Rumos da Economia
Group CopyGroup 5 CopyGroup 13 CopyGroup 5 Copy 2Group 6 Copy
PUBLICIDADE

Por João Luiz Rosa — De São Paulo


Patricia Peck, CEO do Peck Advogados: regulação, mas sem bloquear criação — Foto: Carol Carquejeiro/Valor
Patricia Peck, CEO do Peck Advogados: regulação, mas sem bloquear criação — Foto: Carol Carquejeiro/Valor

Em março de 2022, menos de um mês após a Rússia invadir a Ucrânia, circulou nas redes sociais um vídeo no qual o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, pedia que seus compatriotas baixassem as armas e se rendessem aos russos. Feito de modo grosseira, o vídeo não convenceu ninguém. Zelensky chamou a tentativa de “provocação infantil”. Uma dúvida incômoda, porém, permaneceu no ar. Com o rápido avanço da inteligência artificial (IA), não seria uma questão de tempo para que “deepfakes” - sons e imagens manipulados para espalhar desinformação - se tornem plausíveis a ponto de desestabilizar regimes, manchar a reputação de empresas ou destruir a vida de indivíduos?

A IA tem sido usada com sucesso para reduzir custos, tornar processos mais eficientes, melhorar a comunicação com clientes e oferecer serviços a cidadãos, mas há um lado obscuro que preocupa especialistas e autoridades. Além da desinformação, a lista de ameaças inclui riscos à segurança dos dados, disseminação de preconceitos e desrespeito aos direitos autorais. Escolas estão preocupadas que alunos trapaceiem e usem sistemas automatizados para cumprir tarefas escolares, enquanto legisladores se perguntam de quem será a responsabilidade, no futuro, se a IA cometer um erro médico ou fizer vítimas no trânsito.

Tudo isso está levando a movimentos internacionais para estabelecer regras sobre a criação e o uso da inteligência artificial, mas essa também é uma questão controversa. “É preciso regulamentar a IA? É, porque se trata de uma tecnologia de impacto para a sociedade, que exige a definição de padrões. Mas [a legislação] não deve bloquear o desenvolvimento tecnológico”, diz Patricia Peck, CEO e fundadora do escritório Peck Advogados, especializado em direito digital.

O ChatGPT provocou admiração ao mostrar o grau de desenvolvimento da IA generativa, que é capaz de gerar textos e imagens, fazer pesquisas e “conversar”. Em seu mais recente estudo anual, a americana Amy Webb, uma das mais reconhecidas futurólogas internacionais, classificou o ChatGPT como o mais poderoso sistema de IA já lançado para o público em geral. O sucesso do sistema, porém, despertou temores quanto a seus limites, aumentando a pressão para que se estabeleçam limites para a IA.

No Brasil tramita no Congresso o projeto de lei 2.338/23, que dispõe sobre um marco legal para a inteligência artificial. Resultado do trabalho de uma comissão de juristas, o PL foi apresentado ao Senado pelo presidente da casa, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Um dos pontos que merece atenção, diz Patricia Peck, é a definição genérica do que é considerada IA de alto risco, sujeita a regras de controle mais restritas. O texto inclui na categoria sistemas voltados a diversas áreas, como educação, saúde, análise de crédito e identificação biométrica, sem detalhar o tipo de aplicação. Por exemplo, se um hospital usa IA para controlar estoque ou ajudar o médico a atender o paciente.

Isso pode afetar regulações já existentes e ter impacto negativo no desenvolvimento tecnológico, diz a advogada. No caso dos sistemas biométricos, por exemplo, a Organização Mundial de Saúde (OMS) considera o reconhecimento facial mais seguro que outras formas de autenticação, porque evita o contato e ajuda na prevenção à covid-19. Restringir os sistemas indiscriminadamente contrariaria esse tipo de abordagem, diz Peck.

“É preciso pensar em regulamentação da IA e para a IA”, diz o advogado e pesquisador Christian Perrone, responsável pelas áreas de direito & tecnologia e governo eletrônico do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS Rio). No primeiro caso está a imposição de limites para coibir eventuais riscos da tecnologia. No segundo, políticas capazes de estimular o mercado produtor e garantir uma presença sólida no futuro da inteligência artificial. Para Perrone, é preciso equilibrar os dois lados da balança.

Na Europa, a discussão do arcabouço regulatório de IA tem sido acompanhada da regulação específica de cada setor, além de estratégias nacionais de países para usar dados dos cidadãos, de maneira segura, na criação de serviços públicos. “O cuidado é para criar mecanismos que gerem segurança, mas também inovação e inclusão”, afirma o pesquisador.

No Brasil, onde há grande diversidade étnica e cultural, é preciso estimular a criação de modelos de IA que levem em conta essas diferenças para evitar o risco de viés, diz Perrone. “Pouca gente está pensando em como pequenas e médias empresas podem acessar ou desenvolver a inteligência artificial”. Se o país não conseguir ganhar corpo nessa área, o risco é ficar dependente de ferramentas internacionais que não foram treinadas para atender às necessidades locais. É um fantasma do qual pouco se fala: o da sub-representação tecnológica.

Mais recente Próxima Transformação digital precisa de revisões contínuas de estratégia

Agora o Valor Econômico está no WhatsApp!

Siga nosso canal e receba as notícias mais importantes do dia!

Mais do Valor Econômico

Dois CEOs que aprenderam que o humor pode resolver disputas judiciais e ainda dar lucro

Quanto vale um lance bem-humorado?

Entre os empreendimentos estão a Tapada de Coelheiros, de Alberto Weisser, e a Fattoria Villa D’Ancona, que pertence à família de Bruno Levi D’Ancona, ambas na Europa

As  iniciativas bem-sucedidas de empresários brasileiros à frente de vinhedos no exterior

Filme da diretora Coralie Fargeat é um horror que testa limites e se alterna entre cenas que provocam aflição e outras que arrancam risos

‘A Substância’, filme com Demi Moore contra o etarismo, mostra uma Hollywood feia e decadente

Produto criado a partir de fonte renovável, biodegradável e compostável busca mercado enquanto aguarda criação de leis mais severas

O que é o bioplástico e quais são os empecilhos no Brasil para a substituição do plástico tradicional

Maximalista do estilo e defensora do exagero, Iris Apfel, referência da moda que morreu aos 102 anos, revela suas inspirações em livro póstumo

‘Mais é mais e menos é uma chatice’: as lições de sabedoria de uma influenciadora de moda centenária

Para 1ª Seção do STJ, tributação só ocorrerá no momento de vendas das ações, se houver ganho de capital

Corte afasta Imposto de Renda sobre stock options

É recomendado que as empresas do setor revisem seus procedimentos atuais e os tratamentos dados no passado em relação a eventual tributação dos royalties sobre sementes