Desde a autorização concedida pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) em abril de 2022, o Brasil entrou oficialmente na era das entregas por drones. Agora, após dois anos de operações, observa-se uma evolução significativa no tema, posicionando o Brasil como pioneiro na regulação e no uso logístico dessas aeronaves. O aprendizado desses dois anos de operação, somado ao período de testes anterior, está contribuindo para a definição de regulamentações e protocolos de segurança debatidos em esferas nacional e internacional.
No início, empresas como iFood, Natura e Pardini operaram algumas rotas em parceria com a fabricante de drones brasileira Speedbird. A aposta dessas empresas é ampliar o modelo, que se mostrou eficaz. Manoel Coelho, presidente da Speedbird, que recebeu autorização da Anac para operar drones em 2022, menciona que “muita coisa aconteceu” desde então. Cita a expansão das operações para diversas cidades no Brasil, o lançamento de novos modelos voltados para logística, a internacionalização e o avanço nas discussões para aprimorar a regulamentação.
“As operações expandiram no Brasil. Iniciaram em Aracaju, Salvador e Florianópolis, mas agora abrangem o Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília. Além disso, estamos operando fora do Brasil, em países como Israel, Cingapura, Irlanda e no Reino Unido, onde a primeira experiência dos correios britânicos, o Royal Mail, está sendo realizada com drones brasileiros, na Escócia”, afirma Coelho.
Pioneira entre as empresas na experiência de entregas com drones, o iFood reportou que, nos últimos dois anos, apesar de desafios operacionais como a entrega de alimentos mantendo sua integridade e temperatura, a empresa conseguiu capacidade para realizar uma média de seis entregas por hora por equipamento, otimizando tempos de trajetos que seriam mais longos por terra. André Borges, diretor de sustentabilidade do iFood, enfatiza que o uso de drones vai além da redução de custos, sendo uma valiosa ferramenta de inovação e experimentação para a empresa de tecnologia. “Atualmente, o drone reduz trajetos que levariam uma hora de carro para apenas seis minutos”, conta. Por enquanto, a empresa opera drones em apenas algumas cidades.
Os laboratórios de análises clínicas do Pardini, subsidiária do Fleury, estão utilizando drones para transportar material biológico dos centros de coleta para os locais onde são realizadas as análises. Cléber Souza Miranda, gerente de logística, diz que a experiência tem sido positiva, apesar dos desafios. “O Lab-to-Lab Pardini está completando um ano de operação de voos regulares para o transporte de amostras biológicas por drones em Salvador (BA). Esta rota foi ampliada em 2024, e pretendemos expandi-la ainda mais”, afirma Miranda.
A companhia está operando o modelo DLV-2 da Speedbird, uma aeronave com autonomia de 20 km a 25 km e uma velocidade média de 45 km/h. Neste ano, o grupo testará um novo modelo, o DLV-4, com formato de avião e decolagem vertical, que poderá alcançar 100 km de distância com velocidade média de cerca 100 km/h. Os voos de teste do DLV-4 começaram na região de Franca (SP). Com sede em Belo Horizonte, onde realiza suas principais operações, o Pardini planeja operar em breve na Grande BH, onde se localiza uma das principais unidades do Grupo Fleury.
Miranda afirma que outra conquista importante em 2024 foi obter autorizações pontuais para sobrevoar ruas. “Este foi um grande passo para que em breve possamos realizar voos em grandes centros urbanos”, diz. O marco mais significativo ocorreu no dia 29 de fevereiro, com a liberação para o transporte de material biológico categoria B - UN3373 (urina, fezes, biópsias e amostras de sangue), o tipo com maior volume a ser transportado. “Esperávamos por esta autorização há três anos e agora, com esta abertura, podemos expandir nossas operações, intensificar nossos voos e ajudar mais pessoas a terem acesso a serviços de saúde e análises clínicas”, diz o gerente.
Tanto a fabricante de drones quanto seus parceiros destacaram o avanço na tecnologia das aeronaves no último ano, com a implementação do DLV-2, substituindo o DLV-1. O novo modelo tem capacidade de voar com chuva, à noite e sobre vias públicas, além de mais autonomia, velocidade e capacidade de carga. “Começamos com 2 km [de autonomia] e já operamos com 40 km. Estamos com um modelo que viaja 100 km. Estamos evoluindo rapidamente, havendo uma convergência mundial entre as agências, e o Brasil é um dos pioneiros”, diz Coelho, da Speedbird.
Um ponto em comum citado é a evolução da regulação do espaço aéreo. As agências reguladoras dos países ainda precisam estabelecer regras claras sobre como o veículo aéreo não tripulado pode garantir a segurança da operação e definir responsabilidades. “São várias questões em discussão. Não é algo simples, assim como a questão dos carros autônomos. Os drones são grandes aliados, encurtando distâncias, vencendo áreas urbanas com trânsito, atravessando rios, montanhas. Em Florianópolis (SC), por exemplo, conectando a ilha ao continente”, destaca Coelho.
No curto e médio prazos, ele vê o avanço das operações no segmento B2B, com entregas diretas aos clientes finais, chegando a condomínios sem a necessidade de intermediários, permitindo que o entregador faça as entregas de patinete ou que as pessoas retirem seus próprios pedidos em pontos específicos. “No longo prazo, vislumbramos uma automação maior, sem eliminar o papel do entregador, porque ainda há poucos locais de pouso e o drone não chegará diretamente à janela do cliente. O que planejamos é ter mais pontos de entrega pela cidade, para que a entrega final seja realizada em poucos minutos, evitando grandes distâncias e permitindo um maior volume de entregas. Buscamos um modal limpo e seguro”, diz Coelho.
Para uma operação eficaz com drones, é essencial contar com um sistema integrado de gerenciamento de frotas, monitoramento e processos. Além disso, a definição de uma rota exige mapeamento e aprovação, considerando não apenas a conveniência para quem entrega, mas também as condições de navegação e segurança.
A criação das avenidas aéreas, corredores específicos por onde o drone deve voar do ponto A ao ponto B, é outra etapa do processo. Por fim, a empresa precisa de uma base operacional, definir os pontos de decolagem e pouso, em estruturas de 16 m2, isoladas por cercas, podendo ser instaladas em condomínios ou centros comerciais, por exemplo.