, as áreas a serem beneficiadas com o seguro devem estar no âmbito de um projeto já em implementação, o ProMorar, que busca requalificar a infraestrutura urbana em regiões de vulnerabilidade social e conta com US$ 260 milhões em recursos de uma operação de crédito da Prefeitura do Recife com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). “Na prática, estamos estimulando a criação de um mercado de seguro paramétrico voltado a infraestruturas resilientes nas cidades. É um projeto inovador, sem semelhantes no sul global”, diz Rodrigo Perpétuo, secretário- executivo do ICLEI América do Sul. Na atual fase, estão sendo realizados os estudos técnicos com as prefeituras envolvidas e, a partir da definição das regiões a serem seguradas, haverá a abertura de uma chamada para o setor privado, em que as seguradoras e resseguradoras entram para desenhar o produto. Segundo Perpétuo, a ideia é que o instrumento esteja pronto até a COP30, em Belém, em 2025.

As seguradoras e resseguradoras, que já sentem no bolso o aumento dos custos decorrentes dos desastres naturais, apostam na ampliação da oferta e da cobertura das apólices, de modo que atendam às novas necessidades da população exposta aos extremos do clima. No Brasil, o mercado segurador cobre apenas 5% das perdas econômicas decorrentes de desastres naturais e de forma bastante concentrada nos produtos agrícolas. Agora, as empresas começam a ampliar a oferta de seguros paramétricos, que são feitos sob medida para os clientes, de modo a proteger os negócios das oscilações climáticas a partir da escolha de um parâmetro – daí o nome paramétrico –, que pode ser volume ou escassez de chuvas, temperaturas etc. Esse parâmetro é fornecido por um terceiro, como um instituto meteorológico, e não pela própria seguradora. O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), por exemplo, desenvolveu um modelo em 2022. A diferença em relação aos seguros agrícolas convencionais é que não é necessário haver um dano físico na propriedade rural, causado por evento climático, para que o segurado tenha acesso ao pagamento do seguro. Ele poderá ser ressarcido caso as condições climáticas preestabelecidas no contrato afetem a etapa de floração de uma cultura, comprometendo a produtividade futura, por exemplo.

“O paramétrico é o seguro da causa, não da consequência. O produto é a resposta de curto prazo para proteção de eventos climáticos extremos”, diz Caio Lhano, superintendente de crédito e seguro paramétrico da consultoria de riscos e corretora Marsh Brasil.

Hoje as principais apólices estão concentradas nos segmentos agro, especialmente grandes produtores, e de energia, mas há possibilidade para expandir para outros setores com potencial para serem prejudicados por eventos climáticos, já que se trata de um produto 100% customizável.

Mais recente Próxima Temporada de recordes no segmento de seguro de vida

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