Sexto Estado mais rico do Brasil e com o terceiro melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), Santa Catarina acumulou bons indicadores de saúde na última década. O Estado tem a maior esperança de vida ao nascer do país para ambos os sexos, 79,7 anos, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que também o coloca como o terceiro com a menor taxa de mortalidade infantil, com 9,32 óbitos para cada mil nascidos vivos. Além disso, é apenas o 14º em morbidade hospitalar de internados. E 73,8% dos catarinenses se autoavaliaram com a saúde boa ou muito boa, em 2019, segundo melhor índice, de acordo com o IBGE.
Mas mesmo com toda a riqueza, o Estado tem enfrentado testes em seu sistema público e privado de saúde, com alta demanda por atendimentos de internação e de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs). A pandemia da covid-19 foi o primeiro sinal de alerta, e agora as doenças respiratórias e a dengue são as vilãs da vez. A cobertura vacinal contra a influenza está em 50,15%, enquanto a meta é de 90%. Quanto à dengue, foram notificados 176,8 mil casos suspeitos até 12 de junho, alta de 49% sobre o mesmo período de 2022.
“A saúde era elogiada porque a atenção básica era uma das melhores do Brasil, se não a melhor. Estudos diversos na década passada apontavam nessa direção”, diz Sérgio Torres, professor de saúde pública da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). “O Estado historicamente teve bons indicadores, mas os últimos anos apresentam um estresse sobre o sistema, que considero em parte conjuntural, por crescimento populacional e pandemia, e em parte estrutural, com enfraquecimento do SUS”, afirma. Enquanto a população brasileira cresceu 6,5% de 2010 a 2022, segundo o Censo do IBGE, o número de residentes em Santa Catarina subiu 21,78%. Em Florianópolis, foi ainda maior: 27,53%.
Fernando Hellmann, também docente de saúde pública da UFSC, acrescenta o avanço da faixa etária. “Aqui se tem um envelhecimento da população, além do aumento de residentes. O financiamento da saúde não acompanha o aumento da demanda”, diz. O governo catarinense estima que seriam necessários a mais, mensalmente, pelo menos R$ 45,8 milhões para que a saúde estadual fechasse no azul - isso sem considerar os gastos com cirurgias eletivas, cuja fila era de 105,3 mil pacientes em fevereiro, último dado disponível. O déficit acumulado do setor no Estado nos 12 meses encerrados em fevereiro era de R$ 549,9 milhões.
A crise na saúde virou a principal agenda de Jorginho Mello (PL), governador eleito em 2022, com a edição de decretos de emergência no início do mandato. O primeiro foi em março, para seis hospitais. Em 19 de junho, a situação foi ampliada para toda a rede. Naquele dia, a ocupação das UTIs era de 93,03% em toda Santa Catarina e de 97% na Grande Florianópolis. Mesmo com o crescimento de 58,7% nos últimos cinco anos, para 1.197, segundo o DataSUS, o número de leitos não é mais suficiente, de acordo com o governo catarinense.
O total de leitos de internação - que somam 15,9 mil, dos quais 11,3 mil no Serviço Único de Saúde (SUS), altas de 4,1% e 3,4%, respectivamente, em cinco anos - também está aquém do esperado, na avaliação da Federação das Santas Casas, Hospitais e Entidades Filantrópicas do Estado de Santa Catarina (Fehosc). “O sistema dá conta, mas em períodos sazonais muitos pacientes chegam ao mesmo tempo, sobrecarregando os hospitais”, afirma Neusa Lúcio Luiz, presidente da entidade.
Maurício Souto-Maior, presidente da Associação dos Hospitais do Estado de Santa Catarina (Ahesc), diz que a falta de prevenção para doenças respiratórias e de cuidados com focos de dengue também são motivos para a crise. “Algumas doenças retornam, e a imunidade da população fica comprometida. O hábito da vacinação deve ser retomado, assim como o cuidado com a dengue”, reforçou. Em relação à covid-19, 98,26% da população completou o esquema vacinal, tomando a primeira e a segunda doses. Os índices caíram para 55,17% para a primeira dose de reforço e para 18,71% para a seguinte.
A crise resultou em uma peregrinação do governo a Brasília atrás de mais recursos. Em 13 de junho, o governador pediu à ministra da Saúde, Nísia Trindade, mais dinheiro para o setor. A ministra se comprometeu em avaliar a situação, disse Jorginho Mello.
“As demandas de saúde são crescentes, e o financiamento não é proporcional. Quem mais arrecada é o governo federal, e era quem mais deveria bancar o setor”, opina Hellman, pesquisador da UFSC. Para o deputado estadual Neodi Saretta (PT), presidente da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de SC (Alesc), o problema do déficit está no orçamento feito pelo governo. “A questão é que não dá mais para aplicar somente 15% na área”, defende.